Pesquisa
David
RobsonDa BBC Future
Os
seguranças contratados pelo psicólogo Thomas Ormerod enfrentavam uma tarefa
aparentemente impossível. Em aeroportos de toda a Europa, eles tinham que
entrevistar passageiros sobre seus planos de viagens passados e futuros.
Mas
Ormerod “plantou” alguns atores na multidão com a instrução de que inventassem
histórias falsas – e seus seguranças teriam que identificar os mentirosos. A
peneira era difícil – de cada mil passageiros entrevistados, apenas um iria
mentir.
Ormerod
e seus homens sabiam que tentar ler pistas na linguagem corporal dos
entrevistados não seria muito eficiente – vários estudos científicos já
descobriram que detectar mentiras dessa forma ou com base em expressões faciais
é praticamente uma questão de sorte.
Eles
então tentaram uma abordagem diferente – e conseguiram atingir suas metas. O
segredo? Jogar fora várias das técnicas antigas e começar com algo totalmente
novo.
Variedade de comportamentos
Image copyrightyImage
caption Para especialistas, deixar o mentiroso falar pode ser uma boa
maneira de flagrá-lo
Nos
últimos anos, pesquisas científicas sobre a mentira têm sido amaldiçoadas por
resultados decepcionantes. Muitos desses trabalhos se concentraram em tentar
ler as intenções do mentiroso em sua linguagem corporal e em seu rosto, como
risadas nervosas, bochechas avermelhadas e olhar fugidio.
O
exemplo mais famoso é o ex-presidente americano Bill Clinton coçando o nariz
quando negou seu caso amoroso com a estagiária Monica Lewinsky – algo visto na
época como um sinal claro de que ele mentia.
“A
ideia que tínhamos era que o ato de mentir provoca algumas emoções fortes
difíceis de serem contidas – o nervosismo, a culpa e até um certo prazer”,
explica Timothy Levine, professor de Comunicações da Universidade do Alabama.
“Mesmo quando achamos que estamos disfarçando bem, ainda podemos emitir pequenos
movimentos chamados de ‘micro expressões’, que são capazes de nos entregar.”
No
entanto, quanto mais os psicólogos examinam, mais as pistas parecem ser
frágeis. O problema está na enorme variedade do comportamento humano. Não há um
dicionário universal da linguagem corporal.
“Não
existem sinais consistentes que sempre apareçam junto com a mentira”, explica
Ormerod, que é professor de Psicologia da Universidade de Sussex, na
Grã-Bretanha. “Eu rio, mas outros ficam mais sérios. Alguns olham nos olhos,
outros evitam.”
E,
apesar de já termos ouvido teorias sobre como nosso subconsciente pode detectar
esses sinais mesmo se eles escapam da nossa atenção, elas são infundadas.
Ouvir o mentiroso
A
experiência de Ormerod foi realizada nos meses que antecederam os Jogos
Olímpicos de Londres, em 2012, aproveitando que muitos passageiros poderiam ser
interrogados por seguranças para verificar se emitiam algum “sinal suspeito”.
O
que o psicólogo observou foi que as autoridades normalmente usam perguntas onde
só cabem as respostas “sim” ou “não”. “Isso não dá ao agente de segurança a
chance de ouvir o passageiro falar nem de observar mudanças de comportamento –
aspectos cruciais para a detecção de mentiras”, explica.
A
resposta de Ormerod e sua equipe foi simples: treinar os seguranças para
tirarem o foco dos maneirismos sutis e prestarem atenção no que as pessoas
estão dizendo, suavemente apertando nos pontos certos para conseguir
desmascarar o mentiroso.
Ormerod
e seu colega Coral Dando, da Universidade de Wolverhampton, identificaram uma
série de princípios em uma conversa que podem aumentar as chances de descobrir
uma mentira:
Usar perguntas “abertas”. Isso obriga o mentiroso a expandir
suas histórias até acabar encurralado em sua própria mentira.
Apostar no elemento surpresa. Investigadores deveriam tentar
aumentar a “carga cognitiva” do mentiroso. Por exemplo, fazendo perguntas
inesperadas e confusas, ou pedindo para que contem um acontecimento de trás
para a frente – técnicas que dificultam que ele mantenha a fachada.
Prestar atenção em detalhes pequenos. Se um passageiro afirma que
trabalha em certa empresa, pergunte sobre o caminho que faz para ir e voltar ao
escritório diariamente. Se encontrar uma contradição, não o corrija. É melhor
deixar o falsário ganhar confiança e acabar entregando mais fatos incorretos.
Observar mudanças na autoconfiança. Preste atenção para ver como o
estilo de um potencial mentiroso muda quando ele é desafiado: quando acham que
estão conduzindo a conversa, eles tendem a ser mais falantes. Mas podem ficar
quietos se perceberem que estão perdendo o controle da situação.
O
objetivo é manter uma conversa informal, em vez de um interrogatório intenso.
Sob essa pressão mais suave, o mentiroso pode acabar se traindo ao contradizer
sua história, ou ao se tornar claramente evasivo em suas respostas. “Não existe
uma fórmula mágica. Estamos combinando os melhores aspectos para ter uma
abordagem cognitiva”, afirma Ormerod.
O
psicólogo admite que sua estratégia pode soar como senso comum. Mas os resultados
de sua experiência mostram que ela funciona. Os seguranças treinados por ele
apresentaram 20 vezes mais chances de detectar os falsos passageiros,
encontrando-os 70% das vezes.
As
técnicas de Ormerod e Levine poderiam primariamente ajudar autoridades na
aplicação da lei, mas os mesmos princípios podem ajudar qualquer pessoa a caçar
mentirosos em suas vidas.
A
principal coisa a ser lembrada é de manter a mente aberta e não se apressar nas
conclusões. Só porque uma pessoa está nervosa ou tem dificuldades em se lembrar
de detalhes não quer dizer que ela tenha alguma culpa. Procure por
inconsistências, em vez disso.
Pode
não haver um detector à prova de todos os mentirosos, mas usar o tato, a
inteligência e a persuasão podem ajudar a verdade a emergir.
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