Antropologia
Publicado por João Pedro
Lobato
Quem iria imaginar que
uma das maiores influências para a revolução sexual feminina estava escondida
nas pacatas tribos primitivas do Pacífico Sul? O dedo pode ser apontado a
Margaret Mead, uma aventureira cujos estudos antropológicos, na primeira metade
do século passado, iriam minar a idílica imagem da família tradicional do
Ocidente.
Mas desde cedo Mead se revelou uma rapariga
incomum. Não só se apaixonou pela antropologia, como decidiu, aos 22 anos, ir
viver para a Samoa Americana (no Pacífico Sul), para aí realizar vários estudos
de campo. Não foi de admirar que muitos homens se interrogassem sobre o que
fazia uma jovem mulher branca no meio de uma horda de bárbaros, em vez de estar
em casa a cozinhar para o marido.
A resposta cai como um relâmpago em 1928,
quando a antropóloga regressa ao Ocidente para escrever um dos mais polémicos
(e vendidos) livros da época: Adolescência, sexo e cultura em Samoa.
Na sua obra revolucionária, a antropóloga faz
tiro ao alvo com a ideia preconcebida de que os problemas que nos angustiam na
juventude se devem à natureza da adolescência. Ao analisar algumas aldeias
tribais, constata, com grande espanto, que a passagem da infância à
adolescência era aí feita com absoluta tranquilidade, sem traços da angústia ou
confusão tão típicas no Ocidente. Conclusão: esqueçam as borbulhas na cara,
afinal os problemas da adolescência tinham uma origem nas exigências e
expectativas culturais da sociedade.
A polêmica estala quando Mead vai ainda mais
longe e descreve a forma como as jovens mulheres samoanas tinham o hábito de
adiar o casamento por muitos anos, de modo a desfrutarem do sexo ocasional. Só
depois de se casarem é que assentavam e tinham filhos.
Este retrato radical da sexualidade feminina
teve o condão de revirar o estômago a muitos leitores (tal como a alguns
colegas antropólogos), os quais não perderam tempo a qualificar a obra como um
mero "livro de sexo", acusando a autora de ter uma mentalidade
"suja".
Indiferente às críticas e ansiosa por mais
peripécias capazes de fazer estalar o verniz do socialmente correto, a
investigadora americana contornou de novo o globo e instalou-se na Nova Guiné.
Sem o saber, estava a preparar uma nova bomba antropológica, desta vez para
implodir o orgulho masculino.
Em 1935, publica o livro Sexo e
temperamento em três sociedades primitivas, outro best-seller controverso.
A questão agora espicaçada era: seriam as diferenças entre o homem e a mulher
meramente biológicas? Depois de ter estudado e analisado três tribos
primitivas, culturalmente diferentes, a resposta científica redundou num
atónito não.
Na primeira tribo analisada, Mead verificou
que tanto os homens como as mulheres eram de temperamento pacífico. Por
contraste, na segunda tribo os dois géneros já tinham uma atitude guerreira.
E eis que, na terceira e última, constatou-se
o caso mais curioso: os homens passavam a maior parte do tempo a
ornamentarem-se para ficarem bonitos, perdendo tempo com futilidades, enquanto
as mulheres trabalhavam arduamente e eram práticas - o completo oposto do que
era comum ocorrer em princípios do século XX, no mundo ocidental.
Perante este e outros fatos, Mead foi
pioneira ao propor que as características masculinas e femininas refletiam as
influências culturais e sociais, não se limitando às diferenças biológicas.
A formidável visão de superioridade que os
homens tinham de si caía, assim, no maior dos ridículos, enquanto o feminismo
ganhava um importante balão de oxigénio.
Em 1978, já uma figura super-mediatizada e
aplaudida como uma das maiores antropologistas de sempre, acabou por falecer.
Atrás de si deixa um legado repleto de argumentos científicos que iriam apoiar
as revoluções sexuais e culturais dos anos 60. A forma de encarar a diferença
de género não voltaria a ser a mesma... e os pais mais conservadores ganharam
razões para ter maiores dores de cabeça em relação aos filhos.
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