Colaboração de Fernando Alcoforado*
O descalabro do setor de energia no Brasil não se
restringe à corrupção constatada na Petrobras e Eletrobrás em consequência da Operação
Lava Jato da Polícia Federal. Este descalabro acontece também na gestão do setor de
energia que compromete o planejamento e a operação dos sistemas elétrico e de
petróleo e gás natural do Brasil. Enquanto o setor elétrico se defronta com o problema
dos “apagões” que se multiplicam a cada ano e com a vertiginosa elevação das
tarifas de energia elétrica, o setor de petróleo e gás enfrenta a possibilidade
de desabastecimento de combustíveis e de elevação de seus preços tudo isto em
consequência da incompetência gerencial e falta de planejamento eficaz do
governo federal que se caracteriza há anos pela improvisação.
O planejamento eficaz dos setores elétrico, de
petróleo e gás natural é aquele que deve ser desenvolvido com vários anos de
antecedência e baseado em estudos técnicos e econômicos. A gestão competente
tem que ser baseada no planejamento de longo prazo e com visão sistêmica. O
planejamento energético de longo prazo no Brasil, por exemplo, ainda não
considera os potenciais impactos das mudanças climáticas no sistema energético
brasileiro. Portanto, sem a cultura do planejamento e a não utilização de
profissionais competentes nas ações do governo federal, o resultado só poderia
ser o que vem se registrando no setor elétrico sujeito a “apagões” que se
multiplicam e à ameaça de desabastecimento de combustíveis que ainda não
ocorreram porque é pífio o crescimento econômico do Brasil.
A má gestão da Petrobras pelos atuais detentores do
poder é comprovada ao se constatar que, apesar dos recordes de produção de
petróleo e do crescimento das vendas de seus derivados de 2003 a 2013, os ganhos ou
os lucros da empresa estancaram neste período. Além de apresentar um
desempenho econômico-financeiro medíocre, a Petrobras foi vítima, entre outras coisas,
da ação articulada
de uma quadrilha de empreiteiros, burocratas, lobistas
e dezenas de políticos que assaltaram os cofres da empresa comprovada pela
operação Lava Jato da Polícia Federal. Nos últimos tempos, a Petrobras tem sido
objeto de escândalos sucessivos através da imprensa envolvendo a compra de duas
refinarias (Pasadena e Okinawa) e a implantação da refinaria Abreu e Lima em Pernambuco.
Em todos os casos ficou evidenciada a incompetência dos dirigentes da
Petrobras que fizeram compras lesivas
aos interesses da empresa e do próprio País e a
existência de indícios de corrupção que está sendo tratada pela Polícia
Federal, Ministério Público e Tribunal de Contas da União (TCU).
Enquanto o total de investidores na Bolsa de Valores
brasileira aumentou 15% de 2008 a 2013, o número de acionistas da Petrobras diminuiu
16% nesse mesmo período. A contenção dos preços de combustíveis imposta pelo
governo federal para combater a escalada da inflação obriga a Petrobras a vender
óleo diesel e gasolina no mercado interno por menos do que paga na importação. A tão propalada autossuficiência de petróleo que o governo federal afirmava ter o Brasil
atingido foi colocada em xeque pelo fato de o Brasil estar exportando petróleo cru,
mas ainda ser dependente de
gasolina e diesel refinados no exterior, que têm maior
valor. Implementada com o questionável propósito de combater a inflação por
meio do congelamento artificial de tarifas, a contenção dos preços de gasolina e diesel
resultaram em perdas de R$ 7 bilhões em 2013 para a Petrobras.
Os resultados alcançados pela Petrobras recentemente
decorrem da gestão temerária da empresa imposta pelo governo Dilma Rousseff. A
empresa não consegue cumprir as metas de produção, diversas vezes revisadas para
baixo nos últimos anos. A Petrobras hoje vale cerca de 40% do que valia em 2011. A dívida da Petrobras cresceu exponencialmente atingindo R$
221,6 bilhões --alta de 50% só em 2013--, e suas ações sofreram queda vertiginosa da ordem de 60% de seu
valor patrimonial. Tudo isto configura má gestão, além de ficar também demonstrado
o descompromisso do governo federal e dos responsáveis pela condução da
Petrobras com os interesses da empresa e seus acionistas e, também, com os
interesses nacionais.
