Por Tasso Franco
É jornalista e escritor.
O Elevador
Lacerda é o símbolo mais representativo da Cidade de Salvador. Ele está para a
capital dos baianos assim como o Cristo Redentor está para o Rio de Janeiro, a
Torre Eiffel para Paris, a estátua da
Liberdade para Nova Iorque, o Coliseu
para Roma e assim sucessivamente.
Tudo começou
em 18 de maio de 1864, quando o governo concedeu a Thomas Wilson Alexander
Messeder autorização para construírem sobre a encosta uma linha de comunicação
entre as duas cidades. A construção transferida para Antônio de Lacerda, que
iniciou a obra da engenhoca a partir de 1869, com o objetivo de ligar entre si
as cidades baixa e alta e servir como meio de transporte à população.
A população
se deslocava a pé ou usava animais entre os dois polos, até quando surgiu a
ideia de construir o elevador. Duas balanças operadas por um sistema
hidráulico, apelidada pelo povo de Parafusos da Conceição para conduzir
pessoas. A água elevava e fazia descer as cabines com base no movimento
giratório de um grande parafuso instado próximo à igreja de Nossa Senhora da
Conceição da Praia.
Elevador em construção
Até hoje,
Mário Gordilho, lembra com certo humor que seu tio-avô, o quase engenheiro
Antônio de Lacerda (frequentou aulas num curso especial de engenharia mas não
graduou-se), a quem chama de Toninho Lacerda, quebrou a família e a empresa
Antônio de Lacerda & Cia. Com essa louca ideia de erguer o parafuso.
Mais de
vinte anos depois de inaugurado e onze anos após o falecimento do quase
engenheiro, em 1896, o Instituto Geográfico e Histórico da Bahia rebatizou-o
com o nome de Antônio de Lacerda, mais tarde simplificado pelo povo para
Elevador Lacerda, como é conhecido até
hoje. Ao longo dos anos, o elevador tornou-se uma referência. Na década de
1930, pertencia a à Companhia Linha Circular de Carris da Bahia, quando ganhou
sua feição art-decorativa (art-decô), com a construção de sua torre externa –
duas cabines e o passadiço sobre a Ladeira da Montanha em concreto armado. Na
década de 50, , foi incorporado ao patrimônio da Prefeitura Municipal de
Salvador, ainda hoje responsável pelo seu gerenciamento.
O Elevador
Para subir
ou descer o Lacerda, o população paga um valor simbólico em real, que mal cobre
as despesas com a sua manutenção.
Durante
anos, até que a Prefeitura construísse uma proteção de vidro no seu passadiço,
era o local predileto dos suicidas. Um ponto de atração fatal. Quase
mensalmente a imprensa noticiava o voo cego de algum desesperado rumo ao
infinito.
Qual dos
baianos ainda não fez uma viagem no Lacerda?
Em pouco
menos de um minuto, o freguês chega de um ponto ao outro, percorrendo 72 metros
de altura. E quanta história à vista ao sair das cabines. Na cidade alta,
atinge-se o sítio histórico da Praça Municipal vendo-se à frente o Paço
Municipal e o antigo Palácio do Governo, justo a área escolhida por Tomé de
Souza para erguer a cidade do Salvador. Na parte baixa, descortina-se o prédio
da antiga Alfândega, hoje Mercado Modelo, o mar e as fraldas da Baía de Todos
os Santos, descoberta em 1501 por Américo Vespúcio, cenário do memorável
conflito naval do século XVII, a invasão holandesa de 1624.
Entrar e
sair do Lacerda é pisar na história. É contemplar o cenário da antiga Cidade da
Bahia vendo-se o Forte do Mar, a Basílica do Senhor do Bonfim, a ilha do
cacique Taparica, o convento de Santa Tereza, o solar do Unhão, enfim, é ter
contato com a vida da primeira capital brasileira, a joia preciosa erguida
pelos portugueses no Atlântico Sul e primeira sede do Governo Geral e do
Brasil-Colônia.
Da janela da
sala onde trabalho na sede da Prefeitura da cidade,
observo diariamente o Lacerda, especialmente o movimento de pessoas que acessam
e deixam o elevador na parte alta. Vejo a sorveteria Cubana – a mais
tradicional da cidade –, que usa cadeiras de ferro com assento recoberto de
lona e serve bolinhos com recheio de chocolate e milk-shake, os mesmos dos anos
50, os capoeiristas que jogam na praça, a baiana do acarajé, e ouço a sinfonia
de Zezinho e sua flauta de madeira, quase todas as tardes, executando desde
Tico-tico no fubá, de Zequinha de Abreu, ao Bolero de Ravel.
Toninho
Lacerda tinha razão em erguer o parafuso. É o monumento mais popular da cidade.
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