Livro
Publicado em literatura por Sílvia Marques,
em obviusmagazine
Sílvia Marques é paulistana, escritora,
bacharel em Cinema, professora universitária e doutora em Comunicação e
Semiótica..
Este artigo pretende comentar o romance inglês Jane Eyre, de Charlotte
Brontë.
Charlotte
Brontë
Das cinco
irmãs Brontë, três se tornaram escritoras. As duas mais velhas morreram muito
cedo. Para falar a verdade , nenhuma morreu tarde. Charlotte , a mais velha das
escritoras faleceu com 38 anos. Emily, a mais famosa , aos 30 e Anne com 29.
Filhas de um
pastor protestante e irmãs de um pintor alcoólatra, as irmãs Brontë recriaram
um mundo cinzo e frio por meio de suas palavras. Embora O morro dos
ventos uivantes de Emily Brontë tenha feito mais sucesso do que Jane
Eyre por seu caráter mais passional e metafísico, algo em Jane
Eyre me seduz mais: o estilo da escrita.
Atualmente,
a maioria dos romances é narrado em primeira pessoa, herança do cinema. Quem
narra, apresenta um olhar parcial e fragmentado porque faz parte da história.
Antigamente, a maioria esmagadora dos romances era narrado em terceira pessoa,
isto é, por um narrador onisciente, onipresente, que tudo sabe e tudo vê e fala
sobre as ações, pensamentos e sentimentos de todos os personagens do alto da
sua sabedoria. Como um deus.
Jane
Eyre , romance vitoriano, publicado em 1847, foi narrado
em primeira pessoa. É a lúcida Jane que conta sua vida de infortúnios desde a
infância, quando vivia na casa de uma tia torta e maldosa. Sua infância no
orfanato é descrita com tamanha sensibilidade e riqueza de detalhes que
realmente consegui sentir o frio que as meninas órfãs, desamparadas e
esfomeadas sentiam naquela instituição que supostamente deveria amparar aqueles
que nada nem ninguém tem no mundo.
Um dos
elementos mais belos da primeira parte do romance é ver a amizade da indignada
Jane com a resignada Helen se desenvolver num ambiente hostil. Jane tem dotes
artísticos e um dia pede a Helen para soltar os lindos cabelos cacheados para
que pudesse fazer um desenho da amiga. Um dos “benfeitores” da instituição
obriga às tutoras a cortar os cachos de Helen, alegando que seus cabelos
indicavam vaidade. A menina tuberculosa, pobre e sem família não tinha nem ao
menos o direito de possuir cabelos bonitos.
Jane, a
nossa heroína revoltada, em protesto, pede para ter os cabelos cortados também
em solidariedade à Helen. Bem, mas a fase da infância é só o começo, embora
fascinante. Ao completar 18 anos, Jane abandona a instituição preparada para
ser tutora. Ela é convidada a permanecer no orfanato como professora, mas
prefere ir embora. Extremamente culta e refinada , aceitar atuar como
preceptora da filha afetada e ilegítima de um homem verdadeiramente estranho e
é aí que a história realmente começa. E é aí, que eu paro de contá-la. Me
impressiona especialmente a passagem em que a falsa cigana diz à Jane que ela
sente frio pois vive sem amor. Uma metáfora dilacerante para representar a vida
daqueles que sobrevivem à solidão.
Embora
crítica à obra de Jane Austen, Charlotte Brontê tinha uma crença em comum com a
outra célebre autora vitoriana: um casamento arranjado, sem amor, era
inaceitável, quase um ultraje.
Um grande
diferencial do romance é a protagonista ser uma mulher feia. Jane tem muitos
atributos: é culta, desenha bem, é lúcida, sensata, inteligente, bondosa sem
ser permissiva. É corajosa e tem expressão agradável também. Mas não é bela.
Uma ousadia para os padrões da época colocar como protagonista uma jovem
extremamente baixinha com traços desarmoniosos.
Muitas
versões cinematográficas foram produzidas. Algumas melhores. Outras piores. Não
posso opinar sobre todas porque vi apenas quatro e comentarei brevemente apenas
duas. Mas nenhuma, em minha opinião, superou o livro. Para mim, alguns filmes
superam o livro sim ou se igualam. Mas, em minha opinião, não foi o caso de Jane
Eyre. A versão de 1944, com Joan Fontaine e Orson Welles é bem
melodramática, mas gostosa de ver.
A dirigida
por Franco Zeffirelli é bem feita e muito interessante principalmente no que
diz respeito à infância, embora tenha escolhido uma menina linda para o papel
de Jane: Anna Paquin, a garota premiada pelo filme O piano.
Anna Paquin
como Jane na infância
Charlotte
Gainsbourg como a Jane adulta.
William
Hurt como o Senhor Rochester
Na versão
de 1944, a Jane adulta é bem bonita: Joan Fontaine . Sua beleza podia não ser
glamorosa e chamativa, mas era delicada e profunda. Duas curiosidades sobre
esta versão: Aldous Huxley , autor de Admirável mundo novo é um dos
roteiristas do filme e Elizabeth Taylor com 12 anos de idade interpreta a doce
Helen.
Joan
Fontaine
Tudo bem. Estas
versões têm o seu charme. Mas recomendo realmente a leitura do romance. Às
vezes, ele pode soar um pouco dramático demais, mas é extremamente sincero,
profundo e atual, pois viver sem dinheiro, sem status e principalmente sem o
amor continua sendo uma das missões mais dolorosas.
© obvious: http://obviousmag.org/cinema_pensante/2015/05/jane-eyre-o-pioneirismo-dilacerante-de-charlotte-bronte.html#ixzz3aCpau689
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