CORRUPÇÃO
Alessandra
Corrêa De
Winston-Salem (EUA) para a BBC
Brasil
A
ação de informantes, também conhecidos como whistleblowers (em
tradução literal, "sopradores de apito", como são chamados aqueles
que denunciam a ocorrência de atividades ilegais em suas organizações) já
rendeu ao governo dos Estados Unidos pelo menos US$ 16,86 bilhões a mais em
multas contra empresas e funcionários envolvidos em crimes financeiros, segundo
estudo de pesquisadores das universidades americanas de Iowa, Texas A&M,
Arizona State e American University.
Esse montante, obtido exclusivamente
graças às denúncias dos informantes, é referente a ações do Departamento de
Justiça (DOJ) e da Securities and Exchange Commission SEC, na sigla em inglês,
órgão que regula o mercado de capitais, equivalente à Comissão de Valores
Mobiliários no Brasil) entre 1978 e 2012 e equivale a 21% do total de US$ 79,46
bilhões em multas coletadas nessas ações no período.
"Há
forte evidência de que, quando whistleblowers estão
envolvidos, a SEC e o DOJ conseguem aplicar penas mais pesadas aos
culpados", disse à BBC Brasil um dos autores do estudo, Andrew Call,
professor da Arizona State University.
A ação de informantes também resultou
em penas de prisão para os culpados em média 21 meses mais longas do que se não
houvesse envolvimento de denunciantes.
Com dados comprovando sua
importância, o incentivo a denunciantes de crimes financeiros - como fraudes e
pagamento de propinas e suborno a políticos - vem crescendo nos Estados Unidos.
Desde 2011, um programa de delação
premiada estabelecido pela Lei Dodd-Frank de regulamentação financeira oferece
a denunciantes proteção e recompensas que vão de 10% a 30% das multas acima de
US$ 1 milhão resultantes de suas denúncias.
Irregularidades
no Brasil
O programa, coordenado pela SEC, se
aplica inclusive a denúncias sobre irregularidades no Brasil, já que também
cobre filiais de multinacionais e empresas estrangeiras com ações na Bolsa de
Nova York, como a Petrobras.
O último relatório sobre o programa
enviado pela SEC ao Congresso americano, referente ao ano fiscal (até 30 de
setembro) de 2014, menciona seis denunciantes brasileiros, em um universo de
448 estrangeiros. No total, entre americanos e estrangeiros, foram 3.620
denúncias.
A SEC não fornece informações sobre
os denunciantes ou as empresas envolvidas. Para serem aceitas, as denúncias
devem cumprir uma série de exigências e oferecer informações exclusivas que
sejam decisivas para as investigações.
Segundo Call e a própria SEC, ainda
não há dados suficientes para medir o impacto do programa de delação premiada.
No entanto, uma comparação entre os relatórios dos últimos anos revela um
crescimento de mais de 20% no número de denúncias entre 2012 e 2014.
O programa foi iniciado em 12 de
agosto de 2011. Naquele ano fiscal (até 30 de setembro), foram registradas 334
denúncias, nenhuma do Brasil. Em 2012, na totalidade do ano fiscal, foram 3.001
denúncias, sendo 324 de estrangeiros, três deles do Brasil.
No ano fiscal de 2013, o total de
denúncias saltou para 3.238, sendo 404 de estrangeiros, quatro do Brasil.
Alcance
internacional
De acordo com a SEC, desde o início
do programa, 14 indivíduos já receberam recompensas em dinheiro, sendo nove
deles no ano passado. O maior prêmio até agora foi de mais de US$ 30 milhões,
pago em setembro passado a um denunciante estrangeiro.
A SEC não fornece detalhes sobre sua
identidade, mas diz que foi o quarto denunciante de fora dos Estados Unidos a
receber recompensa, "o que demonstra o alcance internacional do
programa".
Segundo a SEC, a maioria dos denunciantes não está envolvida nas
irregularidades, e o programa é um incentivo, tanto na forma de recompensa
financeira como em proteção, para que mais gente supere o temor de represálias e de perder o emprego
e tome a iniciativa de denunciar irregularidades.
Para Call, programas semelhantes poderiam funcionar em outros países,
inclusive no Brasil (onde a delação premiada costuma envolver apenas acusados
buscando reduzir suas penas diante da Justiça).
No entanto, o pesquisador ressalta
que ainda é cedo para avaliar se a qualidade das denúncias aumentou desde a
implantação do programa nos Estados Unidos.
"Acho que pode ir às duas
direções", disse Call à BBC Brasil. "Pode gerar denúncias de maior
qualidade, incentivando denunciantes legítimos a falar. Por outro lado, pode
incentivar pessoas que não tenham denúncias importantes, mas simplesmente
queiram tirar vantagem do programa e conseguir algum dinheiro."
Reação
das empresas
O programa se aplica a denúncias sobre
irregularidades no Brasil, pois também cobre, como a Petrobras
Em
seu estudo, que não analisa especificamente o programa de delação premiada,
Call observou que, apesar dos benefícios, a ação de whistleblowers também traz custos, entre eles um
aumento de 10 meses em média na duração das ações, o que consome tempo e
recursos das agências.
O estudo também estima que cerca de
85% das denúncias no período analisado foram insignificantes ou acabaram
descartadas pelos investigadores.
Call ressalta ainda que, assim como o
governo cria incentivos para que os informantes exponham os problemas, as
empresas que cometem irregularidades também podem criar seus próprios
incentivos financeiros para desencorajar seus funcionários a fazer denúncias.
Em um estudo separado, o pesquisador
analisou a concessão de opções de ações para funcionários e verificou que, em
média, essas concessões aumentavam em períodos em que havia irregularidades nas
empresas.
"Queríamos
saber se isso funcionava, então analisamos empresas com irregularidades que
foram expostas por denunciantes em comparação com aquelas em que as
irregularidades não foram denunciadas por whistleblowers. E
verificamos que as primeiras concederam bem menos opções de ações a seus
funcionários", afirma.
"Então, essa estratégia parece
funcionar", conclui Call.
Nenhum comentário:
Postar um comentário