Uma arte, uma transgressão
penal ou um estilo de vida?
Malandragem define-se
como um conjunto de artimanhas utilizadas para se obter vantagem em determinada
situação (vantagens estas muitas vezes ilícitas).
Caracteriza-se
pela engenhosidade e sutileza. Sua execução exige destreza, carisma, lábia e
quaisquer características que permitam a manipulação de pessoas ou resultados,
de forma a obter o melhor destes, e da maneira mais fácil possível.
Contradiz
a argumentação lógica, o labor e a honestidade, pois a malandragem pressupõe
que tais métodos são incapazes de gerar bons resultados. Aquele que pratica a
malandragem (o "malandro") age como no popular adágio brasileiro,
imortalizado pelo nome de Lei do Gerson:
"gosto de levar vantagem em tudo".
A malandragem é descrita no imaginário popular
brasileiro como uma ferramenta de justiça individual. Perante a força das instituições necessariamente opressoras, o
indivíduo "malandro" é o curupira que só faz gol de calcanhar e sai
comemorando de moon Walker. Tal como o
jeitinho, a malandragem é um recurso de esperteza, utilizado por indivíduos
de pouca influência social, ou socialmente desfavorecidos. Isso não impede a
malandragem de ser igualmente utilizada por indivíduos mais bem posicionados
socialmente. Através da malandragem,
obtêm-se vantagens ilícitas em jogos de azar, nos negócios e na vida social em sua
totalidade. Pode-se considerar
"malandro" o adúltero que convence a mulher de sua falsa fidelidade;
o patrão que "dá um jeito" de não pagar os funcionários tal como
deveria; o "jogador" que manipula as cartas e leva para si toda uma
rodada de apostas.
O estereótipo do típico malandro brasileiro
surgiu na primeira metade do século XX. Carregado de certo romantismo, foi
principalmente imortalizado pelas letras de samba.
De acordo com este estereótipo, o malandro habita os guetos; usa chapéu-palheta ou panamá e
calça sapatos de cores branco e preta. Veste camisa preta com listras brancas
(é sua identidade), detalhes vermelhos ou regata listrada, calças brancas e
leva sempre uma navalha no bolso do paletó (e vai para a Barão de Mauá).
É boêmio, vive de pequenos golpes,
aprecia rodas de samba e não acredita no trabalho como um modo de vida
confiável; no entanto, é sensível e sentimental, além de galante, cavalheiro e
um amante invejável.
Obviamente, não existe uma "teoria da malandragem" que sustente e justifique ideologicamente esse comportamento típico. A postura, atitude e cotidiano do malandro é retratado principalmente pelas artes. O samba "Lenço no Pescoço", escrito por Wilson Batista e gravado por Sílvio Caldas em 1933, tornou-se um "hino" da "malandragem brasileira". Suas estrofes descrevem com precisão o modo de vida de um típico malandro: "Meu chapéu do lado / Tamanco arrastando / Lenço no pescoço / Navalha no bolso / Eu passo gingando / Provoco e desafio / Eu tenho orgulho / Em ser tão vadio. / Sei que eles falam / Deste meu proceder / Eu vejo quem trabalha / Andar no miserê / Eu sou vadio / Porque tive inclinação / Eu me lembro, era criança / Tirava samba-canção".
Obviamente, não existe uma "teoria da malandragem" que sustente e justifique ideologicamente esse comportamento típico. A postura, atitude e cotidiano do malandro é retratado principalmente pelas artes. O samba "Lenço no Pescoço", escrito por Wilson Batista e gravado por Sílvio Caldas em 1933, tornou-se um "hino" da "malandragem brasileira". Suas estrofes descrevem com precisão o modo de vida de um típico malandro: "Meu chapéu do lado / Tamanco arrastando / Lenço no pescoço / Navalha no bolso / Eu passo gingando / Provoco e desafio / Eu tenho orgulho / Em ser tão vadio. / Sei que eles falam / Deste meu proceder / Eu vejo quem trabalha / Andar no miserê / Eu sou vadio / Porque tive inclinação / Eu me lembro, era criança / Tirava samba-canção".
O
jeito de ser e vestir dos malandros, como estereótipos, também bebe na fonte do
personagem folclórico Zé Pelintra,
personalidade emblemática do Catimbó.
A Umbanda posteriormente incorporou o antigo mestre
de mesa, com a figura de malandro, quando do translado de levas de migrantes do
Nordeste para o Centro-Sul do Brasil. Zé
Pelintra seria um boêmio de modos selvagens em suas lides, mas de coração
bom e prestimoso, sendo, inclusive, considerado "padrinho dos pobres".
A
mais marcante diferença entre o estereótipo do malandro e a representação
de Zé Pelintra é
que este último veste-se em caxemira e gravata vermelha, enquanto que o malandro típico prefere camisas listradas,
sem gravata.
No
Brasil, muitos indivíduos que poderiam ser considerados como "malandros
típicos" fizeram fortunas ilícitas como empresários do jogo do bicho.
