Colaboração de Fernando Alcoforado*
Com Dilma
Rousseff, a economia brasileira retrocede dez anos em dois. A partir de 2013, o
país assistiu a uma piora progressiva de seus indicadores econômicos - tanto aqueles
que reproduzem a economia real quanto os que capturam expectativas futuras. De
lá pra cá, as consequências se tornaram visíveis na indústria, no investimento,
no mercado de trabalho, e, em última instância, na renda dos brasileiros, que é
corroída pela inflação e juros mais altos. O Índice de Preços ao Consumidor
Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial, está atualmente em 8,4% , o maior
nível desde maio de 2005, quando atingiu 8,05%. Já a Selic está em 13,75%, o
maior patamar desde janeiro de 2008.
O déficit no
balanço de pagamentos em conta corrente em 2014 foi o maior da história. Um
flagrante exemplo do retrocesso ocorrido é o consumo das famílias brasileiras,
mensurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e que responde
por 60% do Produto Interno Bruto (PIB). Tal indicador tem sido responsável pelo
crescimento do Brasil há pelo menos dez anos, mas que deve começar a ruir em
2015. No que concerne ao setor produtivo, a indústria também não tem nada a
comemorar há muitas décadas. O setor industrial acumulou queda de 3,15% em 12 meses
até janeiro de 2015. E mesmo a alta do dólar não deve resolver os problemas do
setor. Em outras palavras, a moeda mais cara beneficia quem exporta, mas
penaliza mais quem depende de insumos importados. Empresas que têm dívidas
cotadas em moeda americana também podem ser pegas desprevenidas.
O retrocesso
não ocorre apenas do ponto de vista macroeconômico. O que mais preocupa é a
piora significativa observada no ambiente de negócios. De forma geral, temos um
retrocesso claríssimo em diversas dimensões. Neste cenário nebuloso, aumentou o
"risco-Brasil", indicador que aponta, em linhas gerais, a percepção
dos investidores em relação à capacidade do país de honrar suas dívidas.
Segundo o banco JP Morgan, o "risco-Brasil" apresentou seu maior
valor desde maio de 2009, auge da crise financeira internacional. Vale lembrar
que a tendência do risco Brasil é de alta, considerando o agravamento das
crises política e econômica brasileira, incluindo os escândalos de corrupção
envolvendo a Petrobras. Tudo isso deixa o mercado muito mais temeroso.
Há uma
diferença muito grande entre a conjuntura atual e a dos anos 2000 quanto ao
sentimento dos agentes do mercado. Naquela década, a sensação era de que as
coisas poderiam melhorar, enquanto o que se apresenta agora é um cenário de
constante deterioração. No início da década passada, vivíamos um processo de
recuperação econômica, após a implementação do Plano Real. Tivemos uma melhoria
do ambiente externo, uma busca por equilíbrio macroeconômico interno, que
marcaram os dois governos do presidente Lula. A conjuntura atual, no entanto,
espelha visão oposta. Em diversos setores, os índices de confiança atingem
mínimas históricas, de acordo com sondagens elaboradas pelo Instituto
Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). Na indústria, por
exemplo, o Índice de Confiança da Indústria (ICI) atingiu em fevereiro de 2015
o menor patamar desde abril de 2009.
Há uma
tentativa do ministro Joaquim Levy, de reverter esta situação. No entanto, as
medidas preconizadas pelo ministro Levy comprometem o crescimento econômico e
atingem em cheio o bolso do trabalhador brasileiro, em especial aquelas que
reduzem benefícios trabalhistas. Em contrapartida, o povo busca reparação, pois
se sente enganado pelas promessas de manutenção das políticas feitas durante as
eleições pela presidente Dilma Rousseff. Enquanto isto, está acontecendo uma
gigantesca retração no mercado de trabalho que se acentuou principalmente em
dois setores. No setor da construção, desapareceram 609 mil empregos com uma
queda de 7,6%, e no setor público que perdeu 560 mil vagas com uma queda de
9,5%. Os dados são da Pnad Contínua trimestral, a nova pesquisa de emprego e
renda do IBGE. Não se trata de dizer que a recessão está concentrada na
construção, até porque o ritmo de criação de empregos em outros setores
desacelera também.
