sexta-feira, 28 de novembro de 2014

LUÍS GAMA, SÍMBOLO DA LIBERDADE

Joaci Góes


Luís Gama, nascido em Salvador, a 21 de junho de 1830, e morto em São Paulo, a 24 de agosto de 1882, foi uma das mais extraordinárias personalidades de todos os tempos, no plano da coragem moral e física, na generosidade material e afetiva, bem como em sua invencível vocação libertária.
Como os baianos, em particular, e os brasileiros, em geral, conhecem pouco ou nada dessa figura maior, daremos um breve resumo de sua rocambolesca biografia, como o fizemos no último dia 20, dedicado à consciência negra, ao compormos uma mesa ao lado dos juristas Horácio Pires, presidente do Tribunal Superior do Trabalho e Técio Lins e Silva, presidente do Instituto dos Advogados do Brasil, em evento realizado no Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, iniciativa de Antônio Luiz Calmon Teixeira, presidente do IABA e Eduardo Morais de Castro, presidente em exercício do IGHB.

Luís Gama era filho da jovem escrava Luiza Mahin, cultuada como heroína da Revolução dos Malês, de 1835, e da Sabinada, de 1837, quando foi presa e supostamente repatriada para o continente africano. Seu pai era um nobre português que o vendeu como escravo, aos dez anos de idade, para São Paulo. Ao desembarcar em Santos, o menino Luís fez a pé o percurso para Campinas, onde cumpriu sua sina escrava até os dezoito anos, quando se alforriou, na sequência de sua tardia alfabetização, aos dezessete anos, graças à simpatia que desfrutava de seus senhores.
Aos 29 anos, Luís Gama estreia no mundo literário com o livro de poesias, ainda hoje reeditado, com o título que define seu conteúdo mordaz e iconoclástico de As primeiras trovas burlescas, em que vergasta a sociedade hipócrita e escravocrata do tempo.
Sobre a mãe Luiza Mahin, que viu pela última vez, aos sete anos, Luís Gama deixou um depoimento prenhe de amor e admiração. Do pai que o vendeu para pagar dívidas, Luís decidiu manter o seu nome no mais completo olvido, movido pelo propósito generoso de protegê-lo contra o escárnio e a condenação oprobriosa da posteridade pelo seu gesto nefando.
Matriculado na pioneira Escola de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, Luís abandonou o curso por não suportar o tratamento preconceituoso dos colegas, optando por tornar-se rábula de reconhecida competência que viria a conquistar a liberdade para mais de 500 escravos, um recorde absoluto nos anos da escravidão.
A primeira das grandes vozes a levantar-se contra a escravidão, Luís Gonzaga Pinto da Gama contou, entre seus seguidores, nomes como Castro Alves, Ruy Barbosa, Joaquim Nabuco, José do Patrocínio, Raul Pompéia e Lúcio de Mendonça.
Sua casa, perigosamente usada como esconderijo de escravos fugidos, trazia à porta a seguinte inscrição: “Defendo de graça a quem lute por conquistar a liberdade!”. O desafio maior ao establishment, que deixava sua vida por um fio, vinha com a reiterada afirmação segundo a qual “seja qual for o modo como o escravo mate o senhor, o seu ato será sempre considerado em legítima defesa”.
Nas diferentes literaturas não se encontra quem, alfabetizado tão tardiamente, tenha excelido pouco tempo depois em domínios tão distintos como a poesia, o direito, a oratória, o jornalismo político e humorístico.
A superação dos traumas de um berço tão perturbador coloca Luís Gama no patamar dos grandes de espírito. A Bahia deve a ele um monumento à altura de um dos maiores nomes da Pátria.

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