quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

BLACK BLOC: VÂNDALOS, FASCISTAS OU ANARQUISTAS?

Fernando Alcoforado*



A violência das manifestações de junho de 2013 em São Paulo, no Rio de Janeiro e em
outras cidades brasileiras trouxe como fato novo os adeptos do “Black Bloc” que são

denominados por alguns analistas de vândalos e por outros de fascistas e anarquistas.
Independentemente da denominação que lhes sejam atribuídas, não há dúvidas de que a
violência dos manifestantes traduz a insatisfação contra as instituições políticas
corruptas do Brasil e contra o governo central que demonstra ineficiência e
incapacidade total para atender as demandas da sociedade. A violência dos adeptos do
“Black Bloc” tem também um caráter anticapitalista e antiglobalização porque o
capitalismo e a globalização, sobretudo a financeira, são considerados os maiores
responsáveis pela crise mundial que avassala o planeta e pelo agravamento da situação
econômica e social em todo o mundo.

Os adeptos do “Black Bloc” surgiram no Brasil também porque grande parte dos
partidos políticos, sindicatos e organizações da Sociedade Civil se omitem diante da
grave situação política, econômica e social vivida em nosso país haja vista que alguns
deles foram cooptados pelos atuais detentores do poder e, outros, esmagados por estes
demonstram incapacidade total de mobilização popular. Na prática, os adeptos do
“Black Bloc” ocupam o espaço de reivindicação abandonado pelos partidos políticos,
sindicatos e organizações da Sociedade Civil que apoiam o governo do PT. Os adeptos
do “Black Bloc” não possuem, entretanto, uma pauta clara dos objetivos que pretendem
atingir. Os adeptos da tática “Black Bloc” pregam a depredação do patrimônio privado
de grandes empresas (tendo como alvos preferenciais, no Brasil, as agências bancárias e
concessionárias de veículos). Fazem isso como ação simbólica de ataque às corporações
capitalistas e, em última instância, ao capitalismo como sistema.

A revolta dos adeptos do “Black Bloc” se manifestou, também, contra os governantes
do Brasil na depredação do patrimônio público que também foi atingido nas
manifestações de junho de 2013. Ao mesmo tempo, seus integrantes defendem a
democracia direta desqualificando com razão as instituições da democracia
representativa e do Estado brasileiro que estão a serviço dos monopólios nacionais e
internacionais em detrimento dos interesses da população brasileira. As concepções
anarquistas são, em geral, muito atraentes para aqueles que valorizam a democracia
radical (direta) e a justiça social no enfrentamento do capitalismo e suas iniquidades. No
entanto, esse radicalismo de caráter anarquista não contribui para a derrocada do
capitalismo. Basta avaliar os resultados da tática “Black Bloc” nas ações
antiglobalização na Europa e nos Estados Unidos como o “Occupy Wall Street”. Veja-se
o exemplo da Espanha que, depois das revoltas dos “indignados”, a direita voltou ao
poder nas eleições seguintes e a política econômica de “austeridade”, adotada pelos
neoliberais espanhóis do Partido Popular, só aprofundou a recessão e o desemprego,
principalmente entre os jovens.

Um fato indiscutível é o de que esquerda e direita têm projetos político-econômicos
incompatíveis. Para as esquerdas, a defesa da igualdade social é um ponto essencial.
Para as esquerdas, é fundamental a atuação do Estado na promoção da igualdade social.
Para isso, os impostos devem ser cobrados de maneira proporcional à riqueza e à renda
dos cidadãos e das empresas, algo que, como se sabe, não ocorre no Brasil. Nem mesmo
o imposto sobre “grandes fortunas”, previsto na Constituição de 1988, foi
regulamentado. A pauta da direita, por outro lado, é a da liberdade dos negócios, mesmo
que à custa dos interesses das maiorias e, principalmente, em detrimento dos direitos
das camadas mais pobres e sofridas da população. E o que querem os adeptos do “Black
Bloc”, além de enfrentar a polícia e protagonizar ações que simbolizam a “destruição do
capitalismo”? Que projeto têm os adeptos do “Black Bloc”? Pelo que se pode ler em
sites do “Black Bloc” na internet, só há a rejeição radical ao capitalismo.

