Fernando
Alcoforado*
Dois
fatores foram decisivos para que a globalização produtiva, comercial e
financeira se
impusesse no mundo para promover a expansão do sistema capitalista mundial: 1)
o fracasso do Keynesianismo como política econômica capaz de alavancar o desenvolvimento
dos países capitalistas centrais e periféricos a partir da década de 1970, após
o “boom” do capitalismo dos “anos gloriosos” das décadas de 1950 e 1960; e, 2) a
crise que levou ao fim da União Soviética e do sistema socialista do Leste Europeu no
final da década de 1980. Eles abriram caminho para a mudança no modus operandi
do sistema capitalista mundial com a implementação da globalização produtiva,
comercial e financeira em escala planetária quando foi introduzida a ideologia
neoliberal que preconiza o desmanche do Estado – como agência econômica, de
prestação de serviços públicos e de proteção social -, de precarização das
relações trabalhistas
e do emprego e da contenção das lutas sindicais e populares, a internacionalização
do capital, em todas as suas formas (produtiva, comercial e
financeira)
e a adoção de políticas de desregulamentação do mercado e retirada das barreiras
protecionistas, liberalização e abertura dos mercados dos países, centrais e periféricos,
do capitalismo mundial.
Esta
mudança se concretiza com a chegada ao governo das forças liberais e conservadoras
na Inglaterra, em 1979, com Margareth Thatcher; nos Estados Unidos, em 1980,
com Ronald Reagan; e na Alemanha, em 1982, com Helmut Kohl. Na Inglaterra,
as primeiras políticas de cunho neoliberal implementadas foram a desregulamentação,
a privatização e a abertura comercial as quais foram incorporadas pelos
organismos multilaterais, fundamentalmente FMI e BIRD, e implementadas nos
países que
recorrem a estas instituições, em especial os países periféricos. O fracasso do
Keynesianismo como política econômica capaz de alavancar o desenvolvimento dos países
capitalistas centrais e periféricos a partir da década de 1970 e a crise que
levou ao fim da União Soviética e do sistema socialista do Leste Europeu no
final da década de 1980 desencadearam o fim definitivo da Modernidade que
nasceu com a Revolução Industrial
na Inglaterra no século XVIII.
O fim da
Modernidade que se baseava na sociedade industrial coincidiu também com o advento
em 1962 do conceito de sociedade pós-industrial formulada por Daniel Bell, autor
entre outros de The Coming of Post-Industrial Society (New York: Basic
Books, 1973). Na
opinião de Bell, ao nível econômico, as sociedades pós-industriais caracterizam-se
pelo crescimento do setor dos serviços enquanto principal atividade econômica,
que substitui assim em importância a produção de bens da sociedade industrial.
Em termos de estrutura de classes, a sociedade industrial se apoiava no
proletariado
para produzir bens, enquanto na sociedade pós-industrial prevaleceriam as profissões
técnicas e setores tecnológicos intelectuais. Alain Touraine, autor de La Société
Post-Industrielle (Editions Denoel, 1969), destacou
também a importância do conhecimento
no novo contexto pós-industrial.
O que vem
a ser uma sociedade pós-industrial? Trata-se de uma sociedade que empregaria
cada vez mais o seu trabalho no setor de serviços e cada vez menos no setor industrial,
de forma que o processo produtivo guardaria menos relação com as características
do processo fabril. A sociedade pós-industrial seria caracterizada justamente
pela lógica dos serviços. Sai de cena a fábrica moderna e aparecem o comércio,
os serviços, as finanças, o lazer, o ensino, a pesquisa científica como bases
da nova era. Esses processos produtivos pós-modernos não exigiriam mais
fábricas com linhas de montagem, mas processos programados baseados na
tecnociência – daí o papel central, para este tipo de pensamento, da 3ª.
Revolução Tecnológica, baseada na microeletrônica – que demandam a crescente
implementação de sistemas de informação computadorizados.
