sexta-feira, 5 de setembro de 2014

O RITMO DO LUNDU

Lascivo e malemolente. Foi proibido na corte portuguesa por ser considerado libidinoso. Por outro lado, é havido como o primeiro ritmo genuinamente afro-brasileiro.

 
O lundum nas senzalas

O lundu ou lundum é uma dança brasileira de natureza híbrida, criada a partir dos batuques dos escravos bantos trazidos ao Brasil de Angola e de ritmos portugueses. Da África, o lundu arrumou a base rítmica, uma certa malemolência e seu aspecto lascivo, evidenciado pela umbigada, os rebolados e outros gestos que imitam o ato sexual. Da Europa, o lundu, que é considerado por muitos o primeiro ritmo afro-brasileiro, aproveitou características de danças ibéricas, como o estalar dos dedos, e a melodia e a harmonia, além do acompanhamento instrumental do bandolim.
Musicólogos defendem que no lundu, como o primeiro ritmo afro-brasileiro em formato de canção e fruto de um sincretismo, está a origem do samba, via o maxixe, mas há controvérsias quanto a esse ponto.[carece de fontes]


 

Lundu instrumental recolhido por Von Martius em sua viagem ao Brasil entre 1817 e 1820, publicado como anexo do livro "Viagem pelo Brasil", de Spix e Martius. É o registro musical mais antigo que se conhece do lundu. 
Em Portugal o lundu recebeu polimentos da corte, como o uso dos instrumentos de corda, mas fora proibida por D. Manuel ao ser “contrária aos bons costumes”. Já a vinda direta da Angola para o Brasil recuperou o acento jocoso, mordaz e sensual que incomodara a sociedade lisbonense.


O lundu veio para o Brasil com os negros de Angola, por duas vias, passando por Portugal, ou diretamente da Angola para o Brasil. Aparece como uma dança sem cantoria e de "natureza licenciosa", para os padrões da época. Nos finais do século XVIII, presente tanto no Brasil como em Portugal, o lundu evolui como uma forma de canção urbana, acompanhada de versos, na maior parte das vezes de cunho humorístico e lascivo, tornando-se uma popular dança de salão.
Em terras brasileiras, a dança do lundu foi cultivada por negros, mestiços e brancos e, durante o século XIX, o lundu virou lundu-canção, sendo apreciado em circos, casas de chope e salões do Império. Com essa popularidade, tornou-se o primeiro gênero musical a ser gravado no Brasil, com a canção "Isto é bom", na voz de “Bahiano” em 1902 pela Casa Edison. 
O lundu saiu de evidência no início do século XX, mas deixou seu legado, principalmente no que tange ao ritmo sincopado, no maxixe (outra forma musical híbrida urbana que também deve suas origens à polca e à habanera).

Capa da partitura de lundu, de Francisco Libânio Colás, séc. XIX.

Capa do lundu "O Mugunzá", de Francisco Carvalho, séc. XIX.

Uma modalidade do lundu, a dança de roda, ainda é praticada na Ilha de Marajó e nos arredores de Belém, no estado do Pará, recentemente grupos culturais do entorno do DF reiniciaram essa prática.
O lundu nas suas origens tinha sistemática simples a qual ainda podemos observar na dança de roda sua familiaridade.


Músicos iniciam o ritmo Lundu. As pessoas que querem dançar aproximam-se, já entrando na dança. Um sinal da viola é emitido e a primeira dançadora abre espaço no centro da roda que logo se forma com o grupo.
Forma-se a roda  e ela fica no centro até convidar alguém para substituí-la.
O convite pode ser uma batida de pé diante da pessoa, palmas diante da pessoa, uma umbigada ou um toque de ombros à esquerda e em seguida outro à direita.
A dançadora convidada vai para o centro dançar.
Dança no centro até escolher quem vai substituí-la. Pode ser uma mulher ou um homem. E as substituições continuam por várias vezes.
Quando esta no meio da roda, o dançador faz evoluções inteiramente relaxado, braços caídos ao longo do corpo, pernas meio fletidas, mantendo um sapateio em que a planta do pé bate inteiramente no chão, ao ritmo da música.
A predominância dos dançadores é de mulheres. Homens em geral ficam apenas olhando ao redor, mas ao serem convidados vão para o centro dançar.
Se ao sair convidam uma dançadora com umbigada, faz-se grande algazarra no grupo. Não se registra umbigada de homem em homem, mas entre mulheres há umbigada indistintamente em outra mulher ou em homem.
Em várias documentações consultadas há referência de proibição da umbigada entre parentes próximos – pai e filha, padrinho e afilhada – Pode-se concluir que há aí uma representação do ato sexual no movimento.
“Havia mulatos célebres, aplaudidos nos salões por darem ao lundum um acento libidinoso como ninguém: era uma feiticeira melodia sibarita, em lânguidos compassos entrecortados, como quando falta o fôlego, numa embriaguez de sensualidade voluptuosa.” (Oliveira Martins, História de Portugal, vol. II, Lisboa, 1920).

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