quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

TCU CONFIRMA DEVASSA NA PETROBRAS

Administração/Política

 Ministro Bruno Dantas

 Por
Osvaldo Lyra

Baiano, ex-conselheiro Nacional de Justiça, e agora ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), o advogado Bruno Dantas chegou ao órgão num momento turbulento por causa dos escândalos da Petrobras, cujas investigações têm deixado todos os servidores que realizam as auditorias “estrarrecidos”. 

Em entrevista exclusiva ao repórter  Osvaldo Lyra, ele discorreu sobre as metas do órgão para 2015 e afirmou que o ano será de “muita Petrobras”. “Temos ficado estarrecidos com o volume de desvios. A verdade é que se acreditava muito na impunidade”, disse. 
No entanto, o ministro acredita que o País dará um salto no combate contra a corrupção com o fortalecimento das instituições públicas, entre elas o TCU, e a participação da sociedade na fiscalização dos atos e gastos de seus governantes.
Na entrevista, ele adiantou que este ano deverá ser realizada uma força- tarefa entre as instituições – Polícia Federal, Ministério Público Federal, TCU, dentre outros – para realizar auditoria em todos os contratos da estatal brasileira e virar “essa página de uma vez por todas”.

R - Como o senhor  avalia esse início de trabalho dentro do TCU?
BD - Eu tomei posse em agosto do ano passado e já cheguei no Tribunal em um momento turbulento. Isso porque, junto com O Ministério Público Federal (MPF), a Polícia Federal, o TCU tem capitaneado as apurações nesse escândalo da Petrobras.  Evidentemente que o trabalho do Tribunal não se limita a investigação da Petrobras, mas tivemos que tomar decisões importantes como a indisponibilidade dos bens de diretores da estatal. Estamos fazendo auditorias bastante rigorosas em diversos empreendimentos da estatal, como a refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, no Rio de Janeiro, e diversas outras auditorias estão em curso, de modo que eu já tomei posse no meio desse turbilhão. Mas o Tribunal não se resume a investigar a Petrobras. Temos tido um trabalho bastante sério e reconhecido pela opinião pública na questão das obras com irregularidades. Eu fui o relator este ano  do Fiscobras, um relatório anual que o TCU elabora para subsidiar  o Congresso Nacional na elaboração da lei orçamentária anual. Então tem uma lista de obras que o TCU encaminha com recomendação de paralisação para que não receba orçamento no exercício seguinte. Isso para falar apenas de um caso. Poderia citar outros, como por exemplo, o aval que nosso TCU deu para que a Anatel realize um leilão da banda 4G da telefonia móvel. São muitos temas importantes e eu estou bastante motivado porque o Tribunal, como já disse, tem angariado uma respeitabilidade muito grande da sociedade brasileira, e isso se deve basicamente a dois fatores: a independência de seus ministros e a qualidade técnica do setor público, que é formado por 100% de servidores concursados
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R - Como vê o escândalo da Petrobras para o momento do país?
BD - Esse episódio da Petrobras revela o êxito de uma forma de fiscalização que vem recebendo aprimoramento nos últimos anos e agora começa a dar os primeiros resultados, que é a integração dos órgãos de controle. Antigamente se fazia investigações paralelas, uma da PF, outro do MPF, outra da Receita, outra do CGU, outra do TCU. Nos últimos anos temos integrado as informações de modo a tornar muito eficiente o controle da atuação do Estado. Eu fico bastante satisfeito de o TCU ter sido, por exemplo, o primeiro órgão a intensificar aquela irregularidade havida na construção da Refinaria de Passadena, na Califórnia. De alguma forma, há quatro anos o TCU já havia indicado irregularidades graves e orientado o Congresso a suspender o repasse de recursos. O Congresso acolheu e naquela ocasião o Governo Federal decidiu vetar a lei orçamentária. Era uma obra que tinha inúmeras irregularidades, dos quais foram tirados muitos milhões de reais do povo brasileiro.

R - O Sr. acredita que  os desvios têm ligação direta com partidos políticos?
BD - É claro que nós temos acompanhado os desdobramentos dessa operação Lava Jato com tantas delações premiadas e referências a partidos políticos, mas não entramos nessa questão. Nosso trabalho é estritamente técnico. De auditar obras, verificar se os padrões aplicados na execução da obra foram aqueles que estão nos editais, se os aditivos estão de acordo com a lei, se o material utilizado é da mesma qualidade que deveria ser. E a realidade é que, sem adentrar na discussão sobre para onde vai esse dinheiro, temos ficado estarrecidos com o volume de desvios. A verdade é que se acreditava muito na impunidade. Por isso se tenha promovido tantos desmandos de uma maneira quase que sem disfarce. Felizmente temos mostrado que o Brasil possui instituições solidas, fortes e que funcionam, e que estão apurando, indicando responsáveis, e esperamos também que estes valores desviados retornem aos corfres públicos, pois o povo brasileiro precisa que os recursos sejam investidos, adequadamente, em saúde, segurança, obras de mobilidade urbana, infraestrutura... Não podemos nos dar ao luxo de jogar pelo ralo tantos bilhões de reais. 

