Publicado por Raquel Avolio
KatieJane Garside é como uma personagem de um conto de fadas sombrio. Vive em um barco com o marido e os dois filhos, canta sobre morte, tragédias, sexualidade e inocência com bastante naturalidade e insiste no fato de que é uma pessoa privada, levando um estilo de vida recluso. Não costuma dar entrevistas e pouquíssimo se sabe com certeza absoluta sobre sua vida pessoal. O timbre de sua voz, quase infantilizado, entoa pesadelos líricos, tais como: "Não há carne cobrindo estes ossos / Ele nasceu para a sua assinatura / Agora vaga, despedaçado / Atrás de um esfomeado / Cavalo do deserto / Com minhas entranhas / Enroladas em meus pulsos". Conheça um pouco do trabalho incrível de uma artista tão intrigante quanto sua arte.
Salto Ángel, Cataratas Ángel ou Angel Falls é a denominação da mais alta cachoeira do mundo - a água cai em queda livre, sem qualquer tipo de interrupção, de uma impressionante altura de 965 metros. Se localiza na Venezuela, no Parque Nacional de Canaima. Também é o título de uma música do atual projeto de uma das figuras mais fascinantes que já tive o prazer de conhecer: KatieJane Garside. A imagética das letras de Ruby Throat - nome do projeto em questão, que ainda inclui Chris Wittingham, musicista e marido de Katie - é difícil de digerir, e, em todo caso, perturba, incomoda e até assusta o ouvinte que não está habituado ao estilo (pessoal e artístico) de KatieJane. Explico: após performances nas quais bebia de uma mamadeira em palco com a banda Daisy Chainsaw e outras nas quais dançava de forma histriônica com uma cadeira em QueenAdreena, ela decidiu se acalmar (em termos) e dar voz para seu eu mais delicado, sombrio e fantástico até então.
As performances ao vivo da dupla são essencialmente intimistas e tocantes, tanto pela própria natureza das músicas quanto pela presença onírica de quem as canta. Garside, ao mesclar seus vocais infantis com letras que passam longe do termo “infantil”, muitas vezes lembra uma fada perturbada que sussurra seus delírios para o público ou alguma princesa de um conto escrito pelos irmãos Grimm durante um episódio assustador de ruptura com a realidade, e tais comparações são elogios do mais puro tipo. Sua persona em palco é única, e nos transporta para um universo no qual ter suas "entranhas enroladas nos pulsos" e entoar o mantra "eu não quero morrer aqui" que por último se transforma em "eu quero morrer aqui" são coisas poéticas e bastante aceitáveis.
O meu álbum favorito do projeto, The Ventriloquist, foi lançado em 2007 e de forma limitada: apenas 500 cópias foram feitas. Conta com uma arte de capa adorável, um encarte repleto de desenhos em caneta tinteiro e fotografias belíssimas, elementos que ajudam o ouvinte a imaginar a atmosfera ideal para todas as doze músicas que compõem o álbum.
KatieJane também tem uma vida pessoal curiosa e muito original: se descreve como uma pessoa reclusa, suas entrevistas são raras e é casada com seu companheiro de banda, Chris Wittingham, com quem tem dois filhos, Dylan e Io Leilani. Ela vive com sua família num barco – sim, num barco – chamado Iona, que foi danificado durante uma tempestade em 2012 e posteriormente consertado, logo servindo como veículo para a família participar de um evento chamado Atlantic Rally for Cruisers – um clássico anual que inclui uma corrida na qual mais de duzentas embarcações velejam livremente em alto mar. Chris e KatieJane documentaram através de postagens no Facebook o dia-a-dia no evento, criando uma espécie de diário de bordo.
KatieJane Garside é uma artista pouco conhecida e de talento ímpar - ouso dizer que isso faz sentido, já que sua persona não combina nem um pouco com a fama. O fato de ser pouco conhecida contribui mais e mais para que a aura de mistério que a cerca seja reforçada, tornando-se uma espécie de atrativo extra. Sua capacidade de transmitir agressividade e delicadeza em apenas um verso cantado é impressionante, e, com Ruby Throat, pode-se dizer que Garside encontrou a forma perfeita de expressar sua cativante e enigmática dualidade.
© obvious: http://obviousmag.org/raquel_avolio/2016/o-magico-e-morbido-mundo-de-katiejane-garside.html#ixzz3zrG8OFbU
Follow us: @obvious on Twitter | obviousmagazine on Facebook
Nenhum comentário:
Postar um comentário