Fernando
Alcoforado*
A Ucrãnia
enfrenta três grandes desafios: o primeiro, representado pelo fato de ter
havido um
golpe de estado que depôs o governo legítimo liderado pelo presidente
Viktor
Yanukovich; o segundo representado pela deterioração econômica que afeta o
país; e o
terceiro, diz respeito ao risco de fragmentação do país.
Quando os
rebeldes depuseram Yanukovich e todo seu governo, consideraram a
situação
como se fosse normal destituindo à força um governo eleito. Mais de cem
deputados
do parlamento ucraniano, membros do partido do governo, não
participaram
desta decisão. Assim houve a deposição de Viktor Yanukovich pelo
parlamento
ucraniano sob inspiração das potências ocidentais (Estados Unidos e
União
Europeia) e foi formado o novo governo que assumiu o poder em Kiev.
Esta foi a
razão pela qual os russos decidiram intervir na Ucrânia. É evidente que a
Rússia não
tem o direito de usar suas tropas em território de outro Estado. Mas os
delitos cometidos
pelos russos contra a Ucrânia antes da deposição de Yanukovich não
devem ser
usados como álibi para os dirigentes dos Estados Unidos e da União
Europeia
terem incentivado o golpe de estado na Ucrânia.
O estado
da economia da Ucrânia e das finanças públicas é catastrófico. A corrupção e a
má gestão
fez com que o país se tornasse insolvente e incapaz de cumprir as suas
obrigações
mais elementares, incluindo os pagamentos de pensões e salários. Esta
situação é
agravada pelo fato de a Ucrânia depender quase inteiramente do gás russo
para a sua
energia e não tem capacidade para pagar sua dívida externa.
O governo
da Ucrânia enfrenta enormes desafios e uma situação de guerra com a Rússia
com
possível desintegração do país. A ameaça de uma rápida desintegração das partes
orientais
do país é muito real. Do ponto de vista geopolítico, a Rússia receia perder a
Ucrânia
que passaria a ser área de influência ocidental razão pela qual valoriza a
posição
geoestratégica deste país. A Criméia e sua base naval é crucial para os planos
da
Rússia e
Wladimir Putin de transformá-la em superpotência mundial.
Perder a
Ucrânia significaria o fim da pretensão do presidente russo Vladimir Putin de
recuperar
o status de superpotência para a Rússia e reduziria sua influência na Eurásia.
Para
manter a Ucrânia sob sua esfera de influência, a Rússia está a desafiar a
legitimidade
do novo governo implantado após a deposição de Viktor Yanukovich
reconhecendo-o
como presidente legítimo da Ucrânia. Confrontação militar direta não
pode ser
excluída. A Rússia está usando o pretexto da legitimidade para proteger a
população
russa e está começando com a ocupação da Crimea. As regiões de Kharkiv,
Donetsk e
provavelmente Odessa viriam a seguir.
O novo
governo de coalizão da Ucrânia instalado após o golpe de estado que depôs
Viktor
Yanukovich busca um amplo apoio nos planos interno e externo. Mas isso
requereria
a presença no comando da nação de um estadista para equilibrar as
necessidades
gerais do país com os desejos e anseios dos diferentes grupos de interesse.
No
entanto, tudo leva a crer que a Ucrânia tem pouca chance de resolver seus
problemas
internos e
externos porque tornou-se um peão no meio de poderosos interesses no
xadrez da
geopolítica internacional.
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Sob a
ótica dos interesses da Rússia, Putin gostaria de se apossar da Ucrânia
inteira.
Mas é algo
totalmente improvável porque na região leste da Ucrânia a situação é muito
mais
difícil do que na Crimeia porque há muita gente que não quer uma união com a
Rússia, ou
pelo menos ter uma autonomia muito maior em relação a Kiev. Já outras
regiões se
opõem tenazmente a isso.
Portanto,
será muito problemático para a Rússia usar a força basicamente para trazer as
províncias
do leste ucraniano para sua esfera de influência. Aparentemente já existem,
de acordo
com os russos, mais de 100 mil refugiados do leste ucraniano chegando à
Rússia. Se
esse número se transformar em centenas de milhares, ou milhões, os cálculos
de Putin
podem ser modificados. Mas neste momento tanto seu plano como sua
preferência
são de não se envolver no leste da Ucrânia e sim apenas na Crimeia.
Não
existem dúvidas de que o governo dos Estados Unidos ajudou a depor o presidente
democraticamente
eleito da Ucrânia, Viktor Yanukovych, com a ajuda da ultradireita,
paramilitares,
gangues neonazistas que invadiram e queimaram escritórios do governo,
mataram
soldados da tropa de choque, e espalharam o caos e terror em todo o país (Ver
o artigo
de Mike Whitney: Ucrânia, o plano mais idiota de Obama publicado no
website
<http://www.viomundo.com.br/politica/mike-whitney-ucrania-o-plano-maisidiota-
de-obama.html>).
Estes são
os novos aliados dos Estados Unidos no grande jogo para estabelecer uma
cabeça de
ponte na Ásia, empurrando os russos mais para o leste, derrubando o governo
legítimo
da Ucrânia, garantindo corredores de oleodutos e gasodutos vitais, acessando
escassas
reservas de petróleo e gás natural e trabalhando pela desmontagem da
Federação
Russa, segundo a estratégia geopolítica proposta por Zbigniew Brzezinski em
sua obra The
Grand Chessboard: American Primacy and it’s Geostrategic
Imperatives
(O Grande Tabuleiro de Xadrez: a Primazia
Americana e seus Imperativos
Geoestratégicos).
Este livro
fornece a estrutura básica para o estabelecimento da hegemonia militar,
política e
econômica dos Estados Unidos na região mais promissora e próspera do
século XXI
na Ásia. O governo da Rússia está ciente dessa estratégia de dividir e
conquistar
de Washington, mas minimizou a questão, a fim de evitar um confronto. O
golpe de
Estado apoiado pelos Estados Unidos e União Europeia na Ucrânia faz com
que a
Rússia tenha de responder a esta provocação que ameaça tanto a sua segurança
como seus
interesses vitais na região. Os primeiros informes indicam que Putin já
mobilizou
tropas para a região e, segundo a Reuters, colocou caças ao longo de suas
fronteiras
ocidentais em alerta de combate.
Estamos
vivendo, portanto, uma situação em que a única superpotência do mundo, os
Estados
Unidos, se comporta de forma irracional em todo o planeta, alimentando a
criação de
um Estado falido após o outro como no Iraque, Afeganistão e Líbia,
fomentando
revoltas como na Síria e Venezuela, criando ódio e espalhando miséria por
onde
passa. Os Estados Unidos têm saído dos trilhos, de um modo completamente louco
empurrando
o mundo para mais perto do abismo. A arquitetura para a segurança
mundial
entrou em colapso, enquanto os princípios básicos do direito internacional
foram
alijados completamente.
*Fernando
Alcoforado, 74, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e
Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor
universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento
empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é
autor dos
livros Globalização
(Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova
(Des)ordemMundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o
Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do
desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,
ttp://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e
Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento
do Século XVI ao Século XX e ObjetivosEstratégicos na Era Contemporânea (EGBA,
Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the
Economic
and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM
Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft
& Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária
(P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para
o progresso do Brasil ecombate ao aquecimento global (Viena- Editora e
Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores
Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV,
Curitiba, 2012), entre outros.
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