Por Joaci Góes
A renúncia
do Ministro da Controladoria Geral da União, Jorge Hage, caiu como uma ducha de
água gelada no ânimo das pessoas que tinham esperança no rigor das apurações da
operação Lava-Jato, apontada como o maior escândalo de corrupção de todos os
tempos, em qualquer parte do mundo, envolvendo algumas das maiores autoridades
da República.
De permeio
com a diplomática declaração de que precisava descansar, 12 anos depois de uma
marcante presença na Controladoria, nove dos quais como seu ministro titular,
Hage deixou registrado o seu inconformismo com a recusa dos dois presidentes a
que serviu em dar ao seu Ministério uma participação orçamentária compatível
com a importantíssima missão de auditar as contas dos entes públicos,
contribuindo para a punição dos corruptos.
Ministro
Jorge Hage, baiano de Itabuna
Os dados
mencionados por Hage corroboram a verdade palmar de sua grave denúncia: à
míngua de recursos, com, apenas, 0,05% do Orçamento da União, com um déficit de
nada menos do que 300 auditores, sem os meios adequados para se locomover no
continental território brasileiro, a Controladoria não tem como cumprir de modo
satisfatório seu papel saneador dos descalabros que têm marcado a Administração
Pública brasileira, nos últimos anos, em todos os níveis e esferas de poder,
com as exceções que confirmam a regra, como foi o caso da prefeitura do
município baiano de Ipiau, sob a administração de José Andrade Mendonça, onde a
Controladoria, então sob o comando de Waldir Pires, depois de duas semanas de
minuciosa análise, não encontrou a menor irregularidade. Em paralelo, centenas
de prefeituras na Bahia e no Brasil continuam com suas contas recusadas, sem
que nada aconteça com os prefeitos ladrões do Erário.
Mais grave,
ainda, do que as deficiências apontadas para o seu afastamento de uma função
onde consolidou sua biografia de seriedade e competência, segundo se especula,
Hage teria renunciado ao perceber sinais de uma bem urdida manobra de
bastidores destinada a pôr à margem das investigações e punições grande número
dos acusados, entre os quais deputados, senadores, empresários e membros da
mais alta corte do Executivo brasileiro, suspeições de cuja veracidade o tempo
logo dirá.
Para o
momento, o que é de lamentar-se, profundamente, é o abandono do campo da luta
de um homem público que ao longo de 12 anos manteve uma postura de invariável
fidelidade aos princípios republicanos de honradez e de prática do isonômico
princípio constitucional de que todos devem ser tratados, igualmente, diante da
lei. Numa fase da vida brasileira marcada pelo aparelhamento descarado das mais
caras instituições, a serviço do projeto de poder de um partido político, Jorge
Hage realizou o milagre de manter-se incólume a dúvidas de que nem o STF
conseguiu escapar.
Não é
difícil antever o cerrado escrutínio que o substituto de Hage vai sofrer
da opinião pública e da mídia nacional e estrangeira, na medida em que as
denúncias se aproximam, cada vez mais, da cúpula do Poder Executivo, expondo o
governo a singular escolha de Sofia: atuar na defesa dos malfeitores,
desqualificando-se com eles, ou optar por passar o País a limpo, no estilo da
“mane polite” que devolveu a dignidade ao povo italiano.
Em pleno
gozo de saúde física e mental, supõe-se que Jorge Hage, de muito bom grado,
passaria mais doze anos à frente de uma instituição moldada para ajustar-se ao
seu estilo severo e teimoso de ver o mundo e as coisas, em que devem prevalecer
critérios que valorizem o mérito e a decência. Uma pequena fração dos bilhões
de dólares desviados para os bolsos dos espertalhões seria suficiente para que
ele avançasse no seu trabalho de contribuir para a restauração da dignidade na
vida pública brasileira.
Não o
venceu o cansaço. Venceu-o a desesperança!
Nenhum comentário:
Postar um comentário