Crônica de Jayme
Barbosa
Toda vitória é parcial,
toda conquista, provisória e
toda certeza, suspeita.
Como toda
verdade tem pelo menos dois lados, é bom às vezes a gente confrontar as versões
disponíveis para fomentar as dúvidas e afastar a chatice das certezas. Com o
saber, cresce a dúvida.
Alguns, por
sorte, não sofrem dessas angústias nem percebem a vastidão de ignorância que
nos cerca, levam a vida exibindo sapiência e morrem cheios de verdades. Que
Deus os tenha. Não sejamos tão radicais quanto Yeats: “Os melhores carecem de
qualquer convicção, enquanto os piores estão repletos de apaixonada
intensidade”, ou Montaigne: “A obstinação e a convicção exagerada são a prova
mais evidente da estupidez”, afinal, melhores ou piores, todos têm direito às
suas certezas.
Outro dia,
neste exercício de apreciar ditos e contrapontos, botei os olhos na surrada
máxima de Stuart Mill, que traduz a essência do utilitarismo e frequenta todos
os botecos e borracharias do mundo: “Faça aos outros o que gostaria que lhe
fizessem. Eles poderão não ter o mesmo gosto”. Decisão difícil como se vê.
Poe essas e
outras é que se deve estar atento ao conselho de Kathy Holder: “Não leve a vida
tão a sério. Ela não é permanente”, que Millôr Fernandes simplifica: “A morte é
hereditária”. E que seja sem
reencarnação, mesmo que conte tempo para o INSS.
E agora que
o mapeamento do genoma humano vai permitir aos viventes saberem de quê e quando
irão morrer – excluindo-se os casos de balas perdidas ou endereçadas -, o povo
deu para pensar nos ditos dos seus epitáfios, que [e a única vaidade que resta
depois da morte. Isto é, para os que ficam.
É verdade
que, diante de tanto texto tumular bem bolado, não vale gastar tempo e juízo a
elaborar orações para a própria lápide. Eu, que sou por natureza mão-aberta,
oferto aqui os dizeres do sarcófago de Isaac Newton, já devidamente traduzido
do latim para a nossa inculta e bela: “Que os mortais se congratulem por haver existido
tão insigne ornamento no seio da raça humana. Para os mais modestos, recomendo
o que o poeta José Paulo Paes para si compôs: “para quem sempre pediu tão
pouco/ o nada é positivamente um exagero”.
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