Raymundo Pinto*
No chamado ordenamento jurídico de qualquer país, existem as normas de direito material, que fixam as condutas a serem observadas pelos cidadãos em diversificadas áreas, como civil, penal, trabalhista, entre várias outras. Na grande maioria das nações mais civilizadas, paira sobre as todas as leis, e situada em escala hierárquica superior, uma constituição. O Estado impõe a compulsória observância do conjunto da legislação, aqui incluídos atos como decretos, portarias, instruções normativas, etc. É evidente que a História registra, e o nosso cotidiano confirma, a tendência de todo ser humano de tentar, forçar ou até propositadamente desrespeitar as regras jurídicas de conduta, de origem estatal ou aquelas a que se submeteu de modo voluntário. Quando ocorre essa desobediência, podem ser gerados prejuízos a pessoas, instituições e, por vezes, à sociedade. Há séculos está superada a forma de “fazer justiça com as próprias mãos”. Frustradas as possibilidades de composição amigável, resta o caminho legal de buscar a solução dos conflitos no Poder Judiciário. Para tanto, instaura-se um processo que, por óbvio, deve seguir uma série de outra espécie de normas, que se denominam normas processuais. Nesse ponto, avulta a importância do Código de Processo Civil (CPC), sendo que o ora vigente data de 1973. Apesar de leis posteriores que o alteraram, ficou patente seu descompasso com a realidade social, impondo-se a aprovação de um substituto.
O Senado aprovou, no ano passado, um projeto que institui um novo CPC. Remetido à Câmara Federal, ali foi indicado como seu relator o deputado baiano Sérgio Carneiro. Por uma dessas injustiças do eleitorado, ele é quarto suplente de seu partido (o PT), mas, em virtude de afastamentos ou licenças de titulares, conseguiu manter-se em atividade parlamentar pelo tempo suficiente para realizar um excelente trabalho. No sábado dia 5 de outubro, o nosso representante publicou aqui mesmo na seção “Judiciárias” um longo artigo, no qual traz a público, em resumo, um verdadeiro relatório de todo o imenso esforço que desenvolveu na difícil e trabalhosa tarefa que lhe coube na relatoria do importante projeto.
Destaque-se que o político baiano não é reconhecido como um festejado jurista. Formado em Direito já na idade madura, mostrou de logo sensível inclinação pelo Direito de Família, tendo escrito um livro sobre o assunto. Seu nome alcançou notoriedade quando obteve aprovação de uma emenda constitucional de sua autoria que eliminou o instituto da separação judicial e o prazo de dois anos, tornando o divórcio muito mais rápido. Apesar das limitações curriculares em face da grandeza da incumbência que lhe deram, o deputado surpreendeu a todos, efetuando um trabalho que mereceu unânimes elogios de seus pares e que, portanto, merece ser mais ser melhor divulgado, o que pretendo fazer, de forma modesta, neste artigo, conclamando que outros também o façam.
Nos quase 40 anos de vigência do atual CPC, o mundo e o Brasil experimentaram marcantes transformações sociais. Como já afirmado, as inúmeras leis que introduziram alterações em seu texto não foram suficientes para adaptá-lo aos novos tempos. Os diversos “remendos” até contribuíram para prejudicar o conjunto sistemático. Impunha-se, pois, a elaboração de um novo Código. Sérgio Carneiro, além de reunir e estudar os 139 projetos sobre o mesmo assunto antes propostos, não se limitou a consultar apenas seus colegas deputados. Democrata por formação, promoveu 15 audiências públicas, 13 conferências estaduais e convidou nada menos de 133 juristas especializados em processo para que proferissem palestras na Câmara. Foram incontáveis as mensagens de anônimos cidadãos dirigidas ao portal “E - Democracia”, apresentando sugestões ao projeto. O espaço aqui é pequeno para relacionar todas aas inovações que ele – a partir de todo o material coletado, inclusive emendas de deputados – introduziu no texto do novo CPC que terá 1.067 artigos. Em síntese, o propósito foi tornar o processo judicial mais célere, levando em conta os grandes avanços da tecnologia ligada à informática, sem esquecer outras medidas simplificadoras já adotadas em diversos países.
O imenso trabalho que teve o relator do projeto teria sido impossível de ser cumprido se ele não contasse com uma competente assessoria. Por uma questão de justiça, vale salientar, nesse aspecto, a decisiva participação de outro baiano na liderança de seus auxiliares: Fredie Didier Júnior. Trata-se de um jurista e professor universitário que, na área do processo civil, tem lugar de vanguarda na comunidade científica brasileira voltada para o estudo do Direito. Lamento mais uma vez o pequeno espaço de que disponho, ficando assim impedido de mencionar seus numerosos títulos e as várias obras jurídicas que publicou. Basta informar que o 1º volume de seu livro “Curso de Direito Processual Civil”, pela JusPodium, adotado e consultado em todo o Brasil, já se encontra em 14ª edição, sendo que os demais volumes vão no mesmo ritmo. O próprio Sérgio, no artigo já citado, fez questão de citar o seu principal assessor, agradecendo a sua fundamental ajuda e acrescentando que ele “...foi meu fio condutor à comissão de processualistas que se formou em torno de mim e também o guardião do texto inúmeras vezes feito e refeito por conta das contribuições recebidas, emprestando toda sua técnica e capacidade de trabalho”. Quando o novo CPC entrar em vigor e seu uso trouxer, para o dia a dia da labuta forense, a realidade de um processo judicial mais célere e mais justo, nós todos brasileiros – em especial os operadores do Direito – iremos sempre lembrar a decisiva participação dos dois inteligentes baianos na sua elaboração: Sérgio Carneiro e Fredie Didier Júnior.
*Raymundo Pinto, desembargador aposentado do TRT, é escritor, tendo publicado diversas obras jurídicas, destacando-se “Súmulas do TST Comentadas”, já em 12ª edição.
LEIAM SEMPRE: “NÃO HÁ LIVROS MORAIS OU IMORAIS, O QUE HÁ SÃO LIVROS BEM ESCRITOS OU MAL ESCRITOS.” (OSCAR WILDE)
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