Fernando
Alcoforado*
O cenário
econômico do Brasil a partir de 2015 é catastrófico porque o País se defrontará
com o problema da estagflação que se traduz no crescimento econômico negativo,
na retração do mercado consumidor, na queda na renda da população e na escalada
da inflação e do desemprego. Estagflação é um termo usado em Economia que indica,
em síntese, uma situação em que pode ocorrer redução do crescimento econômico
e simultaneamente aumento no nível geral de preços. Quando o país atinge o estado
de estagflação, se estabelece também o caos social.
Com o
ajuste fiscal em curso, a desaceleração da economia brasileira será agravada
com a desaceleração da economia mundial cujo efeito internamente será de mais
contração econômica. O Brasil está preso em uma armadilha da estagflação
caracterizada por baixo crescimento econômico e inflação elevada. Tudo indica
que o crescimento do PIB do Brasil será negativo em 2015 e 2016 e a inflação
continuará acima de 6% ao ano. O ambiente externo é de estagnação econômica na
Europa e no Japão, desaceleração econômica na China e pífio crescimento
econômico nos Estados Unidos que comprometerão o desempenho das receitas de
exportação do Brasil.
Para
enfrentar a crise, o governo brasileiro deveria apresentar um programa
econômico consistente, que tenha credibilidade e provoque uma reversão na onda
de expectativas pessimistas que tem afetado consumidores e empresários de forma
generalizada. A crise que levou à desindustrialização do Brasil há muitos anos,
deverá se estender também ao agronegócio e aos serviços devido às restrições
impostas pela crise hídrica e de energia e a insuficiência na logística de
transporte no Brasil. A desaceleração econômica associada ao aumento
generalizado de preços é catastrófica para a grande maioria da população
brasileira porque, além incrementar o desemprego, reduzirá seu poder de compra.
Estaria sendo formado, desta forma, o caldo de cultura para o incremento das tensões
sociais no Brasil. O cenário econômico catastrófico tende a levar o Brasil ao caos
social e, em consequência, a três cenários alternativos de evolução da crise descritos
a seguir:
Cenário
1- Apesar do agravamento das tensões sociais
devido ao aprofundamento da crise
econômica e da impopularidade do governo Dilma Rousseff perante a Sociedade Civil, ela
consegue se manter a duras penas no poder contando com o apoio da maioria do
Congresso Nacional. O governo petista continuará moribundo no poder o que faz com que
Dilma Rousseff fique cada vez mais sem condições para continuar à frente dos destinos
da nação. Milhões de brasileiros não veem no governo atual condições para vencer
a crise. Esta situação alimentará o movimento de massas pelo impeachment ou pela
deposição de Dilma Rousseff através de intervenção militar como solução para a crise
atual. Com o evoluir do tempo, este cenário tende a se inviabilizar evoluindo
para a emergência do Cenário 2.
Cenário
2- As tensões sociais se elevam devido ao
aprofundamento da crise econômica Crescendo
de forma irresistível ao ponto de tornar inevitável o impeachment de Dilma Rousseff
que acontece graças à pressão da Sociedade Civil e à perda de sua maioria Junto ao
Congresso Nacional. Com o impeachment de Dilma Rousseff o vice-presidente Michel
Temer assumiria o poder. Como Michel Temer não tem estatura política suficiente
e não possui liderança e competência gerencial para fazer frente à crise Econômica
e política, os movimentos de massa em defesa dos interesses da população
continuarão
crescentes. Com a evolução da crise econômica e diante da impotência do governo
federal na solução dos problemas nacionais e no atendimento das demandas sociais
poderá emergir o Cenário 3.
Cenário
3- Diante da incapacidade do governo federal de
manter a ordem política e social,
haveria a deposição ou renúncia de Michel Temer com a intervenção das Forças Armadas
para fazer frente ao caos político, econômico e social do País. Além da
profunda crise econômica que leva a economia do Brasil à estagflação e da incapacidade
política e gerencial do governo federal para gerir os destinos da nação, o estado de
permanente violência no ambiente social e a corrupção generalizada que
domina o
País colocam na ordem do dia a necessidade da celebração de um novo contrato social
no Brasil. Thoreau, grande teórico da desobediência civil, coloca desta forma o
problema: se o Estado se torna indigno e corrupto, é tarefa moral do indivíduo não dar
mais suporte a este (Ver THOREAU, Henry David. A desobediência civil.
Porto Alegre:
L&PM, 1997). Esta seria a justificativa para o fim do governo Dilma
Rousseff. A crise
política que afeta o Brasil no momento demonstra o fracasso do contrato social celebrado
em 1988 com a nova Constituição que passou a vigorar depois do regime
militar.
