LITERATURA
Honoré Gabriel
Riqueti, conde de Mirabeau, (Bignon-Mirabeau, Loiret, 9 de Março de 1749 — Paris, 2 de Abril de 1791) foi
um jornalista, escritor, político e
grande orador parlamentar francês.
Foi um destacado ativista e teórico da Revolução Francesa, fez parte do Clube dos Trinta e
destacando-se pela sua retórica apaixonada e convincente, tanto oral como
escrita, o que lhe mereceu o epíteto de L'orateur du peuple, ou
seja O orador do povo. Teve uma vida aventurosa, que incluiu
uma curta passagem pela diplomacia, em parte como agente secreto, múltiplas
passagens pela prisão e pelo exílio, e uma vida amorosa complexa e apaixonada.
Fez parte da Maçonaria e
teve um papel relevante na Revolução Francesa, durante a fase inicial da qual
foi um dos moderados que pretendia a transição para uma monarquia constitucional. A sua morte foi
um dos fatores que precipitou a queda da monarquia francesa.
Honoré Gabriel
Riqueti nasceu em Le Bignon-Mirabeau, perto de Nemours, no Loiret, a 9 de Março de 1749, filho
primogénito de Marie-Geneviève de Vassan e de Victor Riqueti, economista de
renome e marquês de Mirabeau.
Os Riqueti, nome
por vezes grafado Riquet ou Riquetti, descendiam de uma família de mercadores,
oriundos da pequena cidade de Digne, que tinham enriquecido em Marselha. Um
deles, Jean Riqueti, tinha
comprado em 1570 o
castelo e o senhorio de Mirabeau, o qual em 1685 serviu
para que um dos seus descendentes, Honoré Riquetti, obtivesse
o título de marquês de Mirabeau. O seu
filho primogénito, Jean Antoine, falecido em 1737, foi um
militar distinto ao serviço de Luís XIV de França, vindo a ser o avô de Honoré Gabriel
Riqueti, conde de Mirabeau.
Honoré Gabriel
nasceu com algumas deformidades, incluindo uma enorme cabeça que fazia
suspeitar que sofresse de hidroencefalia. A
acrescentar a esses problemas, aos três anos de idade foi vítima da varíola, a qual
lhe deixou a face severamente desfigurada. Estas circunstâncias terão feito
dele um filho mal amado, particularmente por seu pai, que nunca terá mantido
com ele uma relação cordial.
Como reação à
severa educação recebida de seu pai, adoptou um estilo de vida rebelde,
desordenado e escandaloso. Em consequência deixou de receber qualquer apoio
financeiro de seu pai, passando a viver com dificuldades.
Terminou os seus
estudos em 1767, sendo
incorporado no mesmo regimento de cavalaria que havia sido comandado pelo seu
avô paterno. Integrado nesse regimento participou na campanha de 1768-1769 na Córsega, que
culminou na batalha de Ponte Novu, lutando
contra as forças nacionalistas corsas de Pasquale Paoli.
Não se desviando do
seu comportamento enquanto estudante, apesar da sua deformidade conseguiu
conquistar uma dama das relações do coronel que comandava o regimento. As
reações não se fizeram esperar, e a pedido de seu pai, foi encarcerado por
algum tempo na Ilha de Ré.
A partir de 1771 fixa-se
em Paris, onde no ano seguinte casou com Marie Emilie de Marignane, uma rica
herdeira, filha do poderoso marquês de Marignane, num casamento arranjado por
seu pai. Deste consórcio nascerá um filho, o qual faleceu criança de tenra
idade.
Continuando a
envolver-se em escândalos, o pai força-o a fixar-se fora de Paris, numa
situação de semi-desterro. É nesta altura que escreve a sua primeira obra
conhecida, intitulada Essai sur le despotisme (1774).
Em 1774 envolveu-se
em novos desacatos, ofendendo a aristocracia local. Foi novamente preso por
ordem do rei Luís XV de França, emitida a pedido de seu pai, e encarcerado
no castelo d'If. Em 1775, para o
punir e impedir novos escândalos, foi transferido para o castelo de Joux,
no Doubs, Aí conhece Marie Thérèse de Monnier, a sua Sophie,
uma mulher casada, pela qual se apaixona. Fogem para a Suíça, acabando
por obter refúgio na Holanda.
Aí o casal vivia
em Amsterdã, graças ao trabalho de Mirabeau como escritor de textos feitos
por encomenda e como tradutor de textos ingleses, que adquiridos por um editor
local que os publicava na França. Usava o pseudónimo Sait-Mathieu.
