Fernando Alcoforado*
Com a prisão
dos mais altos dirigentes da frente empresarial que desviou cerca de 6 bilhões
de reais dos cofres da Petrobras, a Operação Lava Jato só falta atingir os mais
altos escalões da política nacional envolvidos nesta megacorrupção que abala os
alicerces da República. A Operação Lava-Jato, vem evoluindo a contento graças
em grande parte aos movimentos cuidadosos do juiz federal Sergio Moro, o grande
responsável pela condução do processo que investiga o megaesquema de corrupção
na Petrobras. Desde março de 2014, ele autorizou 161 mandados de busca e
apreensão, decretou a prisão de sessenta pessoas e determinou o bloqueio de 200
milhões de reais em contas bancárias de suspeitos – incluindo altos
funcionários da Petrobras e empresários poderosos (Ver o artigo Sergio Moro: O
juiz que faz andar a máquina em busca dos culpados pelo petrolão publicado no
website ).
As
tentativas de tirar o processo das mãos do juiz Sergio Moro resultaram em
fracasso. Os interessados em afastá-lo do caso percorreram todas as instâncias
do Judiciário alegando que ele não tinha competência legal para conduzir o
processo porque com o envolvimento de políticos no escândalo o “foro especial”
para julgar os envolvidos seria o Supremo Tribunal Federal. Alegaram também que
as prisões dos suspeitos foram abusivas e de que o caso deveria ser transferido
de Curitiba para o Rio de Janeiro, onde fica a sede da Petrobras. Nenhum
desembargador do Tribunal Regional Federal ou ministro do STJ ou do STF acatou
as contestações. Espera-se que a Operação Lava Jato produza os mesmos efeitos
que a Operação Mãos Limpas produziu na Itália durante a década de 1990.
Sobre a
Operação Mãos Limpas, cabe observar que foi uma investigação judicial de grande
envergadura na Itália que visava esclarecer casos de corrupção durante a década
de 1990. A partir da prisão de um militante do Partido Socialista Italiano
(PSI), Mario Chiesa, acusado de cobrar propina na instituição que dirigia,
desencadeou-se a megaoperação de investigações criminais. Com a Operação Mãos
Limpas foram condenados políticos, empresários e agentes públicos e privados.
Bettino Craxi, principal líder do PSI e ex-primeiro-ministro da Itália, foi
punido por prática de corrupção e financiamento ilegal de campanhas eleitorais.
Pesou a confissão do 2 empresário Salvatore Ligresti de que sua empresa pagava
propina ao PSI e ao próprio Craxi para conseguir obras desde 1985 (Ver o artigo
de Carlos Ramos, professor, consultor e doutor em ciência política pela
Universidade Federal de São Carlos – Ufscar, sob o título Resultados da
Operação Mãos Limpas publicado no website ).
No artigo
acima citado, Carlos Ramos afirma que ficou provado o tráfico de influência e
corrupção em contratos milionários envolvendo a ENI, a empresa petrolífera
estatal italiana. A Operação Mãos Limpas comprovou que a estatal petrolífera
ENI funcionava como uma das principais fontes para o financiamento ilegal de
partidos e políticos italianos. Florio Fiorini, diretor financeiro, e Gabriele
Cagliari, presidente da ENI, confessaram que durante anos a empresa efetuava
pagamentos mensais aos principais partidos políticos e seus líderes. Cagliari
cometeu suicídio na prisão. Além dos esquemas de corrupção, a Operação Mãos
Limpas revelou também as relações do Estado italiano com o crime organizado.
Giulio Andreotti, líder da Democracia Cristã (DC) e ex-primeiro-ministro da
Itália, foi também processado por associação com a máfia. É muito grande,
portanto, a semelhança entre a Operação Mãos Limpas da Itália e a Operação Lava
Jato do Brasil.
Da Operação
Mãos Limpas resultou a decadência política e eleitoral dos principais partidos
da época, o PSI (Partido Socialista) e o DC (Democrata Cristão). As forças
políticas que dominavam a Itália desde o pós-guerra viram seu poder ruir e
desaparecer. Carlos Ramos, autor do artigo acima citado, afirma que, da
experiência italiana, pode-se aprender que a deslegitimação do sistema
político, por si só, não é capaz de provocar as mudanças necessárias. É
preciso, como houve por lá, participação efetiva da opinião pública na luta
contra a corrupção. Carlos Ramos ressalta o posicionamento do juiz federal
Sérgio Moro, responsável pela operação Lava Jato no Brasil, que em artigo por
ele publicado em 2004 e no qual analisava a Operação Mãos Limpas, afirmou que
“(...) a ação judicial não pode substituir a democracia no combate à corrupção.
É a opinião pública esclarecida que pode, pelos meios institucionais próprios,
atacar as causas estruturais da corrupção”.
A operação Mãos Limpas teve como saldo a
investigação de 6.059 pessoas, dentre eles 872 empresários, 1.978
administradores e 438 parlamentares, dos quais quatro haviam sido
primeiros-ministros. O Tribunal de Contas Italiano afirmou que a corrupção
dentro da gestão pública deste país alcançou 60 bilhões de euros por ano com
reflexos no mundo todo. A operação Mãos Limpas alterou a correlação de forças
na disputa política da Itália, reduzindo o poder de partidos que haviam
dominado o cenário político italiano. Todos os quatro partidos no governo em
1992 - a Democracia Cristã (DC), o Partido Socialista (PSI), o SocialDemocrata
e o Liberal - desapareceram posteriormente. O Partido Democrático da Esquerda,
o Partido Republicano e o Movimento Sociale Italiano foram os únicos partidos
de expressão nacional a sobreviver (Ver o artigo Corrupção na Itália publicado
no website ).
Da mesma
forma como aconteceu na Itália seria desejável a condenação e prisão de todos
os envolvidos na megacorrupção que atingiu a Petrobras e a exclusão da vida
política nacional de todos os partidos políticos e dirigentes partidários
envolvidos na Operação Lava Jato.
* Fernando
Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em
Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de
Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento
estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de
sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São
Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora
Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo,
2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de
doutorado. Universidade de Barcelona,
http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e
Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do
Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA,
Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social
Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento
Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010),
Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento
global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os
Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV,
Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no BrasilEnergia e Mudança Climática
Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015).
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