sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

UM MAU SINAL

Por Joaci Góes


A renúncia do Ministro da Controladoria Geral da União, Jorge Hage, caiu como uma ducha de água gelada no ânimo das pessoas que tinham esperança no rigor das apurações da operação Lava-Jato, apontada como o maior escândalo de corrupção de todos os tempos, em qualquer parte do mundo, envolvendo algumas das maiores autoridades da República.
De permeio com a diplomática declaração de que precisava descansar, 12 anos depois de uma marcante presença na Controladoria, nove dos quais como seu ministro titular, Hage deixou registrado o seu inconformismo com a recusa dos dois presidentes a que serviu em dar ao seu Ministério uma participação orçamentária compatível com a importantíssima missão de auditar as contas dos entes públicos, contribuindo para a punição dos corruptos.



Ministro Jorge Hage, baiano de Itabuna

Os dados mencionados por Hage corroboram a verdade palmar de sua grave denúncia: à míngua de recursos, com, apenas, 0,05% do Orçamento da União, com um déficit de nada menos do que 300 auditores, sem os meios adequados para se locomover no continental território brasileiro, a Controladoria não tem como cumprir de modo satisfatório seu papel saneador dos descalabros que têm marcado a Administração Pública brasileira, nos últimos anos, em todos os níveis e esferas de poder, com as exceções que confirmam a regra, como foi o caso da prefeitura do município baiano de Ipiau, sob a administração de José Andrade Mendonça, onde a Controladoria, então sob o comando de Waldir Pires, depois de duas semanas de minuciosa análise, não encontrou a menor irregularidade. Em paralelo, centenas de prefeituras na Bahia e no Brasil continuam com suas contas recusadas, sem que nada aconteça com os prefeitos ladrões do Erário.
Mais grave, ainda, do que as deficiências apontadas para o seu afastamento de uma função onde consolidou sua biografia de seriedade e competência, segundo se especula, Hage teria renunciado ao perceber sinais de uma bem urdida manobra de bastidores destinada a pôr à margem das investigações e punições grande número dos acusados, entre os quais deputados, senadores, empresários e membros da mais alta corte do Executivo brasileiro, suspeições de cuja veracidade o tempo logo dirá.
Para o momento, o que é de lamentar-se, profundamente, é o abandono do campo da luta de um homem público que ao longo de 12 anos manteve uma postura de invariável fidelidade aos princípios republicanos de honradez e de prática do isonômico princípio constitucional de que todos devem ser tratados, igualmente, diante da lei. Numa fase da vida brasileira marcada pelo aparelhamento descarado das mais caras instituições, a serviço do projeto de poder de um partido político, Jorge Hage realizou o milagre de manter-se incólume a dúvidas de que nem o STF conseguiu escapar.
Não é difícil antever o cerrado escrutínio que o substituto de Hage vai sofrer  da opinião pública e da mídia nacional e estrangeira, na medida em que as denúncias se aproximam, cada vez mais, da cúpula do Poder Executivo, expondo o governo a singular escolha de Sofia: atuar na defesa dos malfeitores, desqualificando-se com eles, ou optar por passar o País a limpo, no estilo da “mane polite” que devolveu a dignidade ao povo italiano.
Em pleno gozo de saúde física e mental, supõe-se que Jorge Hage, de muito bom grado, passaria mais doze anos à frente de uma instituição moldada para ajustar-se ao seu estilo severo e teimoso de ver o mundo e as coisas, em que devem prevalecer critérios que valorizem o mérito e a decência. Uma pequena fração dos bilhões de dólares desviados para os bolsos dos espertalhões seria suficiente para que ele avançasse no seu trabalho de contribuir para a restauração da dignidade na vida pública brasileira.
Não o venceu o cansaço. Venceu-o a desesperança!

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