Portando
a comenda Fátima Stern do Mérito Judiciário
Raymundo
Pinto,
É desembargador
aposentado do TRT, é escritor, membro da Academia de
Letras Jurídicas da Bahia
e da Academia
Feirense de Letras.
Pouco antes do reatamento das relações
diplomáticas com os Estados Unidos, resolvi visitar Cuba. Passei apenas seis
dias na famosa ilha, metade em Varadeiro e a outra metade em Havana. Reconheço
que se trata de um tempo bastante curto para me credenciar a tecer avaliações
mais precisas. Foi o suficiente, no entanto, para tirar algumas conclusões, que
procurarei transmitir aos leitores da Tribuna.
Cabe, de início, fazer uma breve
retrospectiva histórica daquele país depois da grande virada a partir da tomada
do poder, no final da década de 50, por um movimento revolucionário.
Surpreendeu o mundo, em pleno auge da Guerra Fria, a opção do líder Fidel
Castro em declarar-se comunista e aderir ao bloco comandado pela então União
Soviética. É claro que a reação dos EUA não tardou, decretando rigoroso
bloqueio econômico. Não faltaram generosos recursos da segunda maior potência
da época para sustentar, em quase tudo, a pequena Nação caribenha, sobrando
ainda muito dinheiro destinado a incentivar e financiar revoltas de cunho esquerdista
em toda a América Latina.
Em 1991, após a queda do Muro de Berlim, o
enorme conglomerado que formava a União Soviética se esfacelou. A fonte de onde
jorrava os ilimitados recursos que mantinha Cuba – e sua capacidade de exportar
as ideias socialistas – afinal “secou”. Tive oportunidade de conversar com um
taxista sobre esse período de grave crise e ele me confirmou que, de fato, foi
um tempo de grande sofrimento para seu povo. Como há males que vêm para o bem,
o governo cubano, diante do impasse, teve a boa ideia de adotar uma solução
“capitalista”, ou seja, abriu as portas para o turismo e convocou os
“burgueses” europeus para investir pesado em hotéis de luxo. Já são mais de
cinquenta na localidade de Varadero, que fica numa península, perto da capital,
tendo mais de 20 quilômetros de praias de areias brancas e águas cristalinas,
com clima ameno o ano todo. Hospedei-me num deles e pude constatar o tratamento
“vip” dispensados aos clientes. Na chegada, os estrangeiros são logo avisados
que só podem usar uma moeda chamada CUC. Exceto os altos dirigentes e seus
apaniguados, o resto da população usa o peso comum.
A visita a Havana permite uma visão mais real
da atual situação do país. Verifica-se a existência de alguns aspectos
positivos. O povo revela um intenso gosto pela música, havendo grupos e
bandinhas tocando e cantado em vários lugares. Pessoas com as quais conversei
mostraram-se orgulhosas de Cuba não ter analfabetos e de manter a educação
gratuita em todos os níveis. Também destacaram o eficiente sistema de saúde,
que atende, igualmente de graça, desde um simples ferimento até as cirurgias
mais complexas. Fora disso, é evidente a pobreza generalizada. O salário mínimo
– pasmem! – equivale a 20 (vinte) dólares POR MÊS. Um médico ganha o equivalente
a 50 (cinquenta) dólares POR MÊS (preferem, é claro, trabalhar no exterior). A
grande maioria se submete à humilhação de adquirir alimentos – racionados e de
má qualidade, ressalte-se – mediante o uso de uma “caderneta”. Em virtude do
baixo poder aquisitivo, são numerosos os edifícios e casas em péssimo estado de
conservação. A situação não é pior porque muitos têm parentes em Miami que lhes
enviam dinheiro. Acredita-se que chega a bilhões a quantidade de dólares
transferidos por ano. Os que trabalham nos hotéis de luxo recebem gorjetas e
presentes dos turistas, o que faz aumentar sua diminuta renda. Jovens bonitas
se prostituem para ajudar a família. Circulam na cidade e nas estradas velhos
caros americanos da década de 50, que viraram atração turística, mas já se
veem, em número menor, veículos mais novos.
Em resumo, salvo algumas poucas vantagens
conquistadas, a experiência socialista cubana – como ocorreu nos demais países
que adotaram esse sistema – fracassou visivelmente. A liberdade de expressão não
existe, o que configura uma clara ditadura. Existe um único jornal permitido: o
“Gramma” e duas emissoras de TV, que, por serem os três estatais, só divulgam
notícias e opiniões favoráveis ao governo. É evidente a “lavagem cerebral” que
aplicam ao povo no dia a dia, com apenas elogios à “Revolução”. A internet é de
péssima qualidade e poucos têm celulares.
Há uma curiosidade geral no sentido de saber
se a aproximação com os EUA provocaria mudanças radicais em Cuba. Entendo que,
a curto prazo, não será possível. Observa-se que o povo elevou Fidel Castro à
condição de mito vivo. Fala-se dele com veneração e respeito, acreditando-se
que a situação de dificuldades atuais se deve, quase por completo, ao bloqueio
econômico feito pelo “imperialismo americano”. Estudos sérios, porém, vêm
demonstrando que existem outros fatores determinantes, inclusive internos.
Falecido o líder, que já completou 89 anos, e reduzida a ajuda da Venezuela (em
crise pela baixa do preço do petróleo), tenho certeza de que tem início uma
decisiva fase de troca, embora lenta, do socialismo pelo capitalismo. Sem
dúvida, uma avalanche de turistas americanos, quando forem inteiramente
liberadas as viagens, “invadirá” os excelentes hotéis de Varadero. A
infraestrutura está pronta. O contato estreito com povos de outros países e a
pressão internacional farão com que os cubanos, afinal, despertem para as
grandes vantagens da democracia e da liberdade.
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