Não encontramos aqui, na quantidade desejada, mecenas como há nos Estados
Unidos. Capazes de doar parte de suas fortunas para sustentar uma pinacoteca,
uma biblioteca, um museu, uma universidade, para reformar monumentos
históricos, promover estudos e pesquisas científicas.
No
ocaso da década de cinquenta, teve início na Bahia, com danosa consequência
para Salvador, à demolição de inúmeras edificações que constituíam parte
integrante de sua vida. Tudo em nome do progresso e da modernidade. Nada
escapava. As picaretas e as marretas incumbiam-se da tarefa com agilidade
surpreendente. Em poucas horas, deitavam ao chão preciosidades arquitetônicas
que levaram anos para serem erguidas. Assim como hoje procedem as motosserras,
dizimando nossas florestas que a natureza, por séculos, se incumbiu de fazê-las
florescer e agigantar-se.
A
insanidade era tanta que jogaram abaixo os exuberantes palacetes que enfeitavam
a ladeira de São Bento, substituindo-os por arranha-céus onde predominam o
granito, o vidro e alumínio. Da mesma forma procederam com os belíssimos
prédios (arte decô) que abrigavam a imprensa Oficial do Estado e a Biblioteca
Pública, em frente ao Palácio Rio Branco, na Praça Municipal, dando lugar a um
enorme estacionamento, logo apelidado pelo povo de “cemitério de Sucupira”. No
Rio Vermelho, sobre as estruturas de um antigo reduto ou fortim, onde eu e
amigos mirins brincávamos, construído pelos portugueses, para salvaguarda do
litoral norte da cidade, o único baluarte defensivo da área, se não
considerarmos a Casa da Torre como fortaleza, erigiram uma igreja. Além de
permitirem a degradação de centros históricos, museus, fortificações, orgulho da
engenharia militar colonial, que embelezavam a cidade e contavam grande parte
da sua história.
Essas
depredações continuadas, algumas com a intervenção e leniência do poder
constituído, dos próprios públicos e tantos outros particulares, só minorou,
faça-se justiça, com a assunção de Antônio Carlos Magalhães, como Prefeito de
Salvador, nos idos de 1967. Lúcido como administrador, amando a Bahia,
particularmente Salvador de maneira apaixonada, e as artes, quiçá
compulsivamente, pôs cobro a tais espoliações, saques ao patrimônio coletivo
baiano, partindo para recuperar o quanto dizia respeito à memoria da sua terra
natal e da nacional. Ação que teve continuidade nas suas subsequentes
administrações como governador do Estado, cujo exemplo maior é a recuperação e
revitalização do Pelourinho.
Mesmo
assim, até hoje, ainda persistem as mesmas condições desfavoráveis à proteção
do nosso patrimônio cultural e artístico. E
um dos principais agentes desse mal, no particular, é o IPHAN, Instituto do
Patrimônio Histórico Artístico Nacional, conhecido em todas as latitudes do
vasto Brasil como INFAME, por sua leniência na preservação de tais valores.
Criaram-se
as leis de incentivo à cultura, Rouanet, de âmbito nacional, Faz Cultura, de
caráter regional, que se mostram mais receptivas aos problemas. Entretanto,
pouco mudou na mentalidade da nossa gente. Como o Estado, obrigado a atender às
demandas da população, passando pela saúde, educação, saneamento, segurança
pública, mobilidade urbana (transporte de qualidade), cultura, não pode arcar,
sem ajuda, com as despesas para a solução de tantos desafios, era de se esperar
não só o apoio do poder central através do Ministério da Cultura e outros
órgãos periféricos, mas atrelados a esses problemas, que sempre se fizeram
tíbios, como também a ajuda substantiva dos contribuintes aos projetos
culturais. Entretanto, ele se faz a conta-gotas, frouxo. Não encontramos aqui,
na quantidade desejada, mecenas como há nos Estados Unidos. Capazes de doar
parte de suas fortunas para sustentar uma pinacoteca, uma biblioteca, um museu,
uma universidade, para reformar monumentos históricos, promover pesquisas
científicas. Os nossos são parcimoniosos em suas doações, quase avaros.
Felizmente,
porque somos guardados por todos os santos e guiados pelos orixás das águas e
da terra, talvez sejamos um oásis, neste aspecto, comparando-nos com os demais
estados da federação. No passado Carlos Costa Pinto doou à Bahia todas as obras
de arte que colecionou em vida. Hoje, Norberto Odebrecht, através da fundação
que leva o nome do seu pai, Emílio, investe pesadamente em projetos que
resgatam a memória da Bahia e de Salvador.
Mas
ainda é muito pouco. Urge dar consciência àqueles que dispõem de recursos para
que contribuam efetivamente, unindo-se aos que não podem fazê-lo, mas que
cooperam graciosamente com trabalho, ideias, movidos pela obsessão em legar aos
pósteros dados sobre as especificidades da nossa formação e grandeza históricas
dos nossos avoengos.
Não
tornemos nossos ouvidos moucos quando solicitados a colaborar com a cultura.
Unamo-nos no alcançar tais objetivos. Basta de depredar. A hora é de preservar,
reconstruir e construir. Os nossos filhos e netos agradecerão.
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