Por JOACI
GÓES
A 22 de novembro de 2012, data em que
mereci a honra de saudar o ingresso de João Ubaldo Ribeiro na Academia de Letras
da Bahia, publiquei, neste mesmo espaço, artigo em que expressei minha opinião
sobre alguns aspectos da vida e da obra do grande escritor. No momento em que o
Brasil pranteia seu inesperado e precoce desaparecimento, reproduzo aquele
texto, com a alma transida de dor pela perda do velho e fraternal amigo:
“Hoje
é dia de festa para a justiça e a literatura brasileiras porque em Brasília o
ministro Joaquim Barbosa é empossado presidente do Supremo Tribunal Federal, e
o mais festejado escritor brasileiro, João Ubaldo Ribeiro, toma posse como
membro da Academia de Letras da Bahia.
Enquanto
a posse de Joaquim Barbosa coincide com as mais ardentes expectativas do povo
brasileiro, em fase de incontido encantamento com a Suprema Corte e com seu
mais famoso ministro, os baianos se indagam perplexos por que, só agora, João
Ubaldo ingressa em nossa Academia, quando há quase duas décadas integra a
Brasileira de Letras. A explicação é simples: até recentemente, os estatutos da
academia baiana restringiam o acesso a ela aos residentes em Salvador, e o
autor de Viva o povo brasileiro, como é sabido, reside no Rio de Janeiro. Ainda
assim, não foi fácil convencê-lo a aceitar o convite, preocupado com sua
impossibilidade de frequentar com regularidade as sessões da casa de Arlindo
Fragoso.
Laureado
com os prêmios Jabuti, Golfinho de Ouro, Camões, o mais importante da língua
portuguesa, e o Anna Seghers, da Alemanha, Ubaldo foi um dos poucos escritores
ouvidos pelo jornal francês Liberation, em 1999, sobre a virada do milênio. A
alemã Universidade Tübigen conferiu-lhe a cátedra Poetik Dozentur, Docente
em Poesia. Em 1984, com Jorge Luiz Borges e Gabriel Garcia Marquez, participou,
a convite da TV canadense, da elaboração de nove filmes sobre a literatura
latino-americana. Várias de suas obras, como Sargento Getúlio, O sorriso do
lagarto e O santo que não acreditava em Deus, foram adaptadas para a televisão
ou cinema. Entre seus livros, traduzidos para vários idiomas, A casa dos budas
ditosos ocupou durante nove meses a lista dos mais vendidos, sendo seu
lançamento em Portugal motivo de um caso nacional, em razão da proibição de sua
venda por duas grandes redes de supermercados. Para desagravá-lo, intelectuais
portugueses recepcionaram-no em 2000. Em 1987, Viva o povo brasileiro desfilou
na Marquês de Sapucaí como tema de samba-enredo da escola carnavalesca Império
da Tijuca.
Continuam
sendo motivo de especulação as razões pelas quais a Universidade Federal da
Bahia, tão pródiga em distribuir títulos honorários a mancheias, tem sido
omissa em prestar a mínima homenagem a seu ilustre ex-aluno e mestre de Ciência
Política, cujo livro Quem manda, porque manda, como manda é dos mais lidos do
gênero pela comunidade universitária. A primeira versão do prêmio Jorge Amado
foi destinada a um notável autor pernambucano, contrariando a expectativa geral
que atribuía prioridade absoluta ao nome de João Ubaldo.
Hoje,
porém, é um dia de pura alegria. O Solar Góes Calmon, sob a presidência do
médico e ficcionista Aramis Ribeiro Costa, viverá, com a posse de João Ubaldo,
uma noite memorável. Políticos, escritores, empresários, intelectuais em geral,
sobretudo amantes de boa literatura, terão assunto ameno para comentar no curso
dos próximos dias.
Sem
dúvida, teremos com esta posse festiva de um grande vulto da inteligência
nacional oportuno contraponto ao declínio cultural da Bahia e de sua capital,
ambos ora ocupando uma das mais baixas posições na classificação do avanço
educacional no Brasil.”
Não
se trata de figura de retórica: ao lado das saudades que deixa para familiares
e inúmeros amigos e admiradores, a saída física de cena de João Ubaldo Ribeiro
abre impreenchível lacuna no panorama cultural brasileiro.
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