Artigo de
Raymundo Pinto
É desembargador aposentado do TRT, é escritor, membro da
Academia de Letras Jurídicas da Bahia e da Academia Feirense de Letras.
A notícia foi divulgada sexta-feira passada, cinco dias
após a eleição, informando que as contas públicas tiveram, em setembro, o pior
resultado desde 2008. Comparando-se a receita com a despesa – sem contar os
juros, ressalte-se – e reunindo-se os resultados negativos da União, Estados,
Municípios e empresas estatais, no indicado mês, o déficit total alcançou a
estratosférica quantia de 25,5 bilhões de reais. Desse valor, segundo o Tesouro
Nacional, somente o Governo Central gastou cerca de 20 bilhões a mais do que
arrecadou, também sem incluir juros. Os estudiosos de contabilidade pública
ficaram alarmados com a constatação de que, até agosto, verificaram-se pequenos
superávits nas mesmas contas, porém, com o “rombo” do mês imediato, o saldo
negativo correspondente aos primeiros nove meses do corrente ano, chegou a nada
menos de 15 bilhões, importância somente superada na época do Plano Real
(1994).
Há que se reconhecer que os desmandos e a incompetência na
gestão das finanças públicas não é algo recente. O Governo Federal, de longas
datas, dá o péssimo exemplo e os dirigentes estaduais e municipais não ficam
atrás. Providências como a extinção dos bancos oficiais dos estados e a lei de
responsabilidade fiscal amenizaram em parte o problema, mas foram incapazes de
deter a “sanha” de exageradas despesas e total descontrole com o dinheiro do
povo. A desenfreada corrupção que atinge quase todos os setores da sociedade é
um fator que muito contribui para os desequilíbrios orçamentários. Apesar de os
brasileiros mais esclarecidos possuírem plena consciência da importância de
enfrentar a vexatória situação, causa perplexidade não se ter discutido a
questão – ou, ao menos, tocado no assunto – durante a campanha política que
antecedeu as últimas eleições. Sem dúvida, foi a mais grave omissão cometida por candidatos e políticos em
geral.
Se os números recentes espantam, o conhecimento profundo da
chamada dívida pública provoca em nós verdadeira revolta. Pena é que, sob a
desculpa de que seriam temas demasiadamente “técnicos”, subtrai-se da população
a transparente e livre discussão do assunto. Até a imprensa e a oposição
silenciam sobre isso. O PT fez severas críticas a Fernando Henrique porque
iniciou o governo (1994) com uma dívida (interna e externa somadas) superior a
108 bilhões de reais e, quando findou o mandato oito anos depois, deixo-a em
mais de 658 bilhões. Ele foi forçado a enfrentar algumas crises internacionais
e a comprometer o orçamento para implantar o Plano Real, que reduziu
drasticamente a inflação. Pois bem, o crítico Lula, no final de sua gestão
(2010), deixou o país devendo mais de um
trilhão e 500 bilhões, mesmo tendo alardeado que teria quitado o débito com
o FMI. Sua sucessora Dilma, em apenas quatro anos, já elevou a dívida pública para além
de dois trilhões e 400 bilhões.
Os sucessivos governos federais sempre fizeram questão
de não revelar ao povo a real parcela do orçamento da União que se destina ao
pagamento de juros e amortizações da referida dívida, que beneficia, em
especial, bancos, investidores (nacionais e estrangeiros) e seguradoras. Caro
leitor, se você estiver em pé, sente-se e acalme-se para ler o seguinte: o
montante de dinheiro para satisfazer essas despesas alcança cerca de 43% do total da receita do orçamento. Mais
de 20% vai para cobrir o déficit da Previdência Social e mais de 10%, com as
transferências legais para estados e municípios. O que sobra dirige-se aos necessários
investimentos públicos (insuficientes, como se sabe) e às despesas com
educação, saúde, defesa e segurança pública. Os gastos com esses quatro últimos
setores, uma vez somados, ainda são bem inferiores ao que os banqueiros e investidores
recebem só de juros... Gravíssimo é que os políticos – tanto da situação e como
da oposição – não denunciaram tal absurdo na campanha e, em consequência, nada
propuseram para resolver o problema.
Todos nós conhecemos um parente, um amigo ou um
conhecido que se mostram bastante desequilibrados no trato das finanças
domésticas. Muitos compram por impulso, sem ter nenhum cuidado de examinar se a
aquisição de um certo bem estaria dentro de suas possibilidades. Contraem
dívidas em excesso e, na hora de quitá-las, verificam que sua renda é
insuficiente. Apelam, então, para empréstimos bancários, parcelam o cartão de
crédito (cujos juros são extorsivos), usam o cheque especial (também altos
juros) ou, no desespero, caem até em mãos de insensíveis agiotas. Como dizem
que os governos refletem as qualidades e defeitos de seu povo, é possível que
esse descontrole de elevado contingente dos cidadãos e cidadãs exerça
influência nas atitudes dos nossos dirigentes. Urge, pois, uma forte reação a
essa verdadeira “cultura” do desperdício e sua irmã gêmea: a corrupção.
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