Adam HadhazyDa BBC Future
16 abril 2015
É
incrível pensarmos que, segundo alguns cálculos, uma pessoa que atingir 78 anos
terá passado nove deles assistindo televisão, quatro anos dirigindo, 92 dias no
banheiro e 48 dias fazendo sexo. Mas nada supera o sono: aquela pessoa terá
levado quase 25 anos de sua vida dormindo.
Muitos de nós acreditam se tratar de uma perda de
tempo e se perguntam: quanto tempo aguentamos sem dormir? E quais as
consequências de não desfrutar do sono?
Qualquer pessoa saudável que planeje descobrir as
respostas por sua própria experiência terá dificuldades em executá-lo. "A
vontade de dormir é tão forte que ela chega a superar a vontade de comer",
afirma Erin Hanlon, professora no Centro de Sono, Metabolismo e Saúde da
Universidade de Chicago, nos Estados Unidos. "O cérebro simplesmente
embarca no sono, apesar de todos os esforços conscientes para espantá-lo."
Dormir para quê?
O motivo exato pelo qual a vontade de dormir é tão
forte ainda é um mistério. "A função precisa do sono ainda precisa ser
desvendada", afirma Hanlon. Ela acrescenta, no entanto, que algo no sono
parece "zerar" os sistemas em nosso organismo.
Além disso, alguns estudos demonstraram que o sono
rotineiro e adequado ajuda a curar doenças, fortalece o sistema imunológico,
melhora o metabolismo e traz muitas outras vantagens. É por isso que nos
sentimos bem ao acordarmos de uma noite bem dormida.
Por outro lado, a falta de sono pode estar ligada a
um maior risco de diabetes, problemas cardíacos, obesidade, depressão e outras
doenças. Para evitar esses males, nosso corpo envia sinais desagradáveis quando
adiamos ou encurtamos o descanso: a energia acaba, o andar se torna
cambaleante, as pálpebras pesam sobre os olhos doloridos.
E quanto mais resistimos a dormir, perdemos a
capacidade de concentração e de memória.
Se ignorarmos esses efeitos e passarmos dias e dias
acordados, nossas mentes começam a se desequilibrar. Alterações de humor,
paranoias e alucinações tomam conta. "É uma espécie de loucura", define
Atul Malhotra, diretor de medicina do sono da Universidade da Califórnia em San
Diego.
Muitos estudos documentaram o declínio do organismo
que sofre que privação do sono. O nível de hormônios causadores do estresse,
como a adrenalina e o cortisol, aumenta, fazendo a pressão arterial subir.
Enquanto isso, o ritmo cardíaco se altera e o
sistema imunológico começa a esmorecer, segundo Malhotra. "Esses
indivíduos passam a se sentir cada vez mais ansiosos e têm maior risco de
contrair doenças", afirma.
A boa notícia é que esses efeitos não são
permanentes e podem desaparecer ao se colocar o sono em dia. "Os danos são
reversíveis", afirma Jerome Siegel, professor do Centro para a Pesquisa do
Sono da Universidade da Califórnia em Los Angeles.
Insones extremos
Ciente dos problemas da insônia, Livro dos Recordes
eliminou provas de resistência ao sono
Mas o que fazer quando o sono nunca vem? Uma rara
doença genética conhecida como insônia familiar fatal (IFF) nos dá um quadro
macabro das consequências da falta de sono extrema.
Apenas cerca de 40 famílias em todo o mundo possuem
o gene da IFF. Um defeito nesse gene faz com que proteínas no sistema nervoso
se deformem em príons, perdendo sua funcionalidade normal.
"Os príons são proteínas com formas estranhas
que embaralham a vida dessas pessoas", explica Malhotra. Eles se aglomeram
no tecido neural, matando-o e formando cavidades no cérebro (exatamente como no
caso da doença priônica mais conhecida do mundo, a síndrome de
Creutzfeldt-Jakob).
Uma das áreas particularmente atingidas em
indivíduos com IFF é o tálamo, região profunda do cérebro que controla o sono.
Por isso, alguns passam dias sem dormir.
Ao fim de algumas semanas, entram em uma espécie de
adormecer superficial, apresentando sonambulismo ou movimentos musculares
involuntários. A situação pode levar à perda de peso e à demência, e culminaria
na morte.
Nem no 'Guinness'
É possível que, ao saber de tudo isso, muitos de
nós acabem desistindo de testar nossos limites sem dormir. Mas uma questão
ainda está no ar: quanto tempo aguentamos acordados?
O registro mais citado é o do americano Randy
Gardner, que, para uma experiência para a feira de Ciências de sua escola,
ficou 264 horas sem dormir – ou pouco mais de 11 dias, segundo cientistas que o
monitoraram durante esse tempo. Gardner tinha 17 anos e o experimento ocorreu
em 1964.
Muitos outros relatos, pouco ou mais
inacreditáveis, surgiram desde então em várias partes do mundo.
Mas ninguém conseguiu estabelecer um número de
horas definitivo. Talvez isso seja uma boa coisa. Ciente dos danos graves
provocados pela falta de sono contínua, o Livro Guinness dos Recordes eliminou
esse tipo de competição na década passada.
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