segunda-feira, 29 de setembro de 2014

AS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS E O IMPERATIVO DAS MUDANÇAS ESTRUTURAIS E DE GESTÃO DO SETOR PÚBLICO NO BRASIL

 Fernando Alcoforado *


A crise econômica, política e moral em que se defronta a sociedade brasileira na era contemporânea está a exigir profundas mudanças estruturais e de gestão pública no Brasil. As mudanças estruturais imprescindíveis ao Brasil são as seguintes: 1) Elevar o nível de poupança pública no Brasil necessária aos investimentos em infraestrutura econômica (energia, transporte e comunicações) e social (educação, saúde, habitação e saneamento básico) para atender as necessidades da população e do setor produtivo; 2) Promover a reforma do Estado para torná-lo eficiente e eficaz; e, 3) Democratizar a gestão do setor público no Brasil. A elevação da poupança pública no Brasil é absolutamente necessária porque em 2012, a taxa de investimento público foi de apenas 1,09% do PIB que é muito baixa porque o governo federal compromete quase metade do seu orçamento anual ao pagamento dos juros e amortização da dívida pública. Esta situação faz com que o governo federal não disponha de recursos para investir na infraestrutura econômica e social que demanda atualmente R$ 2 trilhões. 

Além do elevado dispêndio com o pagamento do serviço da dívida pública, as altas taxas de juros Selic adotadas pelo Banco Central do governo federal, a quinta maior em toda a economia mundial, bem como o crescente déficit do setor público contribuem decisivamente para o continuado aumento da dívida pública no Brasil. Mantida a tendência de destinar mais recursos para o pagamento de juros e amortizações da dívida pública, haverá menos recursos disponíveis pelo governo (federal, estaduais e municipais) para investir na infraestrutura econômica e social.
A reforma do Estado e da Administração Pública é inadiável. Um dos grandes desafios do Brasil é o da inovação do setor público com a realização da reforma do Estado nos respectivos níveis, federal e estadual porque a crise brasileira está a exigir que ele realize com eficiência e eficácia suas atribuições constitucionais e reduza os seus custos de operação para minimizar a carga tributária sobre os contribuintes. A recuperação da capacidade do Estado brasileiro de regular o sistema econômico, de investir na expansão da economia e de implementar programas na área social depende, em grande medida, da reestruturação que seja nele processada.
Grande parte da ineficiência e ineficácia atribuídas ao Estado no Brasil é devida à falta de integração dos governos federal, estadual e municipal na promoção do desenvolvimento nacional. Associe-se a este fato, a existência de estruturas organizacionais inadequadas em cada um dos níveis federal, estadual e municipal que inviabilizam o esforço integrativo nessas instâncias de governo. A falta de integração das diversas instâncias do Estado é, portanto, total fazendo com que a ação do poder público se torne caótica no seu conjunto gerando, em consequência, de economias de toda ordem como a que vem acontecendo, especialmente no desastroso governo de Dilma Rousseff.
As estruturas organizacionais de governo em todos os seus níveis no Brasil estão superadas. É inadmissível que estruturas de governo federal, estadual e municipal superponham esforços, como ainda ocorre hoje em muitos setores, exaurindo os parcos recursos colocados à sua disposição. Para solucionar este problema, seria necessário fazer com que os governos federal e estaduais assumissem funções normativas e de planejamento global, regional e setorial em bases integradas, enquanto as prefeituras municipais, órgãos de desenvolvimento regional e empresas estatais fariam a parte executiva também de forma articulada.
Competiria, portanto, às prefeituras municipais, aos organismos de desenvolvimento regional e às empresas estatais a grande responsabilidade de colocar em prática todos os planos de desenvolvimento global, regional, estadual, municipal e setorial elaborados em conjunto pelas diversas instâncias de governo após auscultar os parlamentos nos seus níveis federal, estadual e municipal, bem como a sociedade civil.
Este modelo de gestão integrada do setor público no Brasil se contraporia ao que prevalece na atualidade no qual os governos federal, estadual e municipal são autônomos nas suas deliberações e ações e politicamente reativos à ideia de integração. Os grandes instrumentos de execução dos planos seriam as prefeituras municipais no âmbito de cada município, as empresas estatais na esfera setorial e os órgãos de desenvolvimento regional na integração de esforços de prefeituras e empresas estatais na implementação de programas e projetos de desenvolvimento econômico e social.
A implantação de um modelo de gestão eficiente e eficaz para o Estado brasileiro fará com que a sua capacidade de arrecadação de impostos seja ampliada. A corrupção e a evasão de impostos, que hoje se verifica no Brasil, são devidas em grande medida à ineficiência da máquina administrativa do Estado. O novo modelo de gestão baseado na racionalização dos processos de trabalho levará inevitavelmente à redução dos custos de operação do Estado e, consequentemente, da carga tributária sobre os contribuintes. É preciso mudar o enfoque das organizações governamentais que está centrado no processo e não no resultado. Além disso, as organizações governamentais estão distanciadas do cidadão. Há uma estrutura com organogramas, ministérios, secretarias, divisões de ministérios e de secretarias, equipes e um conjunto de leis que determina tudo o que se pode ou não fazer. A partir dessas estruturas - e suas leis, instruções normativas, portarias, regulamentos etc. -, elabora-se um programa ou projeto, uma ação concreta que não está relacionada com os interesses do cidadão. Não foi olhando para o cidadão que se estruturou a máquina administrativa, nem se refletiu sobre a organização da equipe que deveria implementá-la, tampouco se a ação poderia ser exclusivamente do setor público ou em parceria com a sociedade civil e o setor privado.
Para realizar uma verdadeira revolução nos processos de trabalho do setor público, torna-se imprescindível, entretanto, reciclar todo o funcionalismo público, mudar toda a cultura hoje dominante no aparelho de Estado e adotar uma política de remuneração do trabalho compatível com suas novas responsabilidades. Quanto às empresas estatais, é preciso que a relação entre seus dirigentes e os órgãos aos quais se reportam seja baseada em contratos de gestão. Através desses contratos, as empresas estatais obteriam autonomia relativa em relação ao governo e assumiriam o compromisso de perseguir metas preestabelecidas de eficiência e eficácia.
Outros aspectos importantes a incorporar, tendo em vista a mudança de qualidade gerencial do setor público, são: a questão da transparência, o controle social (diálogo público) e a gestão da informação e avaliação. O mais importante é que o Estado esteja voltado para o cidadão – não do ponto de vista teórico-conceitual, mas do ponto de vista operacional. O Estado deve desenhar políticas e programas olhando para o cidadão e seus problemas reais, com todas as implicações decorrentes. A implantação da cultura gerencial somente será bem-sucedida se estiver subordinada aos princípios da transparência e do estímulo ao diálogo público – conceito mais rico do que controle social, apesar de ser este mais usado.
Sem colocar em prática este conjunto de medidas acima descrito o Estado brasileiro não recuperará na integridade sua capacidade de regular o sistema econômico, de investir na expansão da economia e de adotar políticas de compensação social para mitigar os efeitos negativos do processo de acumulação de capital no Brasil, bem como evitará a ocorrência da corrupção que assumiu características endêmicas no país. Ao invés de viabilizar o Estado Mínimo preconizado pelos adeptos do neoliberalismo, devemos, ao contrário, reestruturar o Estado para torná-lo eficiente e eficaz no Brasil.
Lamentavelmente, nenhum dos candidatos à presidência da República se propõe a realizar o conjunto de medidas acima descrito.


Fernando Alcoforado, 74, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, (1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.

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