Entretanto, em
Pontarlier, Mirabeau foi condenado à morte por contumácia em resultado dos
crimes de sedução de uma mulher casada e de rapto. Em Maio de 1777 foi
extraditado e aprisionado nas masmorras de Vincennes, nas quais permaneceu
até 1780.
Durante o período
em que esteve preso nas masmorras de Vincennes (1777-1780), escreveu as cartas que foram publicadas após a sua morte com o
título de Lettres à Sophie (1792), (em português, Cartas a Sofia), uma
obra-prima da literatura amorosa. Neste mesmo
período, escreveu também um manifesto virulento contra a arbitrariedade da
justiça do seu tempo, a que deu o título de Des lettres de cachet et
des prisons d'État, publicado após a sua libertação (1782), uma obra de
carácter jurídico e histórico, contendo o fundamento técnico-jurídico da sua
defesa. Nesta obra são bem patentes os seus dotes como pensador político.
Também na prisão escreveu a obra erótica Erotica
biblion e, depois, Ma conversion. Estas obras foram
escritas numa fase em que partilhava a prisão com o marquês de Sade, embora se
detestassem mutuamente.
Conseguiu obter a
anulação da sua condenação, sendo libertado da prisão de Vincenes em Agosto
de 1782, apenas
para descobrir que a sua Sophie tinha procurado consolo nos braços de um jovem
oficial e se tinha entretanto suicidado. Fixa-se então em Aix-en-Provence,
procurando, sem sucesso, o retorno da sua esposa, a qual o rejeita, decisão que
um tribunal confirma.
Pouco depois de
chegar a Aix-en-Provence, em 1782, envolveu-se desastradamente num conflito
judicial que decorria no seio da sua família, atacando as autoridades com tal
violência que foi obrigado a procurar novamente refúgio nos Países Baixos para
evitar nova detenção.
Face às constantes
dificuldades financeiras, o casal, acompanhado por um filho adotivo de
Henriette, resolve partir para Londres, onde se fixa. Aí Mirabeau não era
desconhecido, pois a sua obra Des Lettres de Cachet et des prisons
d'état tinha sido publicada numa tradução inglesa no ano de 1788.
Reencontra o seu
antigo colega de estudos Gilbert Elliot, então um
importante membro Whig do
parlamento britânico, sendo através dele introduzido nos círculos literários e
políticos londrinos. Estabelece relações amigáveis com grande número de
intelectuais e políticos da época, entre os quais o marquês de Shelbourne e Samuel Romilly.
Publica a
obra Considérations sur l'ordre de Cincinnatus (1785), a qual
é rapidamente traduzida em inglês e obtém relativo sucesso nos meios políticos
liberais. Contudo, considerando-se mal remunerado e vivendo em constantes
dificuldades financeiras, começa um processo de aproximação às autoridades
francesas, procurando um lugar no serviço diplomático. É nesta altura que se
oferece como agente secreto, oferta que é recusada.
Não tendo êxito na
sua tentativa de aproximação às autoridades francesas a partir de Londres,
envia Henriette Amalia de Nehra a Paris, para aí tentar criar condições para o
seu regresso. Quando fica claro que não será preso, em 1785 regressa
a Paris. Aí, as suas hipóteses de ser empregado pelo Estado são novamente
arruinadas pela publicação de escritos de carácter panfletário atacando as
instituições políticas e a banca, pois no entretanto passara a ver na agiotagem
das instituições financeiras uma das fontes de degradação da sociedade
francesa.
Contudo, apesar das
controvérsias que o rodeavam, em princípios de 1786 acaba
por ser contratado por Charles Gravier de Vergennes, então
ministro dos estrangeiros, e enviado numa viagem preliminar a Berlim a fim
de observar a corte da Prússia.
Tendo estado em
Berlim em princípios de 1786, quando
produziu um relatório considerado satisfatório, é enviado para aquela cidade em
Julho desse ano, tendo como missão zelar por interesses franceses e obter
informações sobre o andamento da vida política prussiana.
A sua missão era um misto de diplomacia e de espionagem, tendo por
missão elaborar relatórios detalhados sobre os eventos e as personalidades mais
importantes de Berlim. Nesse período ocorre a morte de Frederico II da Prússia e a ascensão
ao trono de Frederico Guilherme II da Prússia.
Em Paris envolve-se
nos meios políticos, mas não é considerado pessoa capaz de assumir qualquer
cargo, dado o seu passado libertino e cadastro prisional, além de contar com a
férrea oposição dos seus familiares e dos familiares da sua primeira esposa.
