Colaboração de Fernando Alcoforado*
Artigos
de David Brooks do New York Times, publicado no website em 23/07/2016, sob o
título Estratégia de 'lei e ordem' de Trump pode se provar erro de foco na
eleição e de Gilles Paris e Nicolas Bourcier, publicado em 22/07/2016 no jornal
francês Le Monde, sob o título Trump, officiellement candidat des républicains,
veut être « la voix » des oubliés (Trump, candidato oficial dos republicanos,
quer ser "a voz" dos esquecidos) disponível no website destacaram os
principais objetivos políticos de Donald Trump como candidato do Partido
Republicano à Presidência dos Estados Unidos.
Segundo
David Brooks, Donald Trump apresentou uma campanha baseada na defesa da lei e
da ordem na qual deixam evidenciados seus traços de personalidade autoritária.
Trump apresentou uma lógica de gladiador. Tudo gira em torno da conquista, da
supremacia dos Estados Unidos. Trump fala em imigrantes ilegais que matam os
filhos dos americanos que é falso porque, entre 2010 e 2014, só 121 pessoas
libertadas de custódia imigratória cometeram um homicídio depois de soltas e em
um país de 324 milhões de habitantes, só 55 policiais por ano morrem em
decorrência de um crime. As ansiedades principais no país não estão ligadas à
criminalidade porque são econômicas e sociais. Trump está desconectado do país
e não se interessa por nada a não ser nele mesmo. Trump está desligado de seu
partido. Ele não só está mudando seu partido, mas, sobretudo, dissolvendo-o.
David
Brooks afirma que esta foi a convenção mais loucamente mal organizada há muito
tempo. Um partido normal é unido por um sistema coerente de posições e crenças.
Durante décadas, o Partido Republicano representou, no exterior, uma ordem
internacional voltada para o futuro liderada pelos Estados Unidos, e, em casa,
o capitalismo democrático com pequena participação do governo na economia.
Trump dizima isso e outras coisas que os republicanos defendiam e
representavam. A agenda política de Trump é feita de vários recuos defensivos
vagos como o de construir um muro entre os Estados Unidos e o México para
impedir a entrada de latino-americanos, proibir a entrada de muçulmanos no país
e isolar-se do mundo.
Por sua vez, Gilles Paris e Nicolas Bourcier
afirmaram que Donaldo Trump disse que ele era a voz "de quem trabalha duro
enquanto ninguém fala por eles" vítimas de um "sistema
manipulado" que beneficiam apenas as "elites". Trump se
apresentou como o "campeão do povo", o único capaz de mudar tudo. O
candidato republicano procurou desenhar a imagem mais angustiante possível
sobre os Estados Unidos, alimentada por recordar crimes anteriores relacionadas
com a imigração ilegal, a violência contra a polícia, e uma situação econômica
considerada desastrosa. Olhando para além das fronteiras dos Estados Unidos,
Trump destacou "a morte, destruição e fraqueza" dos Estados Unidos
apontando como único culpado sua futura oponente, a ex-secretária de Estado,
Hillary Clinton.
Embora
não tenha abandonado todas as convicções republicanas, denunciando a
regulamentação excessiva, como o peso dos impostos e opor obstáculos à
exploração de recursos norte-americanos, Trump procurou também tranquilizar sua
base ao repetir como faz agora com o fervor de que é "o candidato da lei e
da ordem". Porém, Trump enterrou dois credos conservadores: o livre
comércio e o intervencionismo na política externa. Além disso, mostrou seu
caráter ultranacionalista estreitando o horizonte de seus concidadãos, em nome
de um princípio: "A América, primeiro".
Todas
as mensagens de Donald Trump apontam na direção de que, se for eleito presidente
dos Estados Unidos poderá renascer o fascismo na era contemporânea. Robert
Paxton, historiador norte-americano especialista sobre o fascismo e a Europa
durante a Segunda Guerra Mundial, afirma em sua obra The anatomy of fascism
(New York: Vintage Books, 2005) que o “fascismo é um sistema de autoridade
política e ordem social que tem o objetivo de reforçar a unidade, a energia e a
pureza de comunidades nas quais a democracia liberal é acusada de produzir
divisão e declínio". Paxton acrescenta que o fascismo é "uma forma de
comportamento político marcado pela preocupação obsessiva com o declínio da
comunidade, com a humilhação e a vitimização e pelo culto compensatório da
unidade, energia e pureza, na qual um partido de massas de militantes nacionalistas,
trabalhando em colaboração desconfortável, mas efetiva com as elites
tradicionais, abandona as liberdades democráticas e busca através de violência
redentora e sem controles éticos ou legais objetivos de limpeza interna e
expansão externa".
