Questões trabalhistas
Por
Raymundo Pinto
Raymundo Pinto, desembargador aposentado do
TRT, é também escritor e membro da Academia de Letras Jurídicas da Bahia e da
Academia Feirense de Letras.
Raymundo Pinto: como lazer, curte o pandeiro, é excelente ritmista.
Qualquer empresário, cujo negócio cresce bastante e alcança um
elevado porte, reconhece, de pronto, a necessidade de concentrar seus esforços
no essencial de seu ramo e de delegar algumas tarefas de menor importância,
embora indispensáveis.
Com base nisso, convencionou-se denominar atividade-fim aquela voltada para tornar concretos
os objetivos e finalidades principais da empresa ou instituição. É óbvio que
nenhum empreendimento – público ou privado – tem condições de dispensar a
execução de certos trabalhos ou providências previstos em lei ou exigidos pela
própria realidade cotidiana. Costuma-se chamar de atividade-meio a esses serviços auxiliares.
Numa pequena fábrica, por exemplo, o dirigente pode
supervisionar os operários que manejam as máquinas e, ao mesmo tempo,
fiscalizar os setores de pessoal, contabilidade, manutenção, segurança, entre
outros. Se a empresa se
agiganta, fica impossível controlar, com eficiência, todas as atividades. Por
ser evidente essa dificuldade, expandiu-se, em escala mundial, o fenômeno da
terceirização.
No Brasil, curiosamente ainda não foi aprovada nenhuma lei que
traga em seu texto, de modo expresso, o termo terceirização.
Isso, todavia, não significa total ausência de norma legal. A velha CLT, que é
de 1943, prevê, no art. 455, a possibilidade de subempreitada e responsabiliza
a empresa principal pelas obrigações trabalhistas dos empregados da primeira em
caso de inadimplência dela. A Lei 6.019/74 trata do trabalho temporário,
contendo várias restrições, e a Lei 7.102/83 autorizou a existência de empresas
para prestar serviços de vigilância e transporte de valores a instituições
financeiras. São exemplos de hipóteses em que é permitido terceirizar serviços
sem usar a indicada denominação. Em face da omissão de regras sobre o tema, a
lacuna vem sendo suprida pela jurisprudência. O TST – Tribunal Superior do Trabalho,
após reiteradas decisões num mesmo sentido, emitiu a Súmula 256 (1986), que
considerou ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, exceto
nos casos das leis já citadas. Diante de uma reação negativa que se seguiu, o
referido TST flexibilizou sua posição anterior e, por meio da Súmula 331
(1993), ainda vigente, ampliou os casos em que seria permitida a contratação de
mão de obra fora do próprio quadro da empresa (terceirizar, pois): a) serviços
de conservação e limpeza; b) “... serviços
especializados ligados à atividade-meio do tomador”. Esta última hipótese
atenuou bastante o rigor da interpretação anterior.
Com as facilidades então surgidas, verificou-se um aumento
vertiginoso das empresas de prestação de serviços mais simples, a exemplo das
que se dedicam às tarefas de higiene e limpeza. Pessoas gananciosas e
inescrupulosas criavam tais empresas, apenas alugando uma sala e lá colocando
algumas mesas e cadeiras. Sem patrimônio para garantir seus compromissos
financeiros, davam o golpe de fechar o negócio, deixando humildes trabalhadores
com salários atrasados e sem nada receber quanto a indenizações resultantes do
contrato de emprego. É bem verdade que a Justiça do Trabalho, com base na
citada Súmula 331, tem responsabilizado as denominadas empresas tomadoras.
Contudo, a avalanche de reclamações teve como uma de suas consequências a
campanha que se desencadeou no país, condenando a terceirização em todas as
modalidades ou em parte delas.
É evidente que se registram, no território nacional, numerosos
casos de irregularidades cometidas, em especial, por pequenas empresas que
prestam serviços terceirizados. Essas ocorrências devem ser combatidas com
bastante rigor e punidos os responsáveis. No entanto, a propósito disso, pregar
a proibição, pura e simples, da terceirização ou até limitá-la em demasiado nos
parece uma posição exagerada e muito radical. Trata-se de um fenômeno mundial,
como antes já afirmado, e que tem contribuído, com pleno êxito, para o aumento
da produtividade da economia de vários países mais desenvolvidos. No Brasil –
há que se admitir – tornou-se irreversível.
Eis algumas vantagens da terceirização para a empresa tomadora:
a) diminuição de encargos trabalhistas e previdenciários; b) melhoria da
produtividade e da qualidade do produto ou serviço oferecido, pois a empresa se
dedicará mais à sua especialização; c) simplificação da estrutura
organizacional; d) redução dos custos, podendo destinar recursos a novos
investimentos e pesquisa de tecnologia; e) diminuição do espaço ocupado,
contribuindo para melhorar as condições ambientais, de segurança e de saúde dos
trabalhadores. Quanto aos empregados das prestadoras, os principais benefícios
são: a) geração de novos empregos nas terceirizadas; b) melhor distribuição de
renda entre os participantes do processo produtivo; c) aperfeiçoamento da mão
de obra daqueles que vão trabalhar em empresas especializadas; d) possibilidade
de criação de sindicatos que vão defender interesses de empregados das
terceirizadas.
Não há dúvida da extensão e da complexidade do assunto ora
enfocado neste curto trabalho. Basta dizer que já existem, no nosso país,
inúmeros livros, artigos, teses, entre outras estudos e publicações tratando do
tema. A discussão tende a se avolumar quando entrar na pauta do Congresso
Nacional a votação de um projeto de lei que pretende regulamentar a
terceirização. Por enquanto, há forte oposição da parte das Centrais Sindicais.
A intenção aqui foi esclarecer alguns aspectos da questão e contribuir para
retirar do debate certos enfoques de natureza emocional que só impedem de
enxergar o que a realidade dos fatos nos impõe. Cuidaremos de outros pormenores
em um segundo artigo, inclusive sobre a terceirização nas atividades-fim e no
caso das entidades públicas.
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