Política
Nacional
Estratégia de trocar votos por
cargos com não tem funcionado e se soma ao 'fator Cunha'
Gestão Rousseff pode viver um
'shutdown' tupiniquim se medidas não forem aprovadas
AFONSO BENITES, Brasília,
Jornal El País – O jornal global - Facebook
Um Governo
praticamente paralisado e refém de um Congresso Nacional que pouco ou nada lhe
ajuda. Muito por causa dos embates políticos que tomaram parte de 2015, este
ano se encaminha para terminar de maneira deprimente para a gestão Dilma Rousseff (PT), mesmo que o
impeachment ainda não esteja oficialmente na ordem do dia. Pelas perspectivas
desenhadas até agora, em 2016 haverá uma espécie de shutdown tupiniquim. Não será como nos Estados Unidos
de 2013, quando sem um Orçamento aprovado, o Governo Barack Obama ficou alguns dias sem poder tocar no caixa da Governo. Mas,
guardadas as devidas proporções, o Brasil deverá, no mínimo, se deparar com uma
redução drástica de investimentos governamentais.
Faltando 18 dias úteis para o fim dos trabalhos no Legislativo (são três
dias por semana até o recesso em 22 de dezembro), quase nenhum projeto de lei
de interesse do Executivo na área econômica e fiscal foi aprovado neste segundo
semestre. O recado dado pelos parlamentares que são os relatores do Orçamento Geral da União do ano que vem mostra um
cenário nada animador. Ao invés de um inexpressivo aumento de 0,2% no Produto
Interno Bruto (PIB), como previa a equipe econômica, deve haver uma queda de
1%. As receitas previstas pelo Governo com a criação de novos impostos (como a
CPMF), aumentos de outros (como a CIDE) ou novos acordos firmados com entidades
não governamentais (como um com o sistema S) não foram incluídas como receitas
orçamentárias. Dessa forma, o país deixaria de arrecadar cerca de 40 bilhões de
reais.
“Não dá para
incluir no Orçamento as propostas que ainda não tem nenhum amparo legal. A
sociedade não quer mais impostos e não há clima no Congresso para a aprovação
do aumento da tributação”, disse o relator das receitas da União na Comissão
Mista do Orçamento, o senador Acir Gurgacz (PDT-RO). Nesta quinta-feira, ele
apresentou o seu relatório com uma expectativa de arrecadação de 1,440 trilhão
de reais. São nove trilhões a menos que a gestão Rousseff estava planejando nas
suas 16 medidas de ajuste fiscal anunciadas em meados de setembro.
O resultado
só não foi pior porque, no relatório, o senador Gurgacz encontrou maneiras de
arrecadar mais recursos sem novos impostos. Isso ocorreria com um aumento na
venda de ativos – como terrenos em áreas rurais na Amazônia Legal e áreas da Marinha no litoral – e com a
ampliação de concessões públicas – como de hidrelétricas, portos e aeroportos
–, entre outras medidas.
Sem margem
Outro ponto
que pesa contra o Governo Rousseff foi a não renovação, até agora, da
Desvinculação de Recursos da União (DRU). Ela é uma espécie de fundo de
investimento que permite ao Governo realocar até 20% de seus recursos da
maneira que bem entender sem ferir a Constituição. O prazo de validade da DRU
vence em 31 de dezembro deste ano e, para passar a valer no ano que vem,
precisaria ser aprovada na Câmara e no Senado. Porém, como a gestão Rousseff
quis ampliar a margem de manobra de 20% das receitas com impostos para 30%, não
houve um acordo para que o projeto entrasse em votação na Câmara e sua
aprovação até o fim do ano ainda é incerta.
“O Governo
optou por uma política do toma-lá-dá-cá. E isso deu certo até o fim do primeiro
mandato da Dilma. Agora, com um Governo fragilizado, essa estratégia não tem
mais funcionado”, explica o cientista político e professor da Universidade de
Brasília (UnB), Luís Felipe Miguel.
Luís Felipe Miguel
Neste ano, a
última troca de cargos por votos ocorreu no mês passado, quando a presidenta
fez uma reforma ministerial e ampliou a presença do PMDB no seu primeiro
escalão e concedeu dezenas de cargos menores para legendas aliadas, como PP,
PDT, PRB e PR. Nem assim, seus projetos prioritários prosperaram no Congresso.
Na visão de
Miguel, a presidenta Rousseff “foi emparedada pela oposição”, que vê uma
possibilidade de partir para a ofensiva com pedidos de destituição
presidencial, e pelos que se dizem aliados, que pedem mais cargos, mas não
garantem apoio porque não sabem até quando a Gestão sobrevive.
Fator Cunha
O
fator Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o presidente da Câmara que está na
corda bamba com um pedido de cassação tramitando no Conselho de Ética, também
adia qualquer plano governamental. Nos corredores do Legislativo há deputados
que dizem que as pautas do Governo não andam principalmente porque Cunha não
quer. “Ele tem uma pistola apontada para a cabeça da presidente, que é a
abertura do processo do impeachment. E é isso o que o segura no cargo. O quanto
ele puder protelar qualquer decisão importante para o ano que vem, ele vai o
fazer”, disse um deputado aliado do peemedebista.
Enquanto o
ajuste fiscal que poderia dar um alívio para a gestão Rousseff não sai,
as pautas conservadoras se espalham como ervas
daninha. Os parlamentares da bancada “Boi, Bala e Bíblia” fazem prosperar em
comissões da Câmara propostas como a que dificulta o aborto de mulheres
vítimas de violência sexual, a que cria o Estatuto da Família, a que revoga o Estatuto do Desarmamento e a que modifica a forma
como são feitas as demarcações de terras indígenas no país.
O diagnóstico de que a gestão
Rousseff anda de mal a pior no Congresso não é algo apenas externo. Nas
reuniões palacianas é comum a petista cobrar empenho de seus ministros para que
pressionem seus aliados a ajudá-la no Legislativo. Na semana passada, durante
encontro do Diretório Nacional do PT, o padrinho político da presidenta, seu
antecessor Luiz Inácio Lula da Silva, deu um recado claro aos seus correligionários e o repetiu em outros dois
encontros com membros dos partidos aliados PMDB e PCdoB. “Alguém aqui acha que
primeiro vamos tentar derrubar o Eduardo Cunha, depois derrubar o impeachment,
depois a gente vota as coisas que a Dilma quer?" O que até agora não ficou
claro é se os ouvintes seguirão o alerta de Lula sobre o ajuste fiscal ou se
farão ouvidos moucos.
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