Quando Luís XVI de França, convoca os Estados Gerais para 1789, apresentou-se às eleições
pela Provença, mas foi
rejeitado pela nobreza. Em resultado, publica um discurso veemente dirigido aos
nobres provençais.
Nesta ocasião foi o
seu passado libertino que o impediu de liderar a ala reformista da nobreza, adepta
das ideias liberais, mas intolerante em relação a questões morais e de
costumes. Também a sua obra Dénonciation de l'agiotage, uma forte
diatribe contra a forma como funcionavam os bancos e a grande finança,
contribui para o tornar suspeito aos olhos dos meios financeiros e da nobreza
mais conservadora.
É então escolhido
pelo terceiro estado, o povo, em Aix-en-Provence e
em Marselha. Em breve
transforma-se num dos mais enérgicos oradores da Assembleia Constituinte.
Destacou-se pela
sua eloquência, posta ao serviço da causa revolucionária, embora mantendo uma
postura moderada. Defendeu a instauração de uma monarquia constitucional, com poderes
limitados por una assembleia legislativa, inspirando-se no modelo britânico e nos
escritos de Montesquieu.
Durante a Revolução Francesa foi um dos moderados que defendia a transição
pacífica para uma monarquia constitucional, constituída ao estilo da monarquia
britânica. Para tal conduziu, sem sucesso, conversações secretas com o monarca,
tentando persuadi-lo a aceitar tal solução, reconciliando a monarquia com os
anseios da Revolução.
Quando, efetivamente,
um regime com essas características se instalou em França, Mirabeau
fez o duplo jogo de intentar manter-se como líder da Assembleia Nacional, da qual chegou a ser presidente, e atuar
secretamente como conselheiro de Luís XVI de França, de quem aceitou generosos
pagamentos. Contudo, a sua posição via-se limitada pela ação de Maria Antonieta e do partido
reacionário da corte, que pretendia a manutenção do Antigo Regime.
Foi presidente da
Assembleia Nacional Constituinte entre 29 de Janeiro e 14 de Fevereiro de 1791. Não foi
ministro porque os seus partidários desconfiavam da sua eloquência e
duplicidade.
A degradação da
monarquia determina o aumento da sua importância política, pois quando faleceu
tinha-se transformado no mais sólido apoio de Luís XVI e de Maria Antonieta.
A 7 de Maio de 1789, o
periódico Courrier de Provence que Mirabeau publicava
desde 2 de Maio anterior
é apreendido e publica-se um édito proibindo a publicação de relatos das
sessões dos Estados Gerais de 1789.
Mirabeau decide não
acatar aquela imposição e continua a publicar relatos das sessões
parlamentares, bem como análise das questões políticas que estivessem na ordem
do dia, passando, entre 10 de Maio e 25 de Julho de
1789, a intitulá-las Lettres du comte Mirabeau à ses commettants. A
partir daí deu-lhe o título de Courrier de Provence, o qual se
continuou a publicar até 30 de Setembro de
1791, já após o falecimento do seu fundador.
Foi também redator
jornal L'Apocalypse, um jornal que se publicou em Paris de Março
de 1790 a
Março de 1791.
Faleceu
subitamente, crê-se que em resultado de envenenamento, em Paris, a 2 de Abril de 1791. A sua morte reduziu as possibilidades de
êxito da monarquia constitucional, derrubada dois meses mais tarde após a
família real fracassar uma tentativa de se escapar do país, traindo o regime
revolucionário (1791).
O seu corpo foi transportado com grande pompa para o Panthéon, num
cortejo que contou com mais de 300 000 acompanhantes, e aí permaneceu até
que a descoberta do célebre armário de ferro, em
Novembro de 1792, revelou
que ele tinha mantido contatos secretos com o rei Luís XVI e com elementos da
sua corte.
O armário de ferro é nome pelo qual ficou conhecido um
cofre sito no palácio das Tulherias onde o rei guardava documentos secretos.
Encontrado após a tomada do palácio pelas forças revolucionárias, ocorrida
a 10 de Agosto de 1792, os documentos que continha foram
posteriormente revelados, trazendo a público muitos dos segredos do monarca,
incluindo minutas de encontros, informações sobre o pagamento de informadores e
a lista dos contatos do rei.
Esperando ser
nomeado ministro da monarquia constitucional, ele tinha prodigalizado os seus conselhos
ao rei, complementando com o fornecimento de informações secretas
principescamente pagas. Relatos dessas informações estavam entre os documentos
encontrados. Em consequência, em Novembro de 1793, a sua
sepultura foi profanada e os seus restos mortais lançados nos esgotos de Paris.
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