quarta-feira, 6 de maio de 2015

COMO REALIZAR A TERCEIRA REVOLUÇÃO ENERGÉTICA NO MUNDO

 

  
Colaboração de Fernando Alcoforado*

 Na segunda metade do século XVIII, ocorreu na Inglaterra a primeira revolução energética no mundo com o uso do carvão em substituição à madeira até então amplamente utilizada como fonte de energia. A primeira revolução energética ocorreu simultaneamente com o advento da 1ª Revolução Industrial. Dotado de um poder calorífico bem superior aos dos combustíveis até então utilizados, o carvão proporcionava energia bem maior para o mesmo volume, além de ser mais fácil e econômico para transportá-lo. O desenvolvimento das minas de carvão e a invenção da máquina a vapor contribuíram para o nascimento na Europa e no Ocidente de uma nova economia.

A máquina a vapor aciona as máquinas nas fábricas, as locomotivas nas primeiras ferrovias e os navios que substituem as embarcações movidas a vela. As pessoas, as mercadorias, os capitais e as ideias passam a circular a uma velocidade até então desconhecida. Rapidamente um novo ambiente se descortina com o surgimento das primeiras metrópoles e de mudanças na organização social. A primeira revolução energética ficou circunscrita à Europa, inicialmente na Grã-Bretanha e, em seguida, na Europa Ocidental, e depois nos Estados Unidos no início do século XX.

A segunda revolução energética, que coincidiu com 2ª Revolução Industrial, ocorreu com o advento do petróleo e da eletricidade. A utilização do petróleo como fonte de energia no mundo teve seu início nos Estados Unidos com a exploração do primeiro poço em 1901 no Texas. Da mesma forma que a máquina a vapor passou a ser amplamente utilizada com o advento do carvão como fonte de energia, o motor a explosão interna passou a ser amplamente utilizado com o advento do petróleo. A
descoberta de um vetor energético como a eletricidade e a invenção das máquinas elétricas no século XIX, juntamente com a introdução dos veículos automotores, lançaram as bases para a introdução da moderna sociedade de consumo, caracterizada por uma intensidade energética nunca vista na história da humanidade.


De uma forma ou de outra, todas as atividades humanas sobre a Terra provocaram alterações no meio ambiente em que vivemos. Muitos destes impactos ambientais são provenientes da geração, manuseio e uso da energia que é responsável por 57% da emissão de gases do efeito estufa na atmosfera resultante das atividades dos seres humanos. A principal razão para esta expressiva participação dos processos energéticos pode ser observada no fato de que, em 2011, o consumo mundial de energia primária proveniente de fontes não renováveis (petróleo, carvão, gás natural e nuclear) correspondeu a aproximadamente 88% do total, cabendo apenas 12% às fontes renováveis.

Esta enorme dependência de fontes não renováveis de energia tem acarretado, além da preocupação permanente com o esgotamento destas fontes, a emissão de grandes quantidades de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera pelos combustíveis fósseis baseados no carvão, petróleo e gás natural que em 1973 foi de 16,2 bilhões de toneladas anuais, em 1998 de 23 bilhões de toneladas e em 2013 foi da ordem de 36,3 bilhões de toneladas, aproximadamente 3,9 vezes a quantidade emitida em 1960 (9,3 bilhões de toneladas). Como consequência da dependência de fontes não renováveis de energia, o teor de dióxido de carbono na atmosfera tem aumentado progressivamente, levando muitos especialistas a acreditarem que o aumento da temperatura média da biosfera terrestre, que vem sendo observado há algumas décadas, seja devido ao “Efeito Estufa” provocado por este acréscimo de CO2 e de outros gases na atmosfera.

Se não houver redução imediata na emissão de gases de efeito estufa os meios utilizados para mitigá-los não serão suficientes e a vida no planeta ficará ameaçada. O aquecimento global resultante da emissão dos gases do efeito estufa provocará mudanças climáticas que não deixarão nenhuma parte do globo intacta. Caso não haja redução dos gases do efeito estufa, os cientistas preveem impactos severos e irreversíveis para a humanidade e para os ecossistemas em consequência da mudança
climática catastrófica. Deverão ocorrer tempestades com frequência inusitada, inundações decorrentes do aumento do nível do mar que pode submergir muitas ilhas e cidades litorâneas, períodos de seca prolongados e extremo calor em todo o mundo. Eventos climáticos extremos podem levar à desagregação das redes de infraestrutura de energia, transportes, comunicações e serviços. Há risco de insegurança alimentar, de falta de água, de perda de produção agrícola e de meios de renda, particularmente das populações mais pobres.

