Fernando Alcoforado *
A crise econômica, política e moral em
que se defronta a sociedade brasileira na era contemporânea está a exigir
profundas mudanças estruturais e de gestão pública no Brasil. As mudanças
estruturais imprescindíveis ao Brasil são as seguintes: 1) Elevar o nível de
poupança pública no Brasil necessária aos investimentos em infraestrutura
econômica (energia, transporte e comunicações) e social (educação, saúde,
habitação e saneamento básico) para atender as necessidades da população e do
setor produtivo; 2) Promover a reforma do Estado para torná-lo eficiente e
eficaz; e, 3) Democratizar a gestão do setor público no Brasil. A elevação da
poupança pública no Brasil é absolutamente necessária porque em 2012, a taxa de
investimento público foi de apenas 1,09% do PIB que é muito baixa porque o
governo federal compromete quase metade do seu orçamento anual ao pagamento dos
juros e amortização da dívida pública. Esta situação faz com que o governo
federal não disponha de recursos para investir na infraestrutura econômica e
social que demanda atualmente R$ 2 trilhões.
Além do elevado dispêndio com o
pagamento do serviço da dívida pública, as altas taxas de juros Selic adotadas
pelo Banco Central do governo federal, a quinta maior em toda a economia
mundial, bem como o crescente déficit do setor público contribuem decisivamente
para o continuado aumento da dívida pública no Brasil. Mantida a tendência de
destinar mais recursos para o pagamento de juros e amortizações da dívida
pública, haverá menos recursos disponíveis pelo governo (federal, estaduais e
municipais) para investir na infraestrutura econômica e social.
A reforma do Estado e da Administração
Pública é inadiável. Um dos grandes desafios do Brasil é o da inovação do setor
público com a realização da reforma do Estado nos respectivos níveis, federal e
estadual porque a crise brasileira está a exigir que ele realize com eficiência
e eficácia suas atribuições constitucionais e reduza os seus custos de operação
para minimizar a carga tributária sobre os contribuintes. A recuperação da capacidade
do Estado brasileiro de regular o sistema econômico, de investir na expansão da
economia e de implementar programas na área social depende, em grande medida,
da reestruturação que seja nele processada.
Grande parte da ineficiência e
ineficácia atribuídas ao Estado no Brasil é devida à falta de integração dos
governos federal, estadual e municipal na promoção do desenvolvimento nacional.
Associe-se a este fato, a existência de estruturas organizacionais inadequadas
em cada um dos níveis federal, estadual e municipal que inviabilizam o esforço
integrativo nessas instâncias de governo. A falta de integração das diversas
instâncias do Estado é, portanto, total fazendo com que a ação do poder público
se torne caótica no seu conjunto gerando, em consequência, de economias de toda
ordem como a que vem acontecendo, especialmente
no desastroso governo de Dilma Rousseff.
As estruturas organizacionais de governo em
todos os seus níveis no Brasil estão superadas. É inadmissível que estruturas
de governo federal, estadual e municipal superponham esforços, como ainda
ocorre hoje em muitos setores, exaurindo os parcos recursos colocados à sua
disposição. Para solucionar este problema, seria
necessário fazer com que os governos federal e estaduais assumissem funções
normativas e de planejamento global, regional e setorial em bases integradas,
enquanto as prefeituras municipais, órgãos de desenvolvimento regional e
empresas estatais fariam a parte executiva também de forma articulada.
Competiria, portanto, às prefeituras
municipais, aos organismos de desenvolvimento regional e às empresas estatais a
grande responsabilidade de colocar em prática todos os planos de
desenvolvimento global, regional, estadual, municipal e setorial elaborados em
conjunto pelas diversas instâncias de governo após auscultar os parlamentos nos
seus níveis federal, estadual e municipal, bem como a sociedade civil.
