TREM BALA: O governo via as costas para experiências no exterior
indicando que o projeto Brasil será altamente deficitário
(Tudo se derreteu no imaginário das promessas. Dentre tantas outras
balelas)
Miragem, miragem, cada vez mais miragem. O adiamento da concorrência pública para o crescentemente
improvável trem-bala São Paulo-Campinas-Rio transformou o projeto, para quem
ainda acreditava nele, em uma daquelas miragens brasileiras que, para
se materializarem, será preciso ver para crer. Mas ver mesmo, pronto,
funcionando, e repleto de passageiros.
A concorrência pública já fora adiada não sei
quantas vezes — agora, o governo cancelou de novo e
diz que vai demorar pelo menos um ano para voltar a realizá-la –, a
data de entrada em operação já namorou com 2014, ano da Copa do Mundo, e depois
com 2016, ano das Olimpíadas do Rio, e agora os responsáveis pela
empreitada tornaram a jurar, como já fizeram antes, que o
trem começará finalmente a transportar passageiros no distante, longínquo
ano de 2020.
A ver.
Alguém acredita:
De todo
modo, para a magérrima, absurdamente insuficiente malha ferroviária brasileira,
o caríssimo trem-bala – não me peçam para dizer quanto custará, porque os
números já oscilaram tanto que prefiro não registrar mais as promessas oficiais
de que vai devorar 33 bilhões, enquanto o pessoal do ramo acha que não sairá
por menos de 50 bi – será mais ou menos como se o poder público,
podendo escolher entre construir 1 milhão de casas populares ou
uma versão tropical do Palácio de Versalhes, preferisse investir na arquitetura
barroca, no ouro, nos cristais, nas tapeçarias, nas obras de arte e nos
fabulosos jardins e fontes onde se refestelava a monarquia absolutista
francesa.
E, como já
fiz antes, e voltarei a fazer, daqui de meu posto de leigo, duvido solenemente
dos anúncios de que o nosso trem-bala será rentável. Para isso, citarei alguns
números de estarrecer sobre o que ocorre no estrangeiro, dados para os quais o governo brasileiro simplesmente vira as costas,
fingindo que não existem.
O AVE espanhol: apesar de muito bem administrada, a
rede de alta velocidade é altamente deficitária (Foto: intereconomia.com)
Mesmo bem
administrada e contando com equipamento de alta tecnologia, é altamente deficitária a
maior rede de trens de alta velocidade da Europa e a segunda mais extensa do mundo, depois da China – a do AVE da
Espanha, com 3.500 quilômetros, 10 diferentes linhas em atividade e,
devido à crise econômica que abala o país desde 2008, outras 14
em processo lentíssimo de construção.
A tragédia recente ocorrida na Galícia, com 80
mortos e centenas de feridos, não muda o que escrevi acima: a rede espanhola é
muito eficiente tecnicamente e muito bem administrada, e o acidente em Santiago
de Compostela foi claramente um caso isolado.
Mas a
situação deficitária da rede chega a tal ponto que, recentemente, o governo do
primeiro-ministro Mariano Rajoy se viu obrigado a fechar, pura e simplesmente,
a linha que ligava Toledo, capital de Castilla-La Mancha, a Albacete, na mesma
região – 260 quilômetros que custaram 3,5 bilhões de euros.
Para que se
tenha uma ideia da dimensão do enrosco (tanto o espanhol como o nosso), é
deficitária até mesmo a mais utilizada das linhas da rede espanhola – a
concorrida ligação pelo AVE entre a capital, Madri, e a segunda maior cidade do
país, Barcelona, com 657 quilômetros de extensão. Nesse trecho, o AVE vem
ganhando a concorrência com as empresas de aviação, mas leva algo como
11 mil passageiros por quilômetro por ano, ao passo que a linha
Tóquio-Osaka, no Japão, por exemplo, conduz um número mais de 22 vezes superior
— 245 mil passageiros.
A passagem
de trem Madri-Barcelona pode custar caríssimo: conforme data e horário, até 300
euros, ou 900 reais.
Ainda que com preços salgados, as passagens são subsidiada em
66% pelo governo, segundo estudos de dois respeitados especialistas: Ginés de
Rus, catedrático de Economia Aplicada da Universidade de Las Palmas de Gran
Canaria (veja currículo) e
Germà Bel, catedrático de Economia da Universidade de Barcelona (confira currículo).
O TGV francês perto de Avignon, na região da
Provence: a rede da França transporta muito mais passageiros por linha do que a
da Espanha (Foto: www.b-europe.com)
Outros
números: comparados com os 2,5 milhões de passageiros que usam o AVE
Madri-Barcelona por ano, 14 milhões viajam de Paris a Tours pelo equivalente ao
AVE e pioneiro TGV francês no mesmo período, enquanto, na Coreia do Sul, o
trajeto entre a capital, Seul, e a cidade portuária de Busan, a segunda maior
do país, com 4,5 milhões de habitantes na área metropolitana, transporta
impressionantes 35 milhões de passageiros anuais em seus pouco mais de 300
quilômetros.
Quem
acreditar que a futura linha São Paulo-Rio, passando por Campinas, atinja algo
remotamente próximo a esses números – ainda mais com os baixos preços das
passagens aéreas no trecho – deve também ter fé cega na existência do coelhinho
da Páscoa e do saci-pererê.
Nota do Blog do Facó. Vale
salientar que o projeto Trem bala brasileiro (Rio-São Paulo-Campinas) já
consumiu dois bilhões de dólares e ainda nem saiu do papel, Era para ser
inaugurado em 2014, agora fica para as calendas.
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