Teatro, cinema
Publicado em cinema por Sílvia Marques,
é paulistana, escritora, bacharel em cinema,
professora universitária e doutora em
Comunicação e Semiótica..
Ser ator no sentido mais amplo e profundo da palavra é descobrir o
semelhante que temos com o outro e o inusitado em nós mesmos. Ser ator é se reinventar,
é representar nós mesmos, salientando e ampliando o nosso essencial mais
íntimo, é fazer uma caricatura de nós mesmos, de todos os nossos eus. Ser ator
é ser nós mesmos duplamente.
Sabemos que
existe uma gama enorme de sentimentos, qualidades e tendências numa mesma
pessoa. Ninguém é bonzinho ou malvado full time. Mesmo as pessoas mais
pacientes podem perder as estribeiras quando precisam conviver com gente muito
desagradável. Mesmo as pessoas mais otimistas podem ter seus dias de descrença.
Ninguém é
mãe ou pai 24 horas por dia. Ninguém é esposa, marido, filho ou profissional o
tempo todo. As pessoas se fazem nas relações cotidianas e no embate do dia a
dia. As pessoas nos despertam emoções distintas, descortinando do mais gentil
até o mais brutal em todos nós.
E também
não é possível separar a mulher, da mãe, da filha como separamos o arroz, o
feijão e a carne em um bandejão. Somos múltiplos, complexos, paradoxais.
Talvez, nenhuma outra profissão revele de forma tão clara, profunda e
desconcertante a nossa natureza multifacetada como a de ator.
Normalmente,
bons atores apreciam fazer personagens que sejam bem diferentes da sua
personalidade. Não há nada mais tedioso e contrário à natureza de um ator fazer
o mesmo papel a vida inteira como vemos em telenovelas e produções
cinematográficas mais comerciais. Se um ator faz sucesso escorregando na casca
de banana, estará condenado a cair de bumbum no chão por anos a fio, se ele não
tiver firmeza de personalidade e lobby suficiente para viver outras realidades
imaginárias.
Mas talvez
um dos processos mais perturbadores quando se encena uma peça ou participa-se
de uma produção audiovisual como ator é descobrir que aquele personagem
repugnante que desprezamos no início começa a aflorar dentro de nós e passamos
a nos identificar com seus cacoetes, manias e de repente percebemos que ele não
é tão distante de nós; que ele era só um fragmento ignorado do nosso ser.
Ser ator
extrapola a questão de estarmos em cartaz em algum dos teatros da cidade. Ser
ator no sentido mais amplo e profundo da palavra é descobrir o semelhante que
temos com o outro e o inusitado em nós mesmos. Ser ator é se reinventar, é
representar nós mesmos, salientando e ampliando o nosso essencial mais íntimo,
é fazer uma caricatura de nós mesmos, de todos os nossos eus. Ser ator é ser
nós mesmos duplamente. De tão reais que somos chegamos a parecer uma grande
mentira.
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