A recessão
que devasta a economia brasileira está concentrada no setor da construção que
tem interesse particular porque parte do colapso das obras no Brasil se deve à
desordem provocada pela crise na Petrobras e pelo escândalo de corrupção nas
empreiteiras com o caso Lava Jato. Noutra parte, a recessão das obras deve-se
ao corte de despesas devido ao ajuste ou arrocho fiscal e aos atrasos de
pagamentos de obras, que vinham desde 2014, provocado pela desordem das contas
do governo Dilma Rousseff. Soma-se a tudo isto a incompetência e a baderna na
administração pública, do descontrole de gastos à má gestão na Petrobras, e a
corrupção sistêmica que parecem ter parte importante na rápida desestruturação
da economia brasileira. Associe-se a tudo isto o colapso na indústria de
veículos automotores e conexas, na indústria de bens de capital e de
eletroeletrônicos que é muito maior e mais relevante do que no de outros
setores industriais do país.
A situação
de emprego e renda no Brasil tem uma inegável tendência de baixa. O desemprego
aumenta. A política de retração econômica de Dilma Rousseff e Joaquim Levy
conseguiu chegar ao fim de abril com o desemprego elevado a 8%. O Brasil
continua sendo o maior pagador de juros entre 40 países do mundo. Com a decisão
do Banco Central de subir a taxa básica de juros (Selic) em 0,5 ponto
percentual, de 13,25% para 13,75%, o Brasil mantém-se no topo do ranking de
países com maiores juros reais (descontada a inflação). Os juros reais que
descontam a inflação projetada para os próximos 12 meses no Brasil ficam em
5,23%. Em segundo, vem a Índia, com taxa real de 2,93%. Em terceiro está a
China, com 2,84%, seguida por Taiwan (1,78%) e a Polônia (1,60%). No entanto,
falando de juros nominais (que não descontam a inflação), a Venezuela aparece
em primeiro lugar, com 18,87%, seguida pela Argentina (17,85%). O Brasil vem em
terceiro no ranking dos juros nominais (13,75%).
Sobre o
aumento da riqueza no Brasil, é importante observar que se trata do décimo país
do mundo em número de milionários. Supera (em ricos) países como a Espanha e a
Suíça. O Brasil é o segundo país do mundo quando se considera o crescimento na
taxa de ricos, entre 2013 e 2014 (só fica atrás da China). O número de
milionários brasileiros cresceu, no período, algo em torno de 350%. Para
comparação: nos Estados Unidos, ainda a maior concentração de ricos e
ultrarricos, o crescimento foi de magros 20% aproximadamente. O que é
inacreditável é que ainda há gente que acredita que a desigualdade diminuiu no
Brasil nos anos de governo do PT que é falso. Reduziu, se é que diminuiu mesmo,
a diferença entre assalariados, mas não entre a renda do capital e a do trabalho
(Ver o artigo de Clóvis Rossi Rico ri, mas não é à toa, publicado no 3
website).
O caos e a
complexidade do ambiente de negócios no Brasil fazem com que os governos, as
empresas e as pessoas sintam a sensação de estarem sendo arrastadas por um
furacão que permeia toda a vida política, econômica e social. Isto significa
dizer que, para compreender e gerir um sistema econômico e social complexo
devemos pensar de forma complexa e agir utilizando conceitos e práticas, no
mínimo, comparáveis à complexidade desse sistema. Esta não é a prática dos
gestores da economia brasileira que ainda utiliza métodos obsoletos de
administração do sistema econômico. As ciências econômicas clássicas que, no
passado, nos ofereceram uma série de métodos para entender a realidade e
construir modelos econômicos e organizacionais já não atendem as necessidades
da era contemporânea. Não devemos continuar adotando modelos econômicos e
organizacionais em que tudo a eles relacionados seja tratado de forma isolada e
desconectada do todo.
* Fernando
Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em
Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de
Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento
estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de
sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São
Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora
Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo,
2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de
doutorado. Universidade de Barcelona,
http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e
Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do
Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA,
Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social
Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft
& Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe
Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável-
Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e
Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes
do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012) e Energia
no Mundo e no BrasilEnergia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI
(Editora CRV, Curitiba, 2015)
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