Para o
pós-modernismo, a Modernidade teve como base a produção sustentada na grande
indústria e na Pós-Modernidade o comércio e os serviços teriam um espaço mais
abrangente na sociedade do que a produção fabril. Os ideólogos da Pós- Modernidade
afirmam que estaríamos em uma nova era, pós-moderna na qual não valeriam
mais as teorizações passadas que construíam seus argumentos sobre o
capital,
capitalismo, valor, trabalho produtivo, proletariado revolucionário, etc., a partir da
lógica industrial, fabril. Em outras palavras, a morte da Modernidade implicaria
na morte do pensamento de Karl Marx, assim como a de qualquer metanarrativa
totalizante. Assim, na concepção do que seria a sociedade pós-industrial, o
pós-modernismo passa para a negação de toda perspectiva totalizante e
para a
afirmação da fragmentação, do descontínuo e do caótico.
Entretanto,
trata-se de uma falácia afirmar que crescimento do setor serviços, vis-àvis o setor
industrial, nega o que Marx descobriu a respeito do funcionamento do capitalismo,
uma vez que este não se confunde apenas com a indústria e nem pode ser
definido pela produção material, isto é, pela produção de valores de uso materiais.
Muito do que é hoje chamado de setor serviços, constitui-se, na realidade, de capital
que aciona meios de produção e força de trabalho com o fim de gerar e
realizar a
mais-valia. Logo, o que define o trabalho produtivo, seja industrial e do setor de
serviços, é um critério de valorização de uma relação social e não de produção
material.
Além de
afirmar a existência da sociedade pós-industrial em substituição à sociedade
industrial nascida no século XVIII, muitos dos autores defensores da Pós- Modernidade
advogam também falsamente o fim das classes sociais, de forma que a sociedade
pós-industrial seria, ao mesmo tempo, e pelas mesmas razões, uma sociedade
pós-classista. A Pós-Modernidade seria fruto, assim, da derrota do socialismo
real, isto é, da derrota de uma metanarrativa que se propunha alternativa
frente à
ordem capitalista. Ao capitalismo neoliberal seria necessário a todos reconhecê-lo
como uma realidade incontestável, contra o qual não poderiam ser construídas
alternativas totalizantes. O que fazer frente a essa nova era pós-moderna? Como agir
coerentemente diante do mundo? A resposta pós-moderna é a de que não
deveríamos tentar nos engajar em algum projeto global.
A opção
oferecida pela Pós-Modernidade do ponto de vista político para os povos do mundo
inteiro limita-se às seguintes alternativas: 1) capitulação/resignação/conformismo
com a vitória histórica do capitalismo globalizado
neoliberal; ou então, 2) contestar a ordem vigente, mas não a partir de
uma
perspectiva totalizante, global que leve à substituição do capitalismo, mas sob uma ótica
fragmentada de lutas. A postura prática do pós-modernismo é de não contestar
a lógica capitalista como ela é de fato. Deliberadamente, a Pósmodernidade defende a
tese de que é impossível contestar um sistema vitorioso e que veio para ficar,
o capitalismo neoliberal.
Apesar da
ditadura neoliberal imposta globalmente, a atual crise do neoliberalismo manifestada
na crise mundial de 2008 demonstra sua incapacidade em retomar o crescimento/desenvolvimento
econômico nos países que aderiram a esse receituário de
políticas e do sistema capitalista mundial como um todo. O caráter político retrógrado
da Pós-Modernidade e do neoliberalismo apresentado neste artigo será complementado
no próximo artigo (final) a ser publicado sob o título O IMPERATIVO DA
REINVENÇÃO DO ILUMINISMO PARA ENFRENTAR E VENCER O
NEOLIBERALISMO
E O PENSAMENTO PÓS-MODERNO.
* Fernando Alcoforado,
75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento
Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona,
professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico,
planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas
energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997),
De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São
Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os
condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado.
Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003),
Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia-
Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era
Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic
and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany,
2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador,
2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao
aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São
Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social
(Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.
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