Colaboração
de Fernando Alcoforado*
Na segunda
metade do século XVIII, ocorreu na Inglaterra a primeira revolução energética
no mundo com o uso do carvão em substituição à madeira até então amplamente
utilizada como fonte de energia. A primeira revolução energética ocorreu simultaneamente
com o advento da 1ª Revolução Industrial. Dotado de um poder calorífico
bem superior aos dos combustíveis até então utilizados, o carvão proporcionava
energia bem maior para o mesmo volume, além de ser mais fácil e econômico
para transportá-lo. O desenvolvimento das minas de carvão e a invenção da máquina
a vapor contribuíram para o nascimento na Europa e no Ocidente de uma nova economia.
A máquina
a vapor aciona as máquinas nas fábricas, as locomotivas nas primeiras ferrovias
e os navios que substituem as embarcações movidas a vela. As pessoas, as mercadorias,
os capitais e as ideias passam a circular a uma velocidade até então desconhecida.
Rapidamente um novo ambiente se descortina com o surgimento das primeiras
metrópoles e de mudanças na organização social. A primeira revolução energética
ficou circunscrita à Europa, inicialmente na Grã-Bretanha e, em seguida, na Europa
Ocidental, e depois nos Estados Unidos no início do século XX.
A segunda
revolução energética, que coincidiu com 2ª Revolução Industrial, ocorreu com o
advento do petróleo e da eletricidade. A utilização do petróleo como fonte de energia no
mundo teve seu início nos Estados Unidos com a exploração do primeiro poço em
1901 no Texas. Da mesma forma que a máquina a vapor passou a ser amplamente
utilizada com o advento do carvão como fonte de energia, o motor a explosão
interna passou a ser amplamente utilizado com o advento do petróleo. A
descoberta
de um vetor energético como a eletricidade e a invenção das máquinas elétricas
no século XIX, juntamente com a introdução dos veículos automotores, lançaram
as bases para a introdução da moderna sociedade de consumo, caracterizada
por uma intensidade energética nunca vista na história da humanidade.
De uma
forma ou de outra, todas as atividades humanas sobre a Terra provocaram alterações
no meio ambiente em que vivemos. Muitos destes impactos ambientais são
provenientes da geração, manuseio e uso da energia que é responsável por 57% da emissão
de gases do efeito estufa na atmosfera resultante das atividades dos seres
humanos. A principal razão para esta expressiva participação dos processos energéticos
pode ser observada no fato de que, em 2011, o consumo mundial de energia
primária proveniente de fontes não renováveis (petróleo, carvão, gás natural e nuclear)
correspondeu a aproximadamente 88% do total, cabendo apenas 12% às fontes
renováveis.
Esta
enorme dependência de fontes não renováveis de energia tem acarretado, além da
preocupação permanente com o esgotamento destas fontes, a emissão de grandes quantidades
de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera pelos combustíveis fósseis baseados
no carvão, petróleo e gás natural que em 1973 foi de 16,2 bilhões de toneladas
anuais, em 1998 de 23 bilhões de toneladas e em 2013 foi da ordem de 36,3 bilhões de
toneladas, aproximadamente 3,9 vezes a quantidade emitida em 1960 (9,3 bilhões de
toneladas). Como consequência da dependência de fontes não renováveis de
energia, o teor de dióxido de carbono na atmosfera tem aumentado progressivamente,
levando muitos especialistas a acreditarem que o aumento da temperatura
média da biosfera terrestre, que vem sendo observado há algumas décadas,
seja devido ao “Efeito Estufa” provocado por este acréscimo de CO2 e de outros
gases na atmosfera.
Se não
houver redução imediata na emissão de gases de efeito estufa os meios
utilizados para mitigá-los não serão suficientes e a vida no planeta ficará
ameaçada. O aquecimento
global resultante da emissão dos gases do efeito estufa provocará mudanças
climáticas que não deixarão nenhuma parte do globo intacta. Caso não haja redução
dos gases do efeito estufa, os cientistas preveem impactos severos e irreversíveis
para a humanidade e para os ecossistemas em consequência da mudança
climática
catastrófica. Deverão ocorrer tempestades com frequência inusitada, inundações
decorrentes do aumento do nível do mar que pode submergir muitas ilhas e cidades
litorâneas, períodos de seca prolongados e extremo calor em todo o mundo. Eventos
climáticos extremos podem levar à desagregação das redes de infraestrutura de energia,
transportes, comunicações e serviços. Há risco de insegurança alimentar, de falta
de água, de perda de produção agrícola e de meios de renda, particularmente das
populações mais pobres.
