Colaboração de Conrado Matos –
Psicanalista
Vou compartilhar uma época de criança, que não existia
Facebook, mas havia muita ingenuidade entre as pessoas, pouco maldade e mais
convivência. Falávamos de frente dos olhos uns dos outros, ouvíamos de perto,
no cara a cara. Nos abraçávamos, apertávamos as mãos, recebendo o calor humano,
que era muito saudável para autoestima. As conversas eram compartilhadas,
curtidas e todos dávamos o elogio que merecíamos.
Alguns conteúdos eram mentirosos, mas seja como for
não eram maldosos, preconceituosos, e todos respeitavam a opinião de cada um.
Era a época do Bom dia e do Boa tarde, Boa noite, como vai, e tudo bem. Alguns
quando passavam pela porta da igreja, costumavam se benzer, davam a benção ao
seu padre e ao seu padrinho, e tiravam o chapéu quando sentavam a mesa para
almoçar. Era assim nessa época, e ninguém se queixava que teve o relógio
roubado, e os rádios e a televisão não falavam que alguém andava com dinheiro
na calcinha. Se andavam, não sabíamos.
Quando menino, por exemplo, vivendo no interior de
Nossa Senhora de Lourdes, em Sergipe, me parei com cada tipo de loroteiro que
vivia em beira de balcão de bodega, contando histórias que me faziam rir, e que
eu não deixava de acreditar nas suas piadas e seus contos. Parecia algo tão
real que quando me contavam que viu um lobisomem pulando à cerca de alguém,
para não pensar em outra coisa, eu achava que era verdade e, em noite de lua
cheia me vinha um sentimento de uma noite mal assombrada. Nessa época eu ainda
não tinha a ideia do que era um corrupto, vampiro, Drácula ou Zé do Caixão. Só
tinha a ideia do que era alma mal assombrada, que saia da cova e ficava
gemendo. Embora a lenda de drácula já era contada nas grandes cidades, as
estórias de bruxas, assim como, os filmes de Zé do Caixão já passavam nos
cinemas brasileiros.
Quando alguém passava montado em um cavalo em plena
escuridão, eu achava que era a mula sem cabeça. As mangas que caiam dos pés de
mangueiras do quintal de lá de casa, eu achava que era um rebanho de almas
penadas. E qualquer cheiro estranho dentro do mato, eu achava que era a
presença do Saci-Pererê, dos contos de Monteiro Lobato. E qualquer gemido
dentro do mato, eu achava que era uma raposa choca que estava se aproximando.
Além de acreditar que, chuva com sol, era o casamento do leão com a raposa.
Pense nessas coisas que eu acreditava, com tanta inocência?
Esses contos de gente do interior fizeram parte da minha
vida quando criança, e tudo eu achava que era verdade. Confesso que fiquei com
isso até uns nove anos de idade. E aí, quando chego na cidade grande me deparo
com a realidade. Menos loroteiro, e mais fofoqueiros. Não quer dizer que no
interior não existe fofoqueiro. Mas na cidade grande, muitos querem se promover
por via das fofocas. E agora, temos as redes sociais da internet, que para
fofocar é mais fácil ainda. Embora na internet tem muitas coisas boas, para
quem sabe usá-la.
No interior as fofocas chegavam rápidas na boca dos
outros, principalmente quando falavam que alguém pulou à cerca do vizinho para
visitar mulher do outro. Os loroteiros me faziam rir com essas histórias que
eram reais ou mentirosas. Enquanto os fofoqueiros da cidade grande me faziam
raiva com suas conversas exageradas, principalmente, quando cochichava no pé do
ouvido do meu chefe, e entregava todo mundo do setor.
Ser fofoqueiro não é nada fácil. Falar mal dos outros
é mal caráter mesmo, e precisa de muita habilidade e patologia para viver
assim. Fala demais, aumenta, e não respeita o outro. Quer compartilhar demais e
curtir demais.
Dizem que as mulheres é quem mais fofoca, e quando
algumas delas pegam um macho da outra, espalham para Deus e o mundo.
Tem fofoqueiro que quando apronta alguma das suas
maldades, nunca mede o tamanho das suas contendas. Não pensa no tamanho do
terremoto que vai acontecer.
Entre todas as fofocas, a que acho uma das piores é a
fofoquinha que não para mais. É falando durante todo dia que fulano transou com
alguém e não deu conta do recado. Que foi mole naquela noite, travou e não
soube brincar primeiro, antes da grande largada. Isso pode ofender uma pessoa
moralmente e pode deixá-la irritada. Seja no ambiente de trabalho, ou nos
finais de semana entre os amigos no boteco. Uma coisa curiosa é que muita gente
não se incomoda em ser chamado de corno, parece que isso virou moda.
Outra fofoca é ficar falando da roupa que o outro está
vestido. Falar do batom que está usando, o tipo de mulher ou de homem que alguém
está pegando ou namorando. Ou se é gay ou deixou de ser. Isso interessa a
alguém? É só para encher o saco!
A fofoca só se prevalece sobre a vida alheia, e
costuma trazer conflitos entre as relações humanas. Tem hora que uma fofoca
pode virar realidade na boca do povo.
Fofoca é coisa do capeta, e tem momento que perturba a
vida de muita gente. O bom fofoqueiro é
tirado a apaziguador, e sabe contagiar todos com sua astúcia, para um dia
provocar desordem.
Uma fofoca bem contada pode promover, comentar, compartilhar,
ou curtir alguém, assim como pode agredir a moral de uma pessoa.
E o pior de tudo é quando têm fofoqueiro de
fofoqueiro. Imagine no inferno que isso pode provocar.
Para se relacionar melhor com as pessoas, deve
respeitá-las. Tornando mais amáveis e bem mais sinceras. Usar a relação da
empatia, aceitar o outro como ele é, faz com que um clima de relacionamento se
torne mais confiável. As pessoas viverão em um ambiente mais harmonioso, e
todos podem conversar e compartilhar seus sentimentos sem o receio de ser vista
como inadequada, evitando dessa forma, ser vítima de conversas desagradáveis,
como preconceito e descriminação, dentro de um ambiente de trabalho, em grupo
ou em redes sociais. Aceitar as pessoas como elas são pode diminuir as fofocas nas
relações humanas.
Conrado Matos é Psicanalista, Professor e Escritor.
E-mail: psicanaliseconrado@hotmail.com
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