quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

ACORDO DA COP 21 NÃO É SUFICIENTE PARA SALVAR O PLANETA TERRA DA MUDANÇA CLIMÁTICA CATASTRÓFICA

Clima





Colaboração de Fernando Alcoforado*

Depois de vários anos de negociações, impasses, avanços tímidos e fracassos, 195 países e a União Europeia produziram na COP 21 em Paris um acordo global que define como a humanidade combaterá o aquecimento global nas próximas décadas. Pela primeira vez, cada país do mundo se compromete a reduzir as emissões de gases do efeito estufa, fortalecer a resiliência (capacidade de voltar ao seu estado natural, principalmente após uma situação crítica e fora do comum) e se unir em uma causa comum para combater a mudança climática. O acordo não tem caráter legal para todas as metas, como queria a maioria.
O acordo da COP 21 é composto por um documento de 31 páginas. Ele contém um texto de 12 páginas, o Acordo de Paris, e uma decisão que detalha como o acordo será executado. Juntos, os dois documentos formam uma espécie de manual de reorientação da economia mundial. Eles sinalizam, ainda que de forma muito preliminar, que a farra desbragada das emissões de gases de efeito estufa precisa chegar ao fim em algum momento do século XXI. Para os otimistas, o acordo representa o fim da era dos combustíveis fósseis.
O objetivo declarado do Acordo de Paris é o de conter o aumento da temperatura média global em bem menos do que 2 oC acima dos níveis pré-industriais e envidar esforços para limitar o aumento de temperatura a 1,5 oC acima dos níveis pré-industriais, reconhecendo que isso reduziria de maneira significativa os riscos e os impactos da mudança climática. A menção à meta de 1,5 oC surgiu graças à ação conjunta dos países insulares, que serão condenados à extinção no longo prazo pelo aumento do nível do mar resultante de um aquecimento de 2 oC.
 Como as metas de redução de emissões de gases do efeito estufa apresentadas são incapazes de segurar a temperatura no patamar necessário, foi decidido que será preciso fazer ajustes nelas a cada cinco anos, a partir de 2023. Esses ajustes precisariam de um referencial, que não foi considerado no texto do Acordo de Paris. O Acordo de Paris prevê também que os países ricos se comprometam com o desembolso de pelo menos US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020 para projetos de redução de emissões nos países emergentes e confirma que os países em desenvolvimento poderão ampliar a base dos doadores no futuro, ainda que de maneira voluntária.
Dois aspectos fundamentais não foram considerados no Acordo de Paris: 1) o objetivo de longo prazo de descarbonizar a economia em 2050 ou de cortar no mínimo 70% das emissões mundiais de gases-estufa até a metade do século XXI; e, 2) a meta de temperatura não vem acompanhada de um roteiro dizendo como o mundo pretende chegar a menos de 2 oC ou a 1,5 oC, o que enfraquece a perseguição desse alvo. Em outras palavras, a COP 21 produziu um acordo que é, na prática, uma mera carta de intenção.
Percebe-se, portanto, que o Acordo de Paris não resolve as questões fundamentais, além de as metas voluntárias indicadas por cada uma das nações somadas não serem 2 suficientes para garantir que o aquecimento global fique bem abaixo de 2 graus Celsius, rumo ao 1,5 grau Celsius até o ano 2100. Além disso, o documento é omisso ao não apresentar propostas que contribuam para a construção de um modelo de desenvolvimento sustentável em nosso planeta em substituição ao insustentável modelo de desenvolvimento capitalista existente e para a construção de um mundo de paz que se contraponha às guerras que proliferam pelo mundo. O modelo de desenvolvimento capitalista em vigor e as guerras são os maiores responsáveis pelo comprometimento do meio ambiente do planeta.
Há 140 anos, Karl Marx já tinha alertado em O Capital para as consequências destruidoras para o meio ambiente do então recente modo de produção capitalista. Marx afirmou que “cada progresso da agricultura capitalista é não só um progresso na arte de espoliar o trabalhador, mas também na arte de espoliar o solo; cada progresso no aumento de sua fertilidade dentro de um dado prazo é também um progresso na ruína das fontes duradouras desta fertilidade. Quanto mais um país, como, por exemplo, os Estados Unidos, tem como base de seu desenvolvimento a grande indústria, tanto mais rápido será tal processo de destruição. A produção capitalista, portanto, apenas desenvolve a técnica e a combinação do processo social de produção, minando, simultaneamente, as fontes de todas as riquezas: a terra e o operário” (K. Marx. O Capital, Vol. I. São Paulo: Boi tempo Editora, 2013).
