Fernando
Alcoforado*
O ministro
Joaquim Levy está se empenhando bastante no sentido de fazer com que o ajuste
fiscal por ele proposto seja levado avante para assegurar a realização do denominado
superávit primário que não representa nada mais nada menos do que a garantia
de pagamento pelo governo federal do serviço da dívida pública que beneficia, sobretudo,
ao sistema financeiro, particularmente os bancos. A ênfase do Sr. Levy em assegurar
o superávit primário denuncia a quem ele pretende beneficiário sistema financeiro,
principal credor da dívida pública interna. Para atender os interesses do sistema
financeiro, Joaquim Levy contou com o beneplácito da fragilizada e pusilânime presidente
Dilma Rousseff que se dobrou às imposições de seu ministro da Fazenda.
Para
atingir este objetivo, Levy apresentou a proposta de cortar mais de R$ 70
bilhões em
despesas do governo, incluindo programas sociais. Uma economia dessa magnitude teria
potencial para agravar o quadro de recessão que atinge o Brasil no momento e
que levará à queda do PIB de 1,2% em 2016, conforme o relatório Focus, do
próprio Banco Central. Além deste corte nos gastos do governo, as medidas de
ajuste fiscal proposto pelo ministro Levy contemplam restrições à concessão do
seguro-desemprego e do abono salarial que gerariam uma economia da ordem de R$
16 bilhões e à concessão de pensão por morte e auxílio-doença que gerariam uma
economia da ordem de R$ 2 bilhões, a revisão do programa de desoneração das
folhas de pagamento que geraria uma economia da ordem de R$ 5,4 bilhões e
aumento de tributos de ordem de R$ 19,6 bilhões.
A proposta
do ministro Levy contém, portanto, um “pacote de maldades” contra os trabalhadores
e o povo brasileiro em geral ao restringir a concessão do seguro-desemprego, do
abono salarial e da pensão por morte e auxílio-doença e um “pacote de bondades”
em benefício do setor financeiro com a garantia do pagamento da dívida pública
interna e do setor patronal em geral com desonerações. A nova legislação proposta
na MP 664 do governo federal, ao instituir prazo de carência para a pensão por morte,
prevendo o mínimo de 24 contribuições mensais, cometeu um inquestionável atentado
contra os interesses dos trabalhadores. O texto da MP 665 do governo federal muda
às regras existentes e dificulta o acesso a benefícios trabalhistas, como o
seguro-desemprego e o abono salarial. O pacote de maldades do governo Dilma
Rousseff contido no ajuste fiscal idealizado pelo Sr. Levy, lídimo
representante dos banqueiros, se somou à proposta de terceirização oriunda da
Câmara dos Deputados que atenta também contra os trabalhadores.
As MP do
governo federal que mudam os critérios para o acesso à concessão de benefícios previdenciários
e trabalhistas sofreram alterações na Câmara Federal que contrariam interesses
do Palácio do Planalto. O conjunto de medidas do ajuste fiscal enviados pelo governo
Dilma Rousseff ao Congresso Nacional é, até o momento, o principal esforço de
sua equipe econômica. Este conjunto de medidas é questionável, entretanto,
porque, ao invés de penalizar os trabalhadores e o povo brasileiro em geral, o
ajuste fiscal do governo Dilma Rousseff poderia obter resultados muito mais
expressivos se tributasse as grandes fortunas, aumentasse o imposto sobre as
instituições financeiras e reduzisse drasticamente os gastos de custeio e os
encargos do governo federal com o pagamento da dívida pública interna que
correspondeu em 2014 a 45,11% do orçamento da União, além de propor um projeto
nacional desenvolvimentista. Este é que seria o ajuste fiscal que atenderia com
efetividade as necessidades da nação brasileira no momento.
É
inadmissível que o governo brasileiro tenha destinado 45,11% do Orçamento da República
de 2014 para o pagamento da dívida pública interna quando existe a necessidade
imperiosa de recursos públicos da ordem de R$ 2,5 trilhões para investir na precaríssima
infraestrutura econômica (energia, transporte e comunicações) e social (educação,
saúde, saneamento básico e habitação). O lamentável é que o governo federal
destinou 45,11 % do orçamento para o pagamento da dívida pública superando amplamente
os recursos destinados à educação (3,75%), saúde (3,98%), defesa nacional (1,58%)
e segurança pública (0,33%), entre outros itens. Os estados e municípios, quase
todos falidos, recebem de transferência da União (governo federal) apenas
9,19%. Em outras palavras, a parte do leão no orçamento da República é
destinada ao pagamento da dívida pública interna, cujo maior beneficiário é o
sistema financeiro. Esta é a razão pela qual o governo brasileiro em todos os
seus níveis (federal, estadual e municipal) não dispõe de recursos para suprir
suas necessidades mais elementares.
Se não
houver uma reversão deste quadro, será acentuado com o decurso do tempo o desequilíbrio
entre a demanda e a disponibilidade de recursos para atender as necessidades
do Brasil em infraestrutura econômica e social em detrimento da população
e do setor produtivo nacional. Para o governo brasileiro dispor de recursos para
investimento em infraestrutura econômica e social, tem de renegociar com os bancos
nacionais e estrangeiros (credores de 55% da dívida pública), fundos de
investimento
(credores de 21% da dívida pública), fundos de pensão (credores de 16%
da dívida
pública) e empresas não financeiras (credores de 8% da dívida pública) a redução
dos gastos com o pagamento do serviço da dívida alongando o pagamento dos juros
e da amortização da dívida pública.
Além de
passar a dispor de recursos para investimento na precaríssima infraestrutura econômica
e social do Brasil, a política de reduzir e alongar o pagamento dos juros e da amortização
da dívida pública teria também por objetivo reverter a tendência de explosão
da dívida pública interna do Brasil que alcançou R$ 62 bilhões durante o governo
FHC, R$ 687 bilhões durante o governo Lula e já alcançou R$ 2,4 trilhões em 2014 no
governo Dilma Rousseff. Mantida esta tendência, serão cada vez menores os recursos
disponíveis pelo governo (federal, estaduais e municipais) para investir na
infraestrutura
econômica e social. Além do elevado dispêndio com o pagamento da dívida
pública, as altas taxas de juros Selic adotadas pelo Banco Central do governo federal, a
maior em toda a economia mundial, bem como o crescente déficit do setor público
contribuem decisivamente para o continuado aumento da dívida pública no Brasil.
A
conivência do governo federal com os interesses do sistema financeiro, que está ganhando
dinheiro como nunca no Brasil e no mundo, é que faz com que haja contínua elevação
das taxas de juros Selic. Por sua vez, o déficit público cresce continuamente
no Brasil porque o governo brasileiro aumenta seus gastos de maneira
ineficiente ao ponto de superar suas receitas impactando negativamente no
progresso econômico do País, haja vista que reduz a capacidade de investimento
das empresas, bem como do próprio Estado. O déficit público equivale à parcela
das despesas realizadas (gastos do
governo),
mas que não são cobertas pelas receitas (tributos), cuja principal consequência
é a desordem estrutural da economia que se registra no momento.
Utilizando
dados da Penn World Table (uma confiável fonte de informação comparada de contas
nacionais), o Brasil teria um excesso de gastos entre 14% e 26%. Os tributos, por sua
vez, correspondem a 40% do PIB dos maiores do mundo. Ressalte-se que quando o
governo brasileiro incorre em déficit orçamentário, o mesmo procura cobri-lo adquirindo
recursos internos e externos emitindo títulos públicos para que sejam comprados
pela iniciativa privada, sobretudo pelo sistema financeiro. Mesmo diante da grave
situação vivida pelo Brasil de falta de recursos para investimento na
infraestrutura econômica e social e da possibilidade de explosão de sua dívida
pública que atenta contra os interesses do povo brasileiro, o governo
brasileiro mantém irracionalmente sua política econômica e financeira
francamente favorável a seus credores, isto é, o sistema financeiro. A
continuidade desta política levará o Brasil certamente à bancarrota econômica.
O povo brasileiro tem que se mobilizar para evitar que este cenário se materialize
no futuro. Nunca a capacidade do governo brasileiro de exercer o controle sobre
as finanças nacionais foi tão fraca na história do Brasil.
* Fernando
Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em
Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de
Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento
estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de
sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel,
São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora
Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São
Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese
de doutorado. Universidade de Barcelona,
ttp://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e
Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento
do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA,
Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken,
Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A
Gráfica e Editora, Salvador,
2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao
aquecimento global (Viena-
Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores
Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no
Brasil-Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV,
Curitiba, 2015).
Nenhum comentário:
Postar um comentário