Cabe observar que a tática “Black Bloc” surgiu no seio de uma vertente alternativa da
esquerda europeia no início da década de 1980 permanecendo muito pouco conhecida
fora do Velho Continente até o fim do século XX. Foi só com a formação de um “Black
Bloc” durante as manifestações contra a OMC em Seattle, em 1999, que as máscaras
pretas ganharam as manchetes da imprensa mundial. É natural, portanto, que muita
gente ache que a tática tenha surgido com o chamado “movimento antiglobalização” e
tenha se baseado, desde o início, na destruição dos símbolos do capitalismo. O
lamentável é a desinformação demonstrada sobre o assunto por certos expoentes e
segmentos da esquerda tradicional brasileira que chegaram ao ponto de qualificar a
tática “Black Bloc” de fascista. Os adeptos do “Black Bloc” não são nem vândalos,
estrito senso, nem fascistas. Eles são anarquistas que chegaram ao Brasil por influência
da experiência norte-americana. Ressalte-se que um “black bloc” é um “bloco negro”,
ou seja, um grupo de militantes que optam por se vestir de negro e cobrir o rosto com
máscaras da mesma cor para evitar serem identificados e perseguidos pelas forças da
repressão.

A corrupção desenfreada em todos os poderes da República e a incapacidade do
governo brasileiro e das instituições políticas em geral de oferecer respostas eficazes
para as demandas da população na atualidade tendem a aumentar a violência política no
Brasil, sobretudo em 2014 quando serão realizadas eleições para a Presidência da
República, os Governos de Estado e o Parlamento. Os detentores do poder utilizarão de
todas as armas legais e ilegais para se manterem no comando da nação e seus
adversários farão de tudo para galgarem o poder. As eleições de 2014 serão decisivas
para o futuro do Brasil porque a manutenção do PT do poder ou sua substituição pelo
PSDB significará o não atendimento das demandas da população com a continuidade da
política neoliberal e antinacional que infelicita a nação brasileira desde 1994. A vitória
de Eduardo Campos nas eleições presidenciais de 2014 com a ascensão ao poder do
PSB pode significar uma mudança radical na vida brasileira se houver um rompimento
com a política neoliberal e antinacional adotada pelo atual governo.

Se houver mudança no comando da nação com a adoção de uma nova política
econômica e financeira diametralmente oposta à atual, o futuro governo poderá se
defrontar com a oposição de setores econômicos prejudicados. O País poderá ficar
desorganizado e convulsionado como aconteceu na década de 1960 do século XX
quando a direita arquitetou o golpe de estado que derrubou o presidente João Goulart. O
caos poderá se instalar no Brasil com o incremento das manifestações da população e a
volta dos adeptos do “Black Bloc” às ruas. Neste contexto, a direita, que sempre esteve
voltada para a defesa dos interesses das classes dominantes e do capital internacional,
tentará articular o apoio de certas parcelas da sociedade para alijar os detentores do
poder. É sabido que, historicamente, em épocas de convulsões sociais, a direita se une.
Em um ambiente de convulsão social, a violência dos adeptos do “Black Bloc” pode
oferecer a justificativa necessária para a direita patrocinar um novo golpe de estado no
Brasil para manter a política neoliberal e antinacional em vigor.

Dois cenários precisam ser evitados a todo o custo pelo povo brasileiro com as eleições
de 2014: o primeiro, o da continuidade dos atuais detentores do poder devido à
incompetência demonstrada e o descompromisso com os reais interesses da nação que
podem alimentar a convulsão social no País e, o segundo, o do insucesso de um governo
de oposição ao atual que assumindo o poder adote uma política voltada para o
atendimento dos interesses da nação e do povo brasileiro e que, devido a este fato, se
defronte com obstáculos que levem à desorganização do País e, também, à convulsão
social. Ambos os cenários podem criar, portanto, a justificativa necessária para a direita
patrocinar um novo golpe de estado no Brasil para manter a política neoliberal e
antinacional em vigor se os continuadores do governo atual ou um governo de oposição
venha a assumir o poder e não reúna capacidade para evitar o aprofundamento da crise
econômica e política e a convulsão social dela resultante.

*Fernando Alcoforado, 73, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento
(Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development - The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe

Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros. 

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