A crise da
democracia representativa no Brasil faz com que não funcione o contrato social
representado pela Constituição de 1988 e abra caminho para a tentação
autoritária que faz parte da história do Brasil. Sérgio Buarque de Holanda, um
dos grandes pensadores brasileiros, afirma em seu livro Raízes do
Brasil que a principal característica
do povo brasileiro que, segundo ele, herdamos dos povos ibéricos é a cultura
da personalidade individual (Ver HOLANDA,
Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil.
São Paulo: Companhia das Letras, 1999). Para
os povos ibéricos, segundo
Buarque de
Holanda, o único valor verdadeiramente plausível ao homem é inferido onde este
não precise dos demais, onde sozinho se baste e não necessite dos outros. Uma
característica do povo ibérico, aliás, a mais importante, segundo Buarque de Holanda,
de todas elas, que passou a fazer parte do arcabouço cultural brasileiro,
revelasse na pouca capacidade de associação voluntária e na própria deficiência
de se agir politicamente.
Esta inaptidão
política fundamental resulta, segundo Buarque de Holanda, das tendências
fortemente direcionadas para a tentação autoritária na vida política
brasileira.
Fato este
que explicaria, de certa forma, a tendência autoritária presente na história do
Brasil e sua constante recaída em ditaduras. Buarque de Holanda afirma que o
contrato social no Brasil possui tendência a ser predominantemente autoritária
pela inaptidão do povo e da cultura em estabelecer espaços políticos onde se
construa o que Arendt chamava de pensamento plural. Esta experiência,
afirma ela, é o oposto ao que Buarque de Holanda apresenta como as
características mais presentes nos povos ibéricos e que foram legados aos
brasileiros (Ver ARENDT, Hannah. Crises da República. São Paulo: Perspectiva,
1973).
Buarque de
Holanda afirmava, portanto, que a herança cultural ibérica minou a possibilidade
de maiores mobilizações sociais e políticas e da sociedade brasileira como um
todo, fazendo com que o país fosse governado por poucos e por ditaduras. Quando
analisamos o Leviatã de Hobbes notamos que ele nasce justamente da
impossibilidade dos contratantes em estabelecer, entre eles mesmos, quem e de
que forma se dará o governo civil. É aí que surge o poder acima daqueles
que deveriam regulá-lo independentemente de suas vontades e consentimento. Na terra
de barões, como afirmou Buarque de Holanda, onde todos são cultores de uma
personalidade individual e de regalias da vida privada abastada, e de onde é
difícil distinguir entre o público e o privado apenas um poder temido por
todos pode estabelecer a ordem. O Cenário 3 acima descrito configuraria esta
situação.
O medo e o
terror são as alavancas fundamentais das engrenagens que o Leviatã põe
em movimento (Ver HOBBES, Thomas. Leviatã, Forma Matéria e Poder de um
Estado Eclesiástico
e Civil. São Paulo: Martin Claret, 2002). Surge então,
no seio da formação histórica
brasileira, sua predisposição à versão autoritária do contrato social. O
Cenário 3 acima
descrito confirma esta tendência. Percebe-se, portanto, que diante da falência
da democracia representativa no Brasil e da existência de governos
incompetentes e sem visão estratégica, estamos ameaçados de conviver com o caos
social que poderá levar, lamentavelmente, ao advento de mais uma ditadura no País.
O filme “O
Ovo da Serpente” de Ingmar Bergman retratou com muita fidelidade os primeiros
passos da sociedade alemã que, já dividida, desembocaria nas mãos do nazismo a
partir de 1933. No filme “O Ovo da Serpente” já se podia ver, dez anos antes da subida
dos nazistas ao poder, um fantasma rondando a Alemanha e pressupor que em meio
à desordem, à crise econômica e ao vácuo político, uma semente de radicalismo e
violência estava para surgir. Este é o caso do Brasil. Bergman constrói com
impecável riqueza de detalhes o mundo sangrento, paranoico e instável que era a
Alemanha de 1923, ano em que se passa o seu filme, no período de 3 a 11 de Novembro,
semana do Putsch de Munique. A luta pela sobrevivência e o medo acompanham
as ações vacilantes de uma sociedade que se decompõe. Tanto na Alemanha
quanto nos países capitalistas desenvolvidos naquela época, os índices de criminalidade
estavam em alta ameaçando a paz social como hoje acontece no Brasil.
* Fernando
Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento
Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona,
professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico,
planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas
energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo,
1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel,
São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os
condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado.
Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003),
Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia-
Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea
(EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development-
The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft &
Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária
(P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o
progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica,
Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba,
2012), entre outros.
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