O mundo
está diante de um desafio que é o de não permitir um aquecimento global no século XXI
superior a dois graus centígrados. Para evitar um aquecimento do planeta superior a
2º C, seria preciso estabilizar as concentrações de dióxido de carbono (e equivalentes)
em 450 PPM (partes por milhão) sem a qual o mundo se defrontaria até o final do
século XXI com uma mudança climática catastrófica que pode ameaçar a sobrevivência
da humanidade. Para isso, as emissões mundiais terão que ser reduzidas abaixo de
seus níveis de 1990. Reduzir as emissões em relação aos níveis de 1990 é um desafio
gigantesco. Basta considerar que a Agência Internacional de Energia (AIE), ao
projetar
as tendências recentes, faz previsão de aumento de 50% da demanda energética até
2030, com continuada dependência dos combustíveis fósseis.
A Agência
Internacional de Energia (AIE) advertiu que "o mundo se encaminhará para um futuro
energético insustentável" se os governos não adotarem "medidas
urgentes" para
otimizar os recursos disponíveis (Ver o artigo AIE: mundo se encaminha para futuro
energético insustentável publicado no website http://g1.globo.com/mundo/noticia/2011/11/aie-diz-que-mundo-se-encaminha-parafuturo-energetico-insustentavel.html).
Para otimizar os recursos energéticos disponíveis
no planeta, é preciso dar início à terceira revolução energética que deve se traduzir
na implantação de um sistema de energia sustentável em escala planetária. Em um
sistema de energia sustentável, a produção mundial de petróleo deveria ser
reduzida à metade e a de carvão de 90%, enquanto a de fontes de energia
renováveis (solar, eólica, biomassa, maremotriz, geotérmica, hidrogênio, etc.)
deveria crescer quase 4 vezes até 2030. No ano 2030, as energias renováveis
deveriam ser da ordem de 70% da produção total de energia do planeta.
Com o sistema
de energia sustentável, é muito possível que o gás natural passe a ser, entre os
combustíveis fósseis, o recurso energético predominante no futuro porque é o menos
poluente entre os combustíveis fósseis. A energia nuclear não seria uma fonte importante
de energia em um sistema energético realmente sustentável. Isto se deve, em grande
medida, aos acidentes de Three Mile Island nos Estados Unidos, Tchernobil na ex-
União Soviética e Fukushima no Japão. Um sistema de energia sustentável somente
será possível se a eficiência energética for muito aperfeiçoada, isto é, se for
maximizada a relação entre a quantidade de energia empregada em uma atividade
(energia útil) e aquela disponibilizada para sua realização (energia total).
Estes são os requisitos de um sistema energético sustentável em todo o mundo.
O primeiro
passo para implantar um sistema energético sustentável em todo o mundo consiste
em redirecionar um grande número de políticas governamentais de modo que se
destinem a realizar os objetivos centrais da redução do uso de combustíveis
fósseis e da eficiência energética. Por exemplo: recompensar a aquisição de
veículos automotores eficientes e a fabricação de carros elétricos, encorajar
alternativas de transporte de massa de alta capacidade em substituição ao
automóvel, reestruturar as indústrias de energia e elevar os impostos sobre os
combustíveis fósseis, entre outras medidas.
O uso de
fontes renováveis de energia provocaria mudanças de grande magnitude em todo o
planeta destacando-se, entre elas, a criação de indústrias totalmente novas, o desenvolvimento
de novos sistemas de transporte e a modificação da agricultura e das cidades. O
grande desafio que se coloca na atualidade é o de prosseguir com o desenvolvimento
de novas tecnologias que aproveitem eficientemente a energia e utilizem
economicamente recursos renováveis. Este é o cenário energético alternativo que poderá
evitar o comprometimento do meio ambiente global. Isto significa dizer que mudanças
profundas de política energética global devem ser colocadas em prática para viabilizar
a terceira revolução energética no mundo.
* Fernando
Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento
Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona,
professor universitário
e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial,
planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos
livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil
e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o
Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento
do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, (http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944,
2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia-
Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea
(EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development-
The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft &
Co. KG, Saarbrücken,
Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e
Editora, (Salvador,
2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao
aquecimento global (Viena-
Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores
Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba,
2012), entre outros.
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