R - O TCU já detectou algum tipo de irregularidade em outros órgãos que se assemelha a este da Petrobras? Tem outros órgãos sendo investigados?
BD - Temos auditoria em muitos órgãos federais e em muitos deles identificamos desvios. Claro que o episódio da Petrobras salta aos olhos porque a Petrobras é muito grande. Construir uma refinaria é necessário investimento de bilhões de reais. Para construir plataforma no mar são necessários bilhões de reais. Mas o TCU não pode ficar de olho apenas nesses grandes desvios. Temos que, com o nosso trabalho, implementar uma forma eficiente de gestão do gasto público. A gente precisa aperfeiçoar ainda mais nossos métodos de controle para evitar que casos como esse, casos de outras estatais que estamos auditando, se repitam. A verdade é que esse escândalo da Petrobras teve uma série de elementos que facilitam a ocorrência das irregularidades. Uma delas é o decreto editado no final do governo de FHC que permitiu a estatal contratar sem licitação. É um decreto que está tendo a constitucionalidade discutida pelo Supremo. O TCU espera que o Supremo declare a inconstitucionalidade desse decreto porque existe um entendimento em nossa corte de que as estatais não precisam seguir 100% a lei de licitações, mas devem obedecer aos quesitos da administração pública. A Petrobras não pode se comportar como uma empresa 100% privada porque ela não é.
R - O que fazer para modificar essa realidade?
BD - Acredito em uma atuação em duas frentes. Primeira, os órgãos de controle precisam estar, todos, bem equipados, bem aparelhados, com corpo técnico de alto nível, bem remunerado, com autonomia para trabalhar, com orçamento para reorganizar... Então é necessário que órgãos como Coaf, CGU, a Receita Federal, tenham densidade no seu corpo técnico. Isso é um aspecto importante. O outro é que cada cidadão brasileiro seja fiscal da administração pública. Por mais que o TCU se esforce, jamais conseguirá fiscalizar 100% dos atos praticados pelo Governo Federal. Dependemos da participação da sociedade para tomar conhecimento de irregularidades. A população só tem como cobrar, primeiro, se ela for consciente e, segundo, se tiver a seu dispor ferramentas de transparência que permitam a cada cidadão verificar uma parte dos governantes que estão mais próximo de si. Acredito muito que o TCU tem sistemas que se prestam a acompanhar os gastos do Governo Federal, mas acredito muito em capacitação de grupos sociais, de grupos comunitários que possam ali acompanhar se aquele valor, aquele convênio, está sendo gasto adequadamente. Se aquele recurso que o Governo do Estado está recebendo, em razão de algum convênio ou obra federal, está sendo bem executado, se a licitação está respeitando os parâmetros da lei... Acredito nessa dupla frente de trabalho. Uma, dos órgãos de controle trabalhando de forma estruturada, e a segunda é nós despertarmos na sociedade civil a necessidade de fiscalizar nossos governantes e sabermos para onde canalizar denúncias, queixas e indicações de irregularidades.

R - Qual o maior desafio do Tribunal para 2015?
BD - Eu acredito que 2015 ainda será um ano de muita Petrobras. Tenho conversado muito com os membros do MPF que atuam junto ao TCU, até porque na minha formação profissional, durante dois anos fui conselheiro do Conselho Nacional do MP, e talvez tenhamos que pensar em 2015 numa força-tarefa para auditar todos esses contratos da Petrobras e virar essa página de uma vez por todas. Para daí então passar para outro tema. Mas evidentemente que o TCU não pode parar nem se dedicar só à Petrobras. Estamos fazendo, devemos concluir agora no começo do ano,  as primeiras auditorias para medir a eficiência dos programas educacionais e de saúde do governo. Vamos avaliar se o programa Mais Médicos está dando à população o retorno que se espera, avaliar se o Pronatec está realmente chegando à população como deveria. Enfim, o TCU vem nos últimos anos passando por uma mudança de perfil. No passado o TCU se dedicava exclusivamente a avaliar a conformidade das contratações e das obras publicas. Agora, além de fazer o exame de conformidade, tem feito uma avaliação de governança pública. Ou seja, medir a eficiência das políticas públicas e de como isso está beneficiando a população brasileira. É possível praticar um ato formalmente lícito, mas que seja ilegal pela ineficiência. O princípio da eficiência é um principio constitucional, e um ato ineficiente é um ato ilegal. Então o TCU tem se dedicado a essas questões, teremos desafios nesses leilões de 4G, temos um marco regulatório dos portos que precisa avançar. O TCU está finalizando a análise. Temos a questão dos corredores ferroviários que temos avançado... Então a verdade é que o TCU tem sido um grande partido no desenvolvimento do Brasil. Ao contrário do que alguns dizem, o TCU não é empecilho do desenvolvimento nacional, pelo contrário, temos sido vigilantes dos recursos públicos e guardiões da legalidade, da moralidade, da transparência, da eficiência e de todos os princípios constitucionais.

R - O que a população pode esperar do Sr. enquanto ministro?
BD - Eu acredito que apesar de estarmos vendo tantos escândalos, acredito que o País está melhorando e isso passa pelo fortalecimento de instituições públicas, como a PF, o CGU... a Coaf. Acho que o povo deve acreditar nas instituições, acho que é preciso que a sociedade esteja cada vez mais vigilante. E essa vigilância sobre os governantes ela se forme também num diálogo com os órgãos de controle. Em cada município brasileiro tem uma promotoria, em cada estado tem uma secretaria de controle externo do TCU, então os órgãos de controle estão abertos a receber denúncias e queixas da população, e essa interação do diálogo é o que considero que representará um grande avanço que teremos que ter nos próximos anos. O Brasil tem muito o que melhorar, e isso só acontecerá se nossos governantes tiverem consciência de que a lei deve ser cumprida sem maiores questionamentos. Quanto a minha atuação, eu cheguei ao TCU num momento de cobrança da sociedade para que indicações técnicas fossem feitas para o TCU. E eu tenho procurado honrar esta indicação e aprovação, de um modo que abro minhas portas no gabinete para denúncias, reclamações, e para que possamos lá dentro utilizar caminhos que possibilitem uma atuação mais eficiente para a sociedade.

Colaborou: Hieros Vasconcelos Rego

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