Estes
malandros praticam caridade e investiram nas escolas de samba,
o que lhes conferiu uma imagem romântica de benfeitores. Tal imagem fora
severamente prejudicada com o episódio conhecido como "CPI do jogo do
bicho", onde se investigou o envolvimento deste tipo de empresários (o
"bicheiro")
com corrupção. De fato, a linha que
separa a malandragem romântica do crime explícito é imprecisa.
A coleção de contos "Pastores da
Noite", de Jorge
Amado, fornece um costumeiro retrato romântico dos pequenos malandros:
arruaceiros, amigos e de bom coração.
A bem-humorada "Ópera do Malandro", de Chico
Buarque de Hollanda, descreve com mais precisão o
malandro: contrabandista, bonachão, bon vivant e com certeza
criminoso. Mais sóbria, a peça teatral "Boca de Ouro", escrita
por Nelson Rodrigues, oferece um perfil realista do malandro bicheiro: temível, orgulhoso,
vaidoso, generoso por demagogia e psicótico.
A
malandragem configura-se quando o sujeito abdica e mesmo escarnece de suas
funções e obrigações sociais, tais como obediência às autoridades, respeito à
propriedade alheia, altruísmo, etc., preferindo viver o dia-a-dia da forma
mais hedonista possível.
O malandro não toma esta atitude por
ímpeto revolucionário, convicção ideológica ou qualquer conclusão intelectual.
Ainda que sua atitude possa ser desencadeada por ressentimento social, o
propósito do malandro não é o de mudar o status quo, e uma
discussão dessa ordem simplesmente não faria diferença para ele. A verdade
é que a diligência do trabalho quotidiano não possui aplicação prática em sua
vida, e a realização de pequenos delitos furtivos e independentes dão-lhe
vívida impressão de sucesso, causando-lhe sensação de satisfação e mesmo
superioridade.
Malandros
e malandras
Devido
a essas características, o malandro muitas vezes é rotulado como “preguiçoso”,
“vagabundo”, “escória”, “inútil”. No entanto, sendo uma atitude típica de
indivíduos desfavorecidos, a malandragem
muitas vezes é vista com simpatia. Ao malandro cabe muitas vezes o papel
de herói,
ainda que se aproxime mais de um anti-herói.
O malandro é idealmente representado como o sujeito que, privado de
instituições que o representem, precisa utilizar da própria inteligência e
artimanha para lidar com os mais fortes. Além do quê, o malandro ideal carrega
em si o carisma que lhe rende simpatia, mesmo diante daqueles que teriam
motivos para não aprovar sua atitude. Nesse sentido, a malandragem possui alguma concomitância com o jeitinho.
A
malandragem é profundamente arraigada no imaginário popular. Em seu livro
"O Grande Massacre de Gatos", Robert
Darnton expõe como, durante a Alta
Idade Média, a malandragem fora imortalizada pelas classes populares como um modo
de justiça individual.
Em uma época de pouca comida e abismos sociais, os personagens que hoje compõem
as histórias da "Mamãe
Ganso" usavam de artimanhas
e espertezas para
enganar as pessoas mais abastadas e favorecidas, obtendo assim fortunas ou ao
menos garantindo a própria sobrevivência. Essas artimanhas e espertezas eram
denominados "cartesianismos", uma referência a René
Descartes, cujas idéias eram vistas com alguma desconfiança pelas classes
populares.
Esses cartesianismos envolviam manipulação de pessoas, pequenas fraudes e até mesmo o uso de artimanhas mágicas. Ora, esta é precisamente a atitude típica da malandragem: buscar formas mais "acessíveis" de usufruir de confortos e vantagens, a maior parte relacionada com o simples desfrute dos prazeres sensoriais da existência (ter, beber, jogar, namorar, etc.). Para isso, o malandro utilizará a lábia e a destreza, bem como outras características que o habilitem a manipular pessoas; o malandro eventualmente contará também com a sorte, principalmente porque este indivíduo não acredita na idéia de se realizar grandes esforços no sentido de obter algo para si (daí sua tendência aos jogos de azar, ainda que sempre busque manipular o resultado destes). É preciso ressaltar que a sutileza e a individualidade são as principais características da malandragem. Nesse sentido, um corsário, um assaltante, um líder de gangue ou um saqueador comum não podem ser vistos como malandros.
Homens trajando os zoot suits, vestimenta
identificada com os malandros
O estereótipo da malandragem foi capaz de
influenciar não apenas a cultura brasileira, como também a de outros países, em
diferentes épocas. Durante a primeira metade
do século XX,
os Estados Unidos viram imortalizada a figura do típico malandro do Bronx: negro, pobre, conhecedor das
"manhas" das ruas; fala gírias e possui um sotaque
"cantado", parecido com o de um cantor de rap. Usa os chamados zoot
suit,s ternos quadriculados coloridos, acompanhados de um chapéu de abas
largas, os zoot suit influenciaram o tipo de roupa usada pelos sambistas cariocas2e na vestimenta do Zé Carioca de Walt Disney .
É bem-humorado, bonachão e muitas vezes de bom coração. Nas concepções mais românticas, é uma pessoa de "boa paz",
negando-se a realizar crimes "pesados", preferindo
"pequenos" delitos como fraudes e furtos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário