quinta-feira, 28 de agosto de 2014

EM MARCHA O CONLUIO PARA MANTER O “STATUS QUO” NEOLIBERAL NO BRASIL

 Colaboração de Fernando Alcoforado*

 As pesquisas eleitorais realizadas após a morte de Eduardo Campos apontam a vitória de Marina Silva, sua substituta como candidata do PSB à presidência da República, no segundo turno das eleições presidenciais. A estratégia de Marina Silva para vencer as eleições e assegurar a governabilidade pós-eleitoral já está delineada. Para vencer as eleições, Marina Silva precisa granjear o apoio de amplos setores da população
acenando com a perspectiva de mudanças visando a superação das fragilidades econômicas e sociais do Brasil que se agravaram no governo Dilma Rousseff e o apoio também dos detentores do capital especialmente do sistema financeiro com a manutenção do credo neoliberal baseado na política do câmbio flutuante, da meta de inflação e da disciplina fiscal estabelecida pelo governo Fernando Henrique Cardoso
(FHC) e mantida pelos governos Lula e Dilma Rousseff.


Os governos FHC, Lula e Dilma Rousseff estabeleceram como estratégia para alcançar a governabilidade do país a troca de favores com os partidos aliados no Congresso Nacional, especialmente com o PMDB. A troca de favores vem se traduzindo no loteamento de cargos ministeriais e comissionados na estrutura do governo para acomodar integrantes dos partidos aliados. Esta situação fez com que no governo Dilma
Rousseff o número de ministérios chegasse a 39 e o de cargos comissionados a 22,6 mil. A conquista de apoios por parte do governo FHC se fez também com a compra de votos parlamentares para assegurar sua reeleição e pelo governo Lula da compra de votos parlamentares para aprovarem os projetos do governo no Congresso Nacional como ficou comprovado no processo do mensalão.

Para evitar a adoção desta prática espúria considerada como “velha política” por Marina Silva, ela se propõe a tornar como aliados Lula e FHC conforme afirmou um dos seus principais conselheiros o economista Eduardo Giannetti em entrevista à Folha de S. Paulo (Ver a matéria Queremos Lula e FHC como aliados, diz conselheiro econômico de Marina publicado no website
<http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/08/1505301-queremos-lula-e-fhc-comoaliados-diz-conselheiro-economico-de-marina.shtml> no dia 25/08/2014). Em entrevista à Folha, Eduardo Giannetti afirma que, se for eleita, Marina procurará pessoas do PT e do PSDB para formar sua equipe de governo e garantir apoio a seus projetos no Congresso. Para Giannetti, até os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso poderiam colaborar.

Eduardo Giannetti afirmou que tentaria levar para o governo membros de siglas rivais. Segundo Giannetti, o PSDB é um partido de muitos técnicos e pouca liderança e o PT também tem técnicos de excelente qualidade, que trabalharam no primeiro mandato de Lula, e que adoraria levá-los para integrar o futuro governo Marina Silva. Eduardo Giannetti afirmou que a ideia é a de governar com os melhores na política e na gestão de políticas públicas. Além de assegurar a governabilidade do futuro governo Marina Silva com a constituição de um amplo governo, esta estratégia viria suprir uma das deficiências do PSB e da Rede Sustentabilidade que é a de não dispor de quadros técnicos competentes para assumir os encargos de governar o país.

A estratégia de atrair o PSDB e o PT para comporem o futuro governo Marina Silva ao lado do PSB, Rede Sustentabilidade e partidos aliados seria possível de se realizar porque todos eles rezam no mesmo credo neoliberal baseado no conjunto de medidas preconizado pelo FMI e pelo Banco Mundial — o Consenso de Washington — que estabeleceu três passos a serem dados pelos governos no mundo na seguinte ordem: 1) estabilização da economia (combate à inflação); 2) realização de reformas estruturais (privatizações, desregulamentação de mercados, liberalização financeira e comercial); 3) retomada dos investimentos estrangeiros para alavancar o desenvolvimento. Eduardo Giannetti deixa bem claro em sua entrevista que o governo Marina Silva pretende restabelecer o tripé macroeconômico (câmbio flutuante, meta de inflação e disciplina fiscal) que tinha sido construído no segundo mandato de FHC e foi confirmado e reforçado por Lula em seu primeiro governo.

Segundo Giannetti, durante o governo Dilma Roussef o Brasil deixou de cumprir por incompetência o Consenso de Washington passando a enfrentar inflação alta, artificialmente controlada e a lidar com o câmbio supervalorizado que prejudica a indústria brasileira. Além disso, afirma que estamos com um déficit em conta corrente nas trocas com o exterior de 3,2% do PIB, o que nos coloca de volta na vulnerabilidade externa do primeiro mandato de FHC. E isso com o menor crescimento da era republicana, excetuando os governos de Floriano Peixoto e Collor. O propósito do governo Marina Silva é o de fazer com que o credo neoliberal volte a ser competentemente executado no Brasil assegurando a independência do Banco Central cujos presidentes e diretores teriam mandatos fixos e não estariam sujeitos a ordens do presidente da República.

Tornar o Banco Central independente significa, na prática, fazer com que sejam assegurados os interesses do sistema financeiro nacional e internacional que foram mantidos pelos governos FHC, Lula e Dilma Roussef, haja vista que os Bancos Centrais se constituem em todo o mundo no quartel general do capital financeiro em todos os países.

Não é por acaso que uma das principais conselheiras de Marina Silva é Neca Setúbal vinculada ao grupo Itaú. Embora Marina Silva se apresente como uma alternativa ao PT e PSDB na política brasileira, muito do que ela defende na economia representa uma volta à rota proposta pelo PSDB e mantida pelo PT. Não há contradição de Marina Silva com o PT no que concerne à manutenção de programas como o Bolsa Família que, segundo, Giannetti, são intocáveis.

Segundo Giannetti, o gasto com o Bolsa Família não é problemático. Em sua opinião, o gasto público aumentou porque o governo deu isenções de impostos em torno de R$ 250 bilhões para setores escolhidos. O incentivo do BNDES para um grupo seleto de empresas é maior do que o gasto com o Bolsa Família. Giannetti defende a tese de que é impensável aumentar impostos e de que é necessário ser muito criterioso nos gastos públicos identificando onde eles vêm crescendo. A regra de ouro é que os gastos correntes não podem crescer mais do que o PIB. Significa também rever isenções tributárias. Giannetti afirma que o governo mexeu discricionariamente em impostos com base na pressão de setores empresariais para obter benefícios, não só de impostos como o IPI, mas também nas tarifas de importação. Com a economia retomando o crescimento e com os gastos públicos crescendo menos do que o PIB, no tempo, seria possível corrigir esta distorção. Este seria o caminho proposto por Eduardo Giannetti para superar os problemas econômicos do Brasil.

Percebe-se, pelo exposto, que o Brasil manterá lamentavelmente o “status quo” qualquer que seja o vencedor das eleições presidenciais. Isto é, o modelo neoliberal inaugurado por FHC e mantido pelos governos Lula e Dilma Rousseff seria revigorado. Isto significa dizer que as taxas de juros Selic continuarão a crescer da mesma forma que a dívida pública interna em benefício do sistema financeiro e em detrimento do povo brasileiro que ficará carente dos serviços públicos de educação, saúde, infraestrutura, entre outros, porquanto grande parte das receitas do governo federal continuará a ser destinada ao pagamento do serviço da dívida pública. Em 2013 quase metade do orçamento do governo federal foi destinado ao pagamento dos encargos com a dívida pública. Trata-se de uma situação insustentável que nenhum dos candidatos presidenciais se propôs a solucionar para não se atritar com os detentores do sistema financeiro nacional e internacional. Diante deste fato, tudo leva a crer que o Brasil será levado à bancarrota pelo fato de manter em operação o falido modelo econômico neoliberal.


*Fernando Alcoforado, 74, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.

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