O Museu
de Arte de São Paulo (Masp), conhecido por seu bilionário acervo de grandes
mestres europeus (Rafael, Goya, Velázquez, Cézanne, Van Gogh, Picasso), está
prestes a ganhar a mais valiosa coleção asiática do Brasil. Nesta quinta-feira,
o diplomata Fausto Godoy assina com a direção do museu um contrato para a
cessão de sua coleção, iniciada um ano após ser convidado a assumir um posto na
embaixada do Brasil em Nova Délhi, em 1983. Desde então, Godoy ocupou cargos
oficiais nas embaixadas de Nova Délhi, Pequim, Tóquio e Islamabad, além de ter
cumprido missões transitórias no Vietnã e em Taiwan. Todo esse percurso ajudou
a construir esse acervo de valor inestimável que deverá ser instalado, a partir
de 2012, no espaço hoje ocupado pelo restaurante Degas, no subsolo do museu.
Sem
exagero, trata-se de uma coleção que vai colocar o Masp no patamar do
Metropolitan de Nova York. O museu integra desde 2008 o “Clube dos 19″, que
congrega os 19 museus com os melhores acervos da arte europeia do século 19,
como o Museu D’Orsay, o Instituto de Arte de Chicago e o próprio Metropolitan.
De imediato, Godoy entrega em comodato por 50 anos quase 2 mil peças que
resumem séculos de história das civilizações asiáticas. Seu empenho, diz o
diplomata, é “criar massa crítica no Brasil para o continente que se afigura
como o mais importante do século 21″. Assim, não se trata apenas de doar uma
coleção construída nas últimas três décadas, mas de estabelecer o marco zero de
um futuro centro de estudos asiáticos. Aos 65 anos, Godoy diz ter canalizado para
o continente asiático sua carreira na diplomacia por estar convencido do papel
que países como a China, a Índia e o Japão iriam representar no século 21.
“Mais da metade da população vive ali”, lembra o diplomata, concluindo: “É
fundamental nossa interação com esses países, cujo papel é decisivo na
formatação do mundo globalizado”.
Até manga no acervo
O Masp
aceitou a condição imposta por Godoy para o comodato com testamento anexado: a
de ter um curador permanente para a coleção, ponto de partida para um objetivo
maior, o de ensinar aos brasileiros como o antigo convive com o contemporâneo
nessas culturas, que não enxergam a arte compartimentada como no Ocidente.
Essas 2 mil peças da coleção de Godoy integram um catálogo abrangente das
civilizações asiáticas que abarca desde um Narasimha, quarto avatar do deus
Vishnu – primeiro objeto adquirido pelo diplomata num antiquário de Nova Délhi,
em 1984 – até mangás japoneses, passando por gravuras Ukiyo-e do século 19,
peças de mobiliário, objetos de porcelana chinesa e até um Buda do século 6.º
em tamanho natural.
Ukiyo-e do acervo do Museu de Boston
Curador-chefe
do Masp, o professor e crítico Teixeira Coelho mostra-se entusiasmado com a
perspectiva de ampliação do museu que, no próximo ano, ganha um prédio
exclusivo para a administração, ao lado de sua sede na Avenida Paulista. Para
lá será transferido o restaurante e toda a parte burocrática do Masp. Antes,
ainda sem data marcada, será realizada uma exposição com peças selecionadas do
acervo cedido em comodato ao museu. Como Godoy é o maior conhecedor de sua
coleção, ele será o curador da mostra. “Só colecionei obras de temas que
conhecesse e não há uma só peça comprada por impulso apenas”, diz o diplomata.
“Com essa coleção, o museu ganha não só um acervo que o coloca ao lado do
Metropolitan”, diz Teixeira Coelho. “É quase como uma refundação do Masp”,
resume.
O diplomata diz que optou pelo Masp para doar sua
coleção considerando o compromisso do museu com a educação. “Pensei em doar
para uma universidade, mas as peças iriam morrer em salas que só acadêmicos
veriam.” As informações são do jornal O Estado de
S. Paulo. Por Antonio Gonçalves Filho, jornalista e crítico de arte.
FAUSTO GODOY
Em 1968, o diplomata Fausto Godoy, 65 anos, saiu de
Bauru para o mundo. Primeiro, fez doutorado em direito internacional público em
Paris. Depois, já na carreira diplomática, que começou em
1976, serviu nas embaixadas de Bruxelas, Buenos Aires, Nova Déli,
Washington, Pequim, Tóquio, Islamabade (onde foi Embaixador do Brasil, em
2004). Também cumpriu missões transitórias no Vietnã e Taiwan.
Viveu
15 anos na Ásia, para onde orientou sua carreira por considerar que o
continente seria o mais importante do século 21 – previsão que, agora, vê cada
vez mais perto da realidade.
Foi na
cidade natal que pensou quando decidiu ceder sua coleção de duas mil peças de
arte asiática, formada a partir da década de 1980, período em que assumiu posto
na embaixada brasileira em Nova Déli.
O
diplomata conta que planejou doar a coleção para a USC (Universidade do Sagrado
Coração). Chegou a conversar com a direção da universidade, mas depois decidiu
ceder para o Masp (Museu de Arte de São Paulo).
“Sou
membro do Conselho Curatorial do museu e acredito que, pela importância
museológica do Masp, a coleção terá maior visibilidade para o Brasil, que é o
que almejo”, diz. “Temos o dever de chamar a atenção da população brasileira
para aquele continente, ainda tão longe dos nossos radares.”
É no
continente asiático, lembra Fausto, que estão três das maiores economias do
mundo: China, Japão e Índia.
A
doação da coleção, definida por especialistas como a mais valiosa de arte
asiática no Brasil, foi formalizada há uma semana, com a presença de diretores,
conselheiros e coordenadores do Masp, além do diplomata e família.
“Acredito
que a coleção vai abrir uma nova vertente no Masp, que se torna mais
cosmopolita e menos eurocêntrico, acompanhando a mudança do paradigma
geoeconomico-político internacional”, afirma Fausto.
A
doação, feita a partir de um contrato de comodato, obedece condições
apresentadas pelo bauruense: haverá um curador permanente e há o objetivo de
ensinar ao público como o antigo convive com o contemporâneo nas culturas
orientais.
É o
início de um centro de estudos asiáticos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário