Fernando
Alcoforado*
Vivemos em
um mundo caótico que, apesar das tentativas de planejamento econômico e social
em vários países capitalistas e socialistas, não tem havido sucesso na busca de
seu ordenamento e da estabilidade econômica e social. A União Soviética
inaugurou a tentativa de planejamento estatal centralizado que promoveu um
extraordinário crescimento econômico para o país de 1917 até a década de 1970,
mas não conseguiu impedir seu declínio e desestruturação no final da década de
1980 do século XX.
Alguns
países capitalistas centrais e periféricos, como o Brasil, planejaram suas
economias
com base no modelo keynesiano após a Segunda Guerra Mundial obtendo
elevado
crescimento econômico que não se tornou sustentado.
No âmbito
das empresas, o processo de planejamento foi aperfeiçoado com a utilização do
planejamento estratégico introduzido no final da década de 1950 que atingiu seu
auge na década de 1970 com a adoção do “método clássico” que se apoiava na
análise SWOT (pontos fortes/fracos, ameaças e oportunidades) e na formulação da
estratégia empresarial. Entretanto, a racionalização excessiva do planejamento
estratégico acabou por criar planos que eram puramente lineares e complexos em
sua elaboração. Perda de
credibilidade
emergiu como resultado da incapacidade de integrar a estratégia concebida à
realidade operacional das empresas. Na década de 1980, o planejamento
estratégico foi aperfeiçoado ainda mais com o conceito de vantagem competitiva
introduzido por Michael Porter, que passou a considerar questões antes
abandonadas pelo método clássico, como a análise de cenários e as forças
competitivas estruturais da indústria (fornecedores, concorrentes potenciais
entrantes, compradores de produtos e produtos substitutos).
O grande
desafio enfrentado pelos dirigentes governamentais e empresariais na era
contemporânea
é representado pela necessidade de planejar o desenvolvimento de seus países e
sistemas produtivos em um ambiente de elevada complexidade e de mudanças muitas
vezes caóticas. As antigas crenças no determinismo, no controle e na
previsibilidade
dos modelos econômicos não se sustentam na era contemporânea. O
caos e a
complexidade do ambiente de negócios fazem com que os governos, as
empresas e
as pessoas sintam a sensação de estarem sendo arrastadas por um furacão
que
permeia toda a vida política, econômica e social. As ciências clássicas que, no
passado,
nos ofereceram uma série de métodos para entender a realidade e construir
modelos
econômicos e organizacionais já não atendem as necessidades da era
contemporânea.
Vivemos e
trabalhamos num mundo cujos fenômenos não podem mais ser analisados no campo
científico com base nos conceitos da mecânica de Newton, no racionalismo de Descartes
e no determinismo de Laplace. Não podemos continuar com a utilização de modelos
econômicos e organizacionais em que tudo a eles relacionados seja tratado de forma
isolada e desconectada do todo. Cada país do planeta e o mundo em que vivemos são
constituídos por sistemas políticos, econômicos e sociais caóticos,
imprevisíveis, que se caracterizam pela impossibilidade de prever seus estágios
futuros porque uma pequena mudança nas condições iniciais do sistema pode
ocasionar grandes implicações em seu comportamento futuro.
Os modelos
de gestão convencionais consideram a administração uma atividade de
“feedback”
negativo, isto é, estabelece uma estratégia e conduz a empresa na direção
desejada
com a correção dos desvios entre o plano traçado e os resultados alcançados.
Numa época
em que tudo muda rapidamente, pode-se afirmar que os princípios que
regem
esses modelos estão ultrapassados porque é impossível a conquista de um estado estável
ou de equilíbrio nas organizações em um ambiente externo como o atual caracterizado
pela instabilidade. Enquanto os modelos de gestão convencionais
centrados
na estabilidade, no determinismo, enfatiza o processo de “feedback” negativo que
tende a reduzir a mudança, retornando o sistema à sua posição de equilíbrio, os
modelos de gestão adequados à era contemporânea deveriam privilegiar o
“feedback” positivo que promove a mudança em direção a um novo estágio de
desenvolvimento.
Para ser
eficaz, o processo de planejamento precisa levar em conta, necessariamente, a instabilidade,
a incerteza, com suas turbulências e seus riscos. No ambiente econômico contemporâneo,
já se tornou lugar-comum falar em turbulência e instabilidade dos mercados como
o ocorrido em 2008 com a crise do sistema capitalista mundial que afetou todos
os países e empresas. Uma das grandes dificuldades do processo de planejamento
é o de minimizar as incertezas quando se sabe que a mudança é a única regra
estável no atual momento e que o passado serve cada vez menos como base para projetar
o futuro.
As visões
clássicas a respeito da incerteza foram todas depreciativas, pois a ciência
esteve
sempre orientada para a descoberta de certezas. Todo conhecimento reduzia-se à ordem,
e toda aleatoriedade seria apenas aparência, fruto de nossa ignorância, a ser necessariamente
superada em algum momento futuro. O desenvolvimento da Teoria do Caos a partir
da década de 1970 contribuiu para a formulação de um modelo muito diferente do
que prevalecia até então que era basicamente determinista e linear. No modelo
baseado na Teoria do Caos, o mundo é mais complexo e fundamentalmente não determinista
e não linear. A Teoria do Caos se impôs a partir do avanço no entendimento dos
processos lineares e não lineares e especialmente, com a ajuda dos computadores.
Prigogine
defende a tese de que pequenas perturbações aleatórias podem ser
rapidamente
amplificadas, levando o sistema a uma ainda maior instabilidade, até um
limite
denominado "ponto de bifurcação", a partir do qual é rompida a
estrutura do
sistema
(uma "quebra de simetria"). Após o ponto de bifurcação, o
comportamento do
sistema
torna-se errático por algum tempo, mas tende a estabilizar-se em um novo
equilíbrio
- só que qualitativamente distinto do original. O sistema agora apresenta
novos
modos de organização, estruturalmente mais complexos - ele evoluiu. O
mais
notável
neste processo é, segundo Prigogine, o fato de ser impossível prever o caminho evolutivo
que o sistema irá tomar a partir do ponto de bifurcação. Durante a fase de instabilidade,
o sistema "experimenta" inúmeras variantes de "futuros
possíveis", ante de "decidir-se" por seu novo patamar estável de
complexidade. Todo o processo é, em suma, um processo de auto-organização, que
resguarda o sistema de ingressar no caminho da entropia, isto é, da inexorável
decadência (O Fim das Certezas - Tempo, Caos e as Leis da Natureza. São
Paulo: UNESP, 1996).
As
organizações governamentais e empresariais só serão capazes de sobreviver e
crescer,
evitando sua decadência e morte, com sua auto-organização dinâmica. A
auto-organização nos sistemas governamentais e empresariais pode ser alcançada
desde que o país ou a empresa: 1) possua ricos padrões de interação e
conectividade entre as
pessoas
dela integrantes em todos os seus níveis, de modo a permitir e fomentar o
surgimento
espontâneo de sinergias catalisadoras de novas possibilidades; 2) reconheça ser
inevitável a existência de contradições, de ambiguidade e de conflitos (ou
seja, de "desordem"), e que procure utilizá-los em seu proveito, como
fonte de aprendizado, criatividade e inovação; 3) busque se apoiar em seus
próprios recursos internos como potencial necessário para sua evolução; 4) faça
uso da criatividade, da inovação e da experimentação para desenvolver e
aprimorar seus estoques de conhecimento; 5) apresente sinergia entre seus
membros que pode, a partir de uma determinada massa crítica, vir a produzir
autonomamente alternativas e caminhos inovadores; e, 6) admita a possibilidade
de vir a sofrer uma "quebra de simetria" (uma ruptura estrutural)
imposta pelo ambiente externo, e seja capaz de tirar partido de tal
eventualidade para redefinir sua estruturação interna.
* Fernando
Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento
Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona,
professor universitário
e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial,
planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos
livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil
e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o
Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento
do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944,
2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia-
Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea
(EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development-
The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft &
Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária
(P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o
progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena-
Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores
Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba,
2012) e Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica
no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015).
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