sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

NESTA MINHA BAHIA MORENA

Por CONSUELO PONDÉ




Não preciso dizer que sou apaixonada por minha terra. As críticas que lhe faço, e não são poucas, nada têm a ver com este território abençoado. São acusações dirigidas a maioria  do  seu povo, do qual  faço parte, e a muitos dos seus dirigentes que não a amam  como deveriam.

Faltam-nos políticos  capazes de lutar, quer no plano municipal, no estadual e no federal, em benefício desta parte do território brasileiro; deste pedaço de chão  exaltado  por Gabriel Soares de Sousa, na  obra mais enciclopédica do período, conforme escreveu o historiador Varnhagen, na  História Geral do Brasil. Falta, à maior parte do povo soteropolitano, educação, civilidade e respeito ao bem público. Falta, a muitos políticos, o sincero desejo de servir sem interesse.
Gabriel Soares, como é mais conhecido, deve ter chegado ao Brasil na armada que conduziu o governador Francisco Barreto em 1569. Radicou-se na Bahia, onde enriqueceu, adquiriu propriedades, criou rebanhos de bois e de muares, multiplicou engenhos de açúcar, terrenos, valendo-se da mão de obra dos escravos africanos e de índios forros.
Inquieto, desbravador, empreendeu muitas viagens para o Sul, como é possível depreender da minuciosa descrição da costa e dos acidentes geográficos.
Seu Tratado Descritivo do Brasil é uma obra seminal para o conhecimento da nossa terra e a nossa gente, merecendo a apreciação insuspeita de José Honório Rodrigues, que o reputava o mais importante trabalho sobre o Brasil do século XVI, opinião corroborada por todos que se ocupam da história do país.
Neste texto, longe de querer tratar da “saga” heroica do grande cronista, sou tentada a proceder a alguns comentários sobre o que escreveu sobre a Bahia de Todos-os- Santos, a partir do povoamento da capitania doada a Francisco Pereira Coutinho.
Este nobre cavalheiro, procedente de Lisboa, desembarcou  na Ponta do Padrão (Farol da Barra) e fundou a Vila Velha, em cujo sítio reuniu uma povoação e construiu uma fortaleza sobre o mar, convivendo, amistosamente, com os índios, nos primeiros tempos. Ali os moradores fizeram suas roças e lavouras.
Dentro de algum tempo, porém, surgiram hostilidades entre sua gente e os naturais da terra, ficando a Vila do Pereira, literalmente, cercada, a ponto de ser necessário buscar, por mar, água e mantimentos da capitania de Ilhéus.
No espaço de tempo de 7 a 8 anos, com algumas tréguas, ocorreram grandes fomes, doenças e outros problemas, a ponto de não mais ser possível suportar a tensão  entre colonos e tupinambá, que não só matavam, mas também comiam seus adversários. Diante dessa situação insustentável, o donatário deslocou-se, com sua gente, para Ilhéus. Esse afastamento gerou promessas de paz e boa amizade por parte dos índios.
Decidiu, então, o donatário regressar à Bahia, tendo, por conta do mau tempo chegado  à costa da ilha de Itaparica. Ali, porém, os tupinambás daquela banda mataram-no, e aos seus acompanhantes, escapando dessa carnificina grande língua do gentio, Diogo Álvares, o Caramuru.
Nas mãos daqueles inimigos pereceu, portanto, o malogrado donatário, perdendo, assim, não apenas a vida, mas tudo que havia acumulado na Índia, nos anos que lá viveu.
Mas, é tempo de deixar de lado essas primícias e proceder às observações sobre o clima da BTS, no testemunho abalizado de quem a conheceu tão profundamente em tempos que, infelizmente, não alcançamos.
Assim, por exemplo, ao versar o clima da Bahia, descreve Gabriel Soares:  “A Bahia de Todos  os Santos está arrumada em treze graus e um terço, como fica dito atrás; onde os dias em todo o ano são quase iguais com as noites e a diferença que têm os dias de verão aos do inverno é uma hora até hora e meia”. Mais adiante, acrescenta: “E há-se de notar que nesta comarca da Bahia, em rompendo a luz da manhã, nasce com ela justamente o sol, assim no inverno como no verão.
 E em se recolhendo o sol à tarde, escurece juntamente o dia e cerra-se a noite; a que matemáticos deem razões suficientes que satisfaçam a quem quiser este segredo, porque mareantes e filósofos que a esta terra foram, nem outros homens de bom juízo não tem atinado até agora com a causa porque isso seja”. Soares de Sousa declara a fertilidade da terra: “da grandura da Bahia de Todos os Santos e do seu poder, é bem que digamos a fertilidade dela um pedaço, e como produz  em si as criações das aves e alimárias de Espanha e os frutos dela, que nesta terra se plantam”.
Como se pode observar, clima melhor não há neste Brasil, nem brisas mais suaves cortam os ares deste país. Aqui não se sente frio enregelante, nem calor abrasador. Somos sempre servidos, Deus haja, pelo vento fresco e brando, pela viração que sopra do mar e da terra, envolvendo a atmosfera da Cidade do Salvador em tépida e suave aragem.

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