O capitalismo é um sistema econômico que se baseia na propriedade privada dos meios de produção. Para movimentar recursos, produzir e lucrar mais, acumulando mais e mais capital, as empresas capitalistas consomem e destroem recursos naturais em busca do crescimento e do lucro como pré-requisito fundamental para que o sistema capitalista continue em expansão. O capitalismo destrói para voltar a se impulsionar. É indiscutível que houve um enorme avanço no nível de bem-estar médio dos habitantes do planeta Terra a partir da Revolução Industrial na Inglaterra em 1760. No entanto, muito disso foi conquistado à custa do uso desordenado dos recursos naturais, principalmente para gerar a energia necessária baseada em combustíveis fósseis que sustentou o crescimento econômico capitalista. Hoje, a natureza já está cobrando o seu preço, bastando observar os impactos resultantes das mudanças climáticas que tendem a se tornar catastróficas.
Para mudar essa situação e colocar um fim às constantes mudanças climáticas que ameaçam de destruição nosso planeta e a humanidade, é necessário promover uma profunda transformação da atual sociedade. A insustentabilidade do modelo de desenvolvimento capitalista em vigor é evidente haja vista que tem sido extremamente destrutivo das condições de vida no planeta. Diante deste fato, é um imperativo a substituição do atual modo capitalista de produção dominante em todo o planeta por outro modo de produção que leve em conta o homem integrado com o meio ambiente, com a natureza, isto é, o modelo de desenvolvimento sustentável. Isto não foi considerado na COP 21.
Outra questão não abordada na COP 21 diz respeito às guerras, também grande responsável pelo comprometimento do meio ambiente do planeta, as quais se proliferam pelo mundo e servem para alavancar o capitalismo. Entre as inúmeras consequências funestas das guerras, estão os efeitos devastadores sobre o meio ambiente. Os bombardeios de alvos militares e de populações civis, o intenso movimento de veículos militares e tropas, a grande concentração de voos de combates, os mísseis jogados sobre 3 cidades e a destruição de estruturas militares e industriais durante todos esses conflitos também provocam a emissão de metais pesados e outras substâncias que contaminam o solo, a água e o ar. Além da contaminação ambiental é necessário considerar ainda a modificação das paisagens naturais e a perda da biodiversidade, a longo prazo, seja pela presença de minas terrestres ou agentes químicos dispersados no ambiente. Isto não foi considerado, também, na COP 21.
Finalmente, é importante ressaltar que o Acordo de Paris é omisso, também, no que concerne à construção de um sistema de governabilidade no planeta que seja capaz de assegurar o reordenamento da economia mundial que está levando o mundo à depressão, do meio ambiente do planeta ameaçado pelas mudanças climáticas catastróficas e das relações internacionais que se agravam a cada dia alimentando a proliferação de guerras. Diante dessas graves omissões da COP 21, pode-se afirmar que muito dificilmente teremos sucesso na tentativa de evitar as mudanças catastróficas no clima do planeta Terra no século XXI. James Lovelock, renomado cientista, diz que o aquecimento global é irreversível e que será uma época sombria em que mais de 6 bilhões de pessoas vão morrer neste século. Em outras palavras, Lovelock afirma que a raça humana está condenada devendo conviver com os quatro Cavaleiros do Apocalipse - guerra, fome, pestilência e morte (Ver o artigo Aquecimento global é inevitável e 6 bi morrerão, diz cientista disponível no website http://rollingstone.uol.com.br/edicao/14/aquecimento-global-e-inevitavel-e-6-bimorrerao-diz-cientista#imagem0). Infelizmente, o Acordo de Paris não possibilita evitar este cenário traçado por James Lovelock.



* Fernando Alcoforado, 76, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no BrasilEnergia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015).

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