Uma decisão equivocada tomada pelo governo Dilma
Rousseff foi a de incentivar o aumento das vendas de automóveis no Brasil com a
redução do IPI sem haver o correspondente planejamento da expansão da produção de
combustíveis necessária ao atendimento da demanda, nem criar a logística
imprescindível à sua distribuição em todo o País. A própria importação de combustíveis está
sendo comprometida com a falta de infraestrutura dos portos, hoje sem espaço
para atracação e armazenamentos.
Além de demonstrar incompetência no planejamento da
produção e da logística de importação e distribuição de combustíveis derivados
de petróleo, o governo federal não propiciou também as condições para o
adequado planejamento dos sistemas de transporte das cidades que se defrontam
na atualidade com problemas gigantescos de congestionamentos resultantes do número excessivo de
automóveis que ocupam suas ruas e avenidas.
Os acontecimentos protagonizados pelo governo Dilma
Rousseff comprometem a saúde financeira da Petrobrás não apenas por impedir a
capitalização da empresa com a restrição por vários anos do aumento nos preços
dos combustíveis, em especial da gasolina, para manter a inflação sob seu controle, mas
também pela descapitalização da Petrobrás resultante da malfadada compra da
refinaria de Pasadena nos Estados Unidos e Okinawa no Japão e a construção da
refinaria Abreu e Lima em Pernambuco. Tanto a contenção dos preços dos
derivados de petróleo para manter a inflação sob controle quanto a compra e
construção das refinarias estão contribuindo para a continuada queda do valor
das ações da Petrobrás na Bolsa de Valores.
Por sua vez, a Eletrobrás, que acaba de admitir que
não disporá de recursos para pagar dividendos este ano, foi também vítima da
incompetência e insensatez da presidente Dilma Rousseff que, através da MP 579 de
2012, antecipou a renovação das concessões de energia mediante a redução das
tarifas de energia elétrica. Além da queda do seu valor de mercado, com ações negociadas
abaixo do valor
patrimonial, a Eletrobrás teve prejuízo de R$ 2,7
bilhões só no terceiro trimestre deste ano, o que inviabiliza a remuneração mínima de
6% prometida aos acionistas. A operação Lava Jato da Polícia Federal está
identificando também a ação das empreiteiras corruptoras na Eletrobrás com a construção
da Usina Hidrelétrica de Jirau na Amazônia. O escândalo da Petrobras e a
debacle da Eletrobrás chocam pela incompetência na gestão das empresas e pela
magnitude da corrupção. Temos, portanto, um governo que quebrou nossas duas
principais empresas estatais.
Além de enfrentar problemas com a Eletrobrás, o setor
elétrico do Brasil se defronta com a ameaça de racionamento de energia
elétrica que só não ocorrerá se o País não voltar a crescer economicamente. A ameaça de
racionamento de energia elétrica resulta não apenas da falta de chuvas, mas,
sobretudo, da má gestão do setor energético que fizeram o Brasil chegar a uma situação
crítica no setor elétrico. O racionamento de energia elétrica pode resultar, de um
lado, da elevação da demanda de eletricidade e, de outro, da insuficiência da
produção pelas hidrelétricas que estão
gerando menos energia do que são capazes, porque há
pouca água disponível em seus
reservatórios, e as termelétricas estarem operando à
plena capacidade. O racionamento de energia elétrica tende a ser inevitável em
2015 porque os reservatórios das usinas hidrelétricas do Brasil estão no nível
mais baixo dos últimos dez anos -- apenas 32,3% do total.
* Fernando Alcoforado, 74, membro da
Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e
Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor
universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento
empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é
autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a
FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um
Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento
do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944,
2003), Globalização e desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia-
Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era
Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case
of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken,
Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e
Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e
combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio
Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico
e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.
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