Colaboração de Fernando Alcoforado*
Em sua obra Microfísica do poder (Rio de Janeiro: Graal, 1997), Michel Foucault, filósofo, filólogo e crítico literário, ao abordar a relação entre poder e conhecimento, afirmou que o poder deve ser analisado como algo que circula, que funciona em cadeia. O poder funciona e se exerce em rede. Os indivíduos, em suas malhas, exercem o poder e sofrem sua ação. Cada um de nós é, no fundo, titular de um certo poder e, por isso, veicula o poder. As maiores fontes do pensamento de Foucault foram as filosofias de Nietzsche e Heidegger (Ver o website ).
Segundo Foucault, os poderes periféricos e moleculares que são exercidos por indivíduos, grupos, empresas, cientistas, comunicadores, etc., não foram confiscados e absorvidos pelo Estado. Estes poderes não são necessariamente criados pelo Estado. Os poderes se exercem em níveis variados e em pontos diferentes da rede social e neste complexo os micro-poderes existem integrados ou não ao Estado. Em outras palavras, além do poder do Estado, existem poderes que se distribuem por toda a estrutura social. O Estado precisa contar com o apoio da maioria dos poderes periféricos ou moleculares para exercer seu poder em uma determinada sociedade. Segundo Foucault, o poder é exercido como disputa e luta. Nessa disputa ou se ganha ou se perde.
Foucault defende a tese de que a concepção negativa do poder é a vinculada ao Estado como aparelho repressivo que castiga para dominar e a concepção positiva do poder é a que direciona sua ação para a satisfação de aspirações da sociedade. Como exemplos de concepção negativa do poder do Estado temos os regimes de exceção através do qual os detentores do poder estatal fazem uso da repressão contra os poderes periféricos ou moleculares que a ele se opõem. Como exemplo de concepção positiva do poder temos os países que praticam a democracia cujos detentores do poder estatal procuram satisfazer as aspirações da sociedade. Foucault afirma que o capitalismo não se manteria se fosse exclusivamente baseada na repressão. Segundo Foucault, o poder estatal, em sua concepção positiva de poder, tem como alvo o ser humano não para supliciá-lo, mutilá-lo, mas para aprimorá-lo, adestrá-lo. O ser humano só se torna força de trabalho quando trabalhado pelo sistema político de dominação característico do poder que busca discipliná-lo com base em normas sociais. A disciplina visa gerir a vida dos homens, controlá-los em suas ações para que seja possível e viável utilizá-los ao máximo, aproveitando suas potencialidades e utilizando um sistema de aperfeiçoamento gradual e contínuo de suas capacidades. O disciplinamento visa, em síntese, a consecução do objetivo econômico de contribuir para o aumento do resultado de seu trabalho com a obtenção de uma utilidade econômica máxima e o objetivo político visa a diminuição de sua capacidade de revolta, de resistência, de luta, de insurreição contra as ordens do poder estatal, a neutralização dos efeitos de contra-poder, isto é, para tornar os homens dóceis politicamente.
A análise do governo Dilma Rousseff sob a ótica da microfísica do poder de Foucault permite constatar que o Estado no Brasil não tem capacidade de praticar a concepção positiva do poder que direcionaria sua ação para a satisfação das aspirações da sociedade nem, também, a concepção negativa do poder com o uso da repressão contra os poderes periféricos ou moleculares que a ele se opõem. Esta situação resulta do fato de haver uma “microcefalia” do poder estatal no Brasil. O poder estatal sob a liderança 2 de Dilma Rousseff é comparável à microcefalia que é uma doença em que a cabeça e o cérebro dos bebês são menores que o normal para a sua idade, o que prejudica o seu desenvolvimento mental, porque os ossos da cabeça, que ao nascimento estão separados, se unem muito cedo, impedindo que o cérebro cresça e desenvolva suas capacidades normalmente.
A situação do poder do Estado no Brasil sob o governo incompetente de Dilma Rousseff é similar à microcefalia porque, perdeu a capacidade de governar seja com uma concepção positiva do poder que direcionaria sua ação para a satisfação das aspirações da sociedade, seja com a concepção negativa do poder com o uso da repressão contra os poderes periféricos ou moleculares que a ele se opõem. O governo Dilma Rousseff é tão frágil que não é capaz de realizar nenhuma das concepções acima descritas. O governo Dilma Rousseff perdeu todas as condições para continuar à frente do poder do Estado brasileiro porque, além de ser rejeitado pela maioria da população brasileira, não dispõe de maioria parlamentar no Congresso Nacional e não conta também com o apoio de seu partido, o PT, que em reunião do Diretório Nacional em 26/02/2016 aprovou um Plano Econômico diametralmente oposto ao do governo federal.
No Brasil, a maioria dos poderes periféricos e moleculares da nação está se opondo à permanência de Dilma Rousseff na presidência da República, alguns deles reivindicam a cassação dos mandatos de Dilma Rousseff e Michel Temer com a convocação imediata de novas eleições presidenciais e outros, devido à falência das instituições políticas do País e à perda de credibilidade da classe política, defendem a tese da constituição de um governo provisório que convocaria uma nova Assembleia Constituinte para reordenar a vida nacional após a qual convocaria novas eleições. Tudo indica que qualquer desses cenários poderá ocorrer a depender da evolução das crises econômica e política do País.
Tudo indica que a crise econômica deverá se agravar com a perspectiva do denominado “calote branco” e inflação a 20% porque o atraso no ajuste das contas públicas tem tornado mais próximo e provável um cenário de ruptura que resultará em inflação superior a 20% quando o governo terá que imprimir moeda para pagar a dívida pública alimentando ainda mais a inflação. Tudo leva a crer que, caso a equipe econômica não realize o ajuste fiscal, essa realidade virá a partir de 2018. Com uma recessão a 3,2% e déficit fiscal de 2%, a relação entre a dívida bruta e o PIB, uma medida bastante usada para medir a saúde financeira de um país, saltaria de 66% atualmente para 89,5% que é um cenário no qual a relação dívida/PIB chegaria a um nível no qual o Tesouro não conseguiria mais emitir mais títulos da dívida pública.
Se nada for feito para reverter esta situação, a inflação vai disparar ainda mais e pode chegar a 29%. Nesta suposição, o Banco Central teria que financiar a dívida, isto é, imprimir mais moeda alimentando a inflação. A trajetória da dívida do Brasil é, portanto, insustentável e explosiva. A saída, em última instância, seria o “calote branco” do governo que seria uma saída inflacionária quando haveria emissão de moeda para pagar a dívida pública. Se a inflação subir de 10% a 20% ao ano em 2018 e continuar nesse nível, a relação da dívida bruta sobre o PIB sobe a 85% em 2017.
Enquanto a perspectiva de evolução da crise econômica é catastrófica, o mesmo pode acontecer com a evolução da crise política se o governo Dilma Rousseff continuar como um cadáver insepulto até as eleições de 2018. Não há cenário pior para o Brasil do que a permanência no poder estatal até 2018 de um governo fragilizado como o de Dilma Rousseff incapaz de solucionar as crises econômica e política. Os poderes periféricos e moleculares da nação exercidos por indivíduos, grupos, empresas, cientistas, comunicadores, etc. têm que atuar para salvar o Brasil da débâcle econômica, política e social.
* Fernando Alcoforado, 76, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no BrasilEnergia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015).
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