Este modelo de gestão integrada do
setor público no Brasil se contraporia ao que prevalece na atualidade no qual
os governos federal, estadual e municipal são autônomos nas suas deliberações e
ações e politicamente reativos à ideia de integração. Os grandes instrumentos
de execução dos planos seriam as prefeituras municipais no âmbito de cada
município, as empresas estatais na esfera setorial e os órgãos de
desenvolvimento regional na integração de esforços de prefeituras e empresas
estatais na implementação de programas e projetos de desenvolvimento econômico
e social.
A implantação de um modelo de gestão
eficiente e eficaz para o Estado brasileiro fará com que a sua capacidade de
arrecadação de impostos seja ampliada. A corrupção e a evasão de impostos, que
hoje se verifica no Brasil, são devidas em grande medida à ineficiência da
máquina administrativa do Estado. O novo modelo de gestão baseado na racionalização
dos processos de trabalho levará inevitavelmente à redução dos custos de operação
do Estado e, consequentemente, da carga tributária sobre os contribuintes. É preciso
mudar o enfoque das organizações governamentais que está centrado no processo e
não no resultado. Além disso, as organizações governamentais estão distanciadas
do cidadão. Há uma estrutura com organogramas, ministérios, secretarias,
divisões de ministérios e de secretarias, equipes e um conjunto de leis que
determina tudo o que se pode ou não fazer. A partir dessas estruturas - e suas
leis, instruções normativas, portarias, regulamentos etc. -, elabora-se um
programa ou projeto, uma ação concreta que não está relacionada com os
interesses do cidadão. Não foi olhando para o cidadão que se estruturou a
máquina administrativa, nem se refletiu sobre a organização da equipe que
deveria implementá-la, tampouco se a ação poderia ser exclusivamente do setor
público ou em parceria com a sociedade civil e o setor privado.
Para realizar uma verdadeira revolução
nos processos de trabalho do setor público, torna-se imprescindível,
entretanto, reciclar todo o funcionalismo público, mudar toda a cultura hoje
dominante no aparelho de Estado e adotar uma política de remuneração do trabalho
compatível com suas novas responsabilidades. Quanto às empresas estatais, é
preciso que a relação entre seus dirigentes e os órgãos aos quais se reportam
seja baseada em contratos de gestão. Através desses contratos, as empresas
estatais obteriam autonomia relativa em relação ao governo e assumiriam o
compromisso de perseguir metas preestabelecidas de eficiência e eficácia.
Outros aspectos importantes a
incorporar, tendo em vista a mudança de qualidade gerencial do setor público,
são: a questão da transparência, o controle social (diálogo público) e a gestão
da informação e avaliação. O mais importante é que o Estado esteja voltado para
o cidadão – não do ponto de vista teórico-conceitual, mas do ponto de vista
operacional. O Estado deve desenhar políticas e programas olhando para o
cidadão e seus problemas reais, com todas as implicações decorrentes. A
implantação da cultura gerencial somente será bem-sucedida se estiver
subordinada aos princípios da transparência e do estímulo ao diálogo público –
conceito mais rico do que controle social, apesar de ser este mais usado.
Sem colocar em prática este conjunto
de medidas acima descrito o Estado brasileiro não recuperará na integridade sua
capacidade de regular o sistema econômico, de investir na expansão da economia
e de adotar políticas de compensação social para mitigar os efeitos negativos
do processo de acumulação de capital no Brasil, bem como evitará a ocorrência
da corrupção que assumiu características endêmicas no país. Ao invés de
viabilizar o Estado Mínimo preconizado pelos adeptos do neoliberalismo,
devemos, ao contrário, reestruturar o Estado para torná-lo eficiente e eficaz
no Brasil.
Lamentavelmente, nenhum dos candidatos
à presidência da República se propõe a realizar o conjunto de medidas acima
descrito.
Fernando Alcoforado, 74, membro da Academia Baiana de
Educação, engenheiro e doutor em planejamento Territorial e Desenvolvimento
Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor
nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento
regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros
Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a
Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, (1998), Um Projeto para o
Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento
do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,
http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e
Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do
Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA,
Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social
Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento
Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010),
Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento
global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e
Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV,
Curitiba, 2012), entre outros.
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