O mundo está diante de um desafio que é o de não permitir um aquecimento global no século XXI superior a dois graus centígrados. Para evitar um aquecimento do planeta superior a 2º C, seria preciso estabilizar as concentrações de dióxido de carbono (e equivalentes) em 450 PPM (partes por milhão) sem a qual o mundo se defrontaria até o final do século XXI com uma mudança climática catastrófica que pode ameaçar a sobrevivência da humanidade. Para isso, as emissões mundiais terão que ser reduzidas abaixo de seus níveis de 1990. Reduzir as emissões em relação aos níveis de 1990 é um desafio gigantesco. Basta considerar que a Agência Internacional de Energia (AIE), ao
projetar as tendências recentes, faz previsão de aumento de 50% da demanda energética até 2030, com continuada dependência dos combustíveis fósseis.

A Agência Internacional de Energia (AIE) advertiu que "o mundo se encaminhará para um futuro energético insustentável" se os governos não adotarem "medidas urgentes" para otimizar os recursos disponíveis (Ver o artigo AIE: mundo se encaminha para futuro energético insustentável publicado no website http://g1.globo.com/mundo/noticia/2011/11/aie-diz-que-mundo-se-encaminha-parafuturo-energetico-insustentavel.html). Para otimizar os recursos energéticos disponíveis no planeta, é preciso dar início à terceira revolução energética que deve se traduzir na implantação de um sistema de energia sustentável em escala planetária. Em um sistema de energia sustentável, a produção mundial de petróleo deveria ser reduzida à metade e a de carvão de 90%, enquanto a de fontes de energia renováveis (solar, eólica, biomassa, maremotriz, geotérmica, hidrogênio, etc.) deveria crescer quase 4 vezes até 2030. No ano 2030, as energias renováveis deveriam ser da ordem de 70% da produção total de energia do planeta.

Com o sistema de energia sustentável, é muito possível que o gás natural passe a ser, entre os combustíveis fósseis, o recurso energético predominante no futuro porque é o menos poluente entre os combustíveis fósseis. A energia nuclear não seria uma fonte importante de energia em um sistema energético realmente sustentável. Isto se deve, em grande medida, aos acidentes de Three Mile Island nos Estados Unidos, Tchernobil na ex- União Soviética e Fukushima no Japão. Um sistema de energia sustentável somente será possível se a eficiência energética for muito aperfeiçoada, isto é, se for maximizada a relação entre a quantidade de energia empregada em uma atividade (energia útil) e aquela disponibilizada para sua realização (energia total). Estes são os requisitos de um sistema energético sustentável em todo o mundo.

O primeiro passo para implantar um sistema energético sustentável em todo o mundo consiste em redirecionar um grande número de políticas governamentais de modo que se destinem a realizar os objetivos centrais da redução do uso de combustíveis fósseis e da eficiência energética. Por exemplo: recompensar a aquisição de veículos automotores eficientes e a fabricação de carros elétricos, encorajar alternativas de transporte de massa de alta capacidade em substituição ao automóvel, reestruturar as indústrias de energia e elevar os impostos sobre os combustíveis fósseis, entre outras medidas.

O uso de fontes renováveis de energia provocaria mudanças de grande magnitude em todo o planeta destacando-se, entre elas, a criação de indústrias totalmente novas, o desenvolvimento de novos sistemas de transporte e a modificação da agricultura e das cidades. O grande desafio que se coloca na atualidade é o de prosseguir com o desenvolvimento de novas tecnologias que aproveitem eficientemente a energia e utilizem economicamente recursos renováveis. Este é o cenário energético alternativo que poderá evitar o comprometimento do meio ambiente global. Isto significa dizer que mudanças profundas de política energética global devem ser colocadas em prática para viabilizar a terceira revolução energética no mundo.
  
* Fernando Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,  (http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, (Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.

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