Publicado em musica por Thaís Rigueira,
em obviusmagazine
"Escrever
pra mim é algo mágico, intenso, cativante e libertador. Escrever, seja sobre
mim, sobre outrem ou sobre o que vejo e sinto, mostra os sentimentos que minha
voz não saberia expressar."
Raul Santos Seixas fez muito além do que se pode imaginar: foi luz de
estrela, pai, mãe, avô, mosca de sopa, início, fim e meio. Viu o trem das onze
surgir pelas montanhas e até tentou aconselhar Al Capone, tudo isso em um prazo
de 10 mil anos. E além de tudo isso, ainda teve a façanha de tentar descobrir
como seria seu encontro com a morte. Teria esse talentosíssimo maluco
conseguido?
Já se
passou mais de 25 anos da morte de um dos grandes representantes do rock
nacional, Raul Seixas. Contudo suas músicas e letras fortemente expressivas
continuam a fazer sucesso entre os amantes de uma boa música popular. As
carimbadas “Ouro de tolo”, “Gita”, “Metamorfose Ambulante”, “Tente outra vez” e
“Maluco Beleza” conseguem entreter uma massa diversificada e deixaram uma marca
tão profunda na história do território musical brasileiro que acabaram por se
tornar uma espécie de patrimônio imaterial do cenário do rock a La Brasil.
Deveras, o
que trazemos se trata de uma das grandes composições geniais criadas por
Rauzito. O que é aqui relatado nada mais é do que uma análise superficial da
canção revestida pelas batidas de tango que esse renomado e louco cantor
compôs, na tentativa de descobrir que caminhos obscuros levariam ao seu
encontro com a morte.
E se você é
fã desse cara aqui citado, com certeza saberá do que estou falando; saberá que
me refiro a ela: “Canto para minha morte” faixa participante do LP Eu
nasci a 10 mil anos atrás. A abstrata morte, que sempre foi sinônimo de
perda, porque o que permanece é a visão de quem fica nesse plano e não quem foi
pra o outro lado, é representada lindamente por Raul Seixas nessa canção, na
qual apresenta de forma singular a antítese vivida pelo cantor, dando
personalidade a morte a colocando em um plano terrestre. A música que é
envolvida em um tango com frases por vezes falada, simulando uma narrativa, se
apodera do conceito sobre como e quando deverá chegar a morte em sua vida.
Engraçado é perceber que a dúvida do cantor acerca de quando e como será o
momento oportuno do seu encontro com a Dona Morte ou em que esquina ele
receberá o beijo fatal não soa de forma mórbida. Nesse panorama, a morte é
reconhecida como algo que está inerente ao homem. O que de fato é.
A atmosfera
em que é apresentada a canção, até sonoridade do tango conversam com a
abordagem feita por Raul e coincide com o jeito excêntrico do Maluco Beleza,
trazendo não só pra os fãs, mas também pra os amantes de uma boa música
brasileira o olhar peculiar apresentado por essa grande figura. Na verdade,
tudo conversa bem na música, desde as batidas fortes de um tango envolvente até
os comentários e dúvidas vividas pelo protagonista da canção. Nessa
perspectiva, a trilha sonora se respalda em um casal composto pela Dona Morte e
seu futuro escolhido, o Raul.
A morte
que, se por um lado amedronta justamente por não se saber de onde virá e quando
irá chegar, é moldada de forma brilhante nas palavras de Raul Seixas. A senhora
Morte, com seu beijo delirante que fulmina com o ser, provoca em Raul um
sentimento paradoxal, sentimento esse que por sua vez, provoca e instiga aquele
que escuta a canção, fazendo pergunta-se: e como virá a minha vez?
Coincidência
ou não, o que acontece aqui é que Raul conseguiu a façanha de prever seu
encontro com a senhora Morte. E com certeza não foi uma das formas que ele
escolheria pra morrer, já que na própria canção é afirmado: “Qual será a
forma da minha morte? Uma das tantas coisas que eu não escolhi na vida. Existem
tantas... Um acidente de carro. Um coração que se recusa a bater no próximo
segundo.” (Raul Seixas morreu vítima de uma parada cardíaca).
Raul
permaneceu nesse mistério, tentando desvendar o rosto da dama com quem
encontraria futuramente em um encontro às escuras e indagava se ela, pelo menos
seria educada e o deixaria finalizar o que estaria por fazer no momento exato
do seu encontro?
E nessa de
descobrir sem querer como seria seu fim trágico, Raul molda outras formas de
como poderia ter seu primeiro e único encontro à luz de velas com a dama
vestida de cetim. Uma anestesia, um tombo, uma ferida, um câncer e tantas
outras que possivelmente passaram pela cabeça dele, mas não foram citadas na
canção por falta, quem sabe, de musicalidade. E ainda por continuar, afirma com
todas as letras que ela, a dona Morte, poderia ser o mistério de toda uma vida.
O fim (ou seria o começo?) de tudo.
E apesar do
fim (ou começo, fica aqui o parênteses pra sua concepção), que se representou
em 21 de agosto de 1989, Rauzito deixou um legado musical gigantesco e que foge
definitivamente a todas as regras da boa conduta e do romantismo presente na
música popular brasileira. Raul foi autêntico, maluco, polêmico, instigante, um
gênio musical e emprestou toda sua desenvoltura pra compor a elite do rock
nacional.
E eis que
volta e meia, esporadicamente escuto em uma mesa lá no fundo do barzinho
qualquer, em um fim de semana qualquer, em qualquer época do ano, em uma roda
de amigos um indivíduo boa pinta que grita “TOCA RAUL!”.
E aí
percebo: Rauzito é atemporal.
Confira
abaixo o tango dedicado à morte:
© obvious: http://obviousmag.org/fugere_urbem/2015/04/um-tango-dedicado-a-morte-por-rauzito.html#ixzz3X3ATFXLv
Follow us: @obvious on Twitter | obviousmagazine on Facebook
Nenhum comentário:
Postar um comentário