De
acordo com Paxton, o fascismo emerge em busca de algum tipo de renovação
nacionalista. Os fascistas se reúnem para restaurar uma ordem social rompida,
como sempre usando temas como unidade, ordem e pureza. A razão é rejeitada em
favor da emoção passional. Ela sempre tem raiz na restauração do orgulho
nacional perdido pela ressurreição dos mitos e valores tradicionais da cultura
e na purificação da sociedade das influências tóxicas de estrangeiros e de
intelectuais, os quais seriam culpados pela miséria em que vive a nação. É o
caso dos Estados Unidos diante de uma crise econômica insuperável como a atual,
de comprometimento do american way of life e de perda de sua hegemonia mundial
para a China. Segundo Paxton, o fascismo somente cresce no solo revolto de uma
democracia madura em crise como é o caso dos Estados Unidos. Essa visão foi
abraçada completamente pelo Partido Republicano que agora se define nessa
linha. Nesse estágio, é abertamente racista, sexista, repressor, excludente e
permanentemente viciado na política do medo e do ódio, como aconteceu durante o
governo George W. Bush e que seria aprofundada em um futuro governo Donald
Trump.
Noam
Chomsky, filósofo e professor no MIT (Massachusets Institute of Technology),
advertiu que o fascismo poderia acontecer nos Estados Unidos. Ele afirmou que,
há mais de 30 anos, os rendimentos reais estagnaram ou caíram nos Estados
Unidos, o índice oficial de desemprego é de cerca de 10 por cento sendo que no
setor da indústria atingiu os níveis da época da Depressão em 1929 (Ver o
artigo Chomsky Warns Of Risk Of Fascism In America!, publicado no website ).
Chomsky traçou um paralelo entre a República de Weimar na Alemanha com os
Estados Unidos da atualidade. A República de Weimar foi esmagada pelo nazismo
em 1933. O mesmo se repetirá nos Estados Unidos com Donald Trump no poder?
É
preciso observar que o fascismo antigo foi um movimento político que surgiu na
Itália após a Primeira Guerra Mundial, na década de 1920, sob a liderança de
Benito Mussolini. O fascismo antigo representou uma reação das forças
conservadoras da Europa contra a ascensão dos trabalhadores ao poder em vários
países após a vitória do socialismo na União Soviética em 1917 e se baseava em
concepções fortemente nacionalistas e no exercício totalitário do poder, portanto
contra o sistema democrático e liberal, e repressivo ante as ideias
socialdemocratas, socialistas e comunistas. O fascismo antigo implantado
durante as décadas de 1920 e 1930 do século XX se baseava em um Estado forte,
totalitário, que se afirmava encarnar o espírito do povo, no exercício do poder
por um partido único cuja autoridade se impunha através da violência, da
repressão e da propaganda política.
O
líder fascista é uma figura que está acima dos homens comuns. Mussolini era
denominado como Il Duce, que deriva do latim Dux (General) e Hitler de Fuehrer
(Condutor, Guia, Líder, Chefe). Ambos eram lideranças messiânicas e
autoritárias, com um poder que era exercido de maneira unilateral sem consulta
a quem quer que seja. Na Alemanha, o fascismo antigo recebeu a denominação de
nazismo. Este movimento teve também um forte componente racial, que promulgava
a superioridade da raça ariana e procurava exterminar os judeus, os ciganos e
os negros. Donald Trump tem personalidade similar à de Mussolini e de Hitler. O
fascismo antigo se caracterizou também pelo nacionalismo agressivo, militarismo
e imperialismo a serviço das classes dominantes, pelo culto do chefe, pelo
anticomunismo e pela ditadura. Para por em prática os seus princípios, foram
ignorados os direitos individuais dos cidadãos, o Parlamento foi transformado
num simples órgão consultivo e foi criada a polícia política que esmagava toda
a oposição ao regime.
O
renascimento do fascismo sob o comando de Donald Trump nos Estados Unidos
resultaria, fundamentalmente, de seu declínio econômico e da perda de sua
hegemonia na cena mundial em um prazo temporal muito curto. Todas as relações
mundiais dos Estados Unidos se modificaram profundamente nos últimos tempos
sendo obrigado a compartilhar com outros países o poder em escala mundial. A
era em que os Estados Unidos procuravam impor sua vontade no cenário
internacional nos planos econômico e militar acabou. É o que já está ocorrendo
a partir do governo Barack Obama. A crise geral do sistema capitalista mundial
está acelerando a mudança geopolítica de longo prazo, anunciando o declínio do
poder americano e da influência europeia. Donald Trump representa uma reação
visando reverter esta tendência. Sua atuação levaria, na prática, ao
renascimento do fascismo nos Estados Unidos.
*Fernando Alcoforado, 76, membro da Academia Baiana de
Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento
Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor
nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento
regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros
Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a
Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o
Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento
do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de
Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e
Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do
Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA,
Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social
Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento
Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010),
Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento
global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os
Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV,
Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no Brasil- 4 Energia e Mudança Climática
Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015). Possui blog na
Internet (http://fernando.alcoforado.zip.net). E-mail: falcoforado@uol.com.br.
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