Saúde
Comer massa no jantar não é sinônimo de sobrepeso, como mostram os
italianos, os mais magros do mundo.
Sete truques para emagrecer (ainda
mais) com a caminhada
ANA GARCÍA MORENO 2 MAY 2015
El País – O JORNAL GLOBAL
É comum, quando as clientes de Marie Valdez (República Tcheca, 32 anos)
a veem pela primeira vez, em seu puído avental branco, exclamarem com surpresa:
“Oh! É você? Mas que magra!”. Mal podem acreditar que as mãos responsáveis pela
atraente confeitaria francesa vendida na Fonty, estabelecimento localizado
no bairro de Salamanca, em Madri, sejam de um corpo esbelto e aparentemente
saudável (ela tem 61 kg). “E faço tudo com açúcar e manteiga. Tentando usar a
menor quantidade possível”, comenta a confeiteira. Fregueses assíduos, segundo
afirma, aterrissam no local com a mochila da academia no ombro e
devoram, com o mesmo apetite com que faziam spinning minutos
antes, um luxuriante suspiro. Quem disse que os magros não comem doces?
Embora o açúcar seja um assunto delicado (a OMS recomenda consumir no
máximo 50 gramas), há outros mitos da nutrição embutidos na nossa mente que não
têm o menor fundamento e que tornam qualquer processo de emagrecimento um
calhamaço de regras cuja origem não sabemos, mas que aceitamos como cordeiros.
Nem é preciso ir a extremos como a dieta paleolítica (que proíbe derivados do
leite) e a VB6 (vegana até as seis da tarde: palavra de Beyoncé). Ambas, com
certeza, classificadas pela Associação Britânica de Dietética como
“planos alimentares que não devem ser seguidos em 2015”. Há fórmulas muito mais
simples (sem nome) que também sofrem da mesma falta de rigor. “Não está
demonstrado que jantar carboidratos facilite o aumento de peso. Nem que pular o
café da manhã o favoreça. Também não há nenhuma pesquisa conclusiva que mostre
relação entre o número de refeições diárias e a obesidade. Parar com o pão? Não
vejo por quê. O interessante é que seja integral”, diz Juan Revenga,
dietista-nutricionista, autor do livro Adelgázame, miénteme (em
tradução livre, faça-me emagrecer, minta para mim) e do blog El
Nutricionista de la General. “O problema está na simplificação. Emagrecer é
terrivelmente difícil, e não existe uma solução universal. Quem disser que há
está mentindo. Só me lembro de uma mensagem simples e eficaz para controlar o
peso: ‘Torne sua alimentação mais vegetariana. Que predominem verduras, frutas
e legumes’”.
Quando, há alguns meses, apareceu na capa da prestigiosa revista Time uma
suculenta fatia de manteiga, com o título Eat Butter(coma
manteiga), nosso estômago quase se revoltou. Depois de passar metade da vida
adulta sentindo saudades do sabor dessa emulsão de gorduras que tão fartamente
comíamos na infância, as vozes da comunidade científica indicaram, depois de
tê-la proibido, que talvez tivessem se enganado. E que a relação entre as
gorduras saturadas (presentes na carne, manteiga e produtos lácteos, bem como
em alguns óleos, como dendê e coco) e as doenças cardiovasculares e o excesso
de peso “não é tão clara”. Ou, pelo menos, não acontece com todas as pessoas
nem da mesma forma. E mais: as gorduras, com suas assustadoras nove
quilocalorias (kcal) por grama (o dobro que na mesma quantidade de carboidratos
e de proteínas), ajudam na criação de leptina (hormônio intimamente ligado ao
excesso de peso, porque controla a saciedade, ou seja, a manifestação da fome).
“Quanto mais gordura, mas leptina, e quanto mais leptina, menos apetite”, disse
ao EL PAÍS o geneticista molecular Jeffrey Friedman. Isso não significa que
comer toneladas de gordura de carne seja o melhor caminho para entrar num
biquíni, mas acaba com a demonização desse macronutriente, do qual apenas as
variedades insaturadas (peixe e azeite) tinham aprovação.
Tudo surgiu por causa de uma análise macro da
publicação Annals of Internal Medicine, em 2014, cujos dados
mostravam uma nova certeza: a diminuição do consumo de gorduras nos EUA não
levou a uma queda nas doenças do coração nem na taxa de obesidade, e sim o
contrário. Segundo o Centro Nacional de Estatísticas da Saúde dos EUA, a
epidemia de obesidade disparou no mesmo momento em que as autoridades da área
passaram a defender uma dieta de pouca gordura (1977). E quando reduziram seu
consumo, as calorias do queijo, da manteiga e da carne não desapareceram como
por mágica. Nem foram substituídas por frutas e verduras. Aumentou, isso sim, a
ingestão de carboidratos refinados (pão branco, bolos, biscoitos) e petiscos
com baixo teor de gordura, segundo Marion Nestle, professora de Nutrição
na Universidade de Nova York. O resultado: os Estados Unidos, segundo dados da
Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), são o país
com o maior índice de obesidade do mundo, com 28,3% das pessoas sofrendo dela
(nas pessoas com mais de 15 anos, o número é ainda maior, 35,3%). Já na França,
onde a taxa de obesidade é muito mais baixa (12,9%), há mais consumo de
gorduras saturadas que em todos os outros países europeus (quem resiste a um
bom queijo camembert?), mas a taxa de infarto do miocárdio continua discreta (British
Journal of Nutrition, 2012). É o que ficou conhecido como “o paradoxo
francês”.
O inútil esforço para contar
calorias
Para os especialistas, a melhor solução para perder peso passa por comer
pouco e se mexer muito. “Não vejo nenhuma necessidade de eliminar um
macronutriente (carboidratos, proteínas e gorduras) da nossa dieta”, afirma
Giuseppe Russolillo, presidente da Fundação Espanhola de
Dietistas-Nutricionistas (FEDN) e diretor da Conferência Mundial de Dietistas.
“Também não adianta nada contar calorias”, diz. Entre outras coisas porque (e
novamente tremem os alicerces do que considerávamos inabalável) porque ingerir
menos não implica ficar mais magro.
O químico espanhol Luis Jiménez, em seu livro Lo que dice la
ciencia para adelgazar de forma fácil y saludable (O que diz a ciência
para emagrecer de forma fácil e saudável), apresenta um paradigma: no sólido
estudo Nurses Health Study, elaborado pela Harvard School of Public
Health, foi feito o acompanhamento de milhares de mulheres durante mais de uma
década, registrando-se, segundo o valor nutricional do alimento, o que cada uma
delas comia (Índice de Alimentação Saudável, IAE). A conclusão foi que aquelas
pessoas com um IAE mais elevado (as que comiam de maneira mais saudável) tinham
menos sobrepeso. Mas também eram, e com muita diferença, as que mais calorias
ingeriam. O grupo que apresentava mais sobrepeso era aquele com um IAE mais
baixo (óbvio), mas o de menor ingesta calórica (menos óbvio). “Em um processo
de emagrecimento, influem múltiplos fatores, e a quantidade de calorias não é
determinante”, esclarece Russolillo. “O que é determinante é a qualidade
nutricional do que comemos, o lugar onde vivemos [segundo La Revista
Española de Obesidad, a ausência de supermercados com frutas e hortaliças e
sua localização a grandes distâncias repercute, principalmente em núcleos
urbanos desfavorecidos, num maior Índice de Massa Corporal, IMC], a
publicidade, o metabolismo, a genética ou a implicação das autoridades
sanitárias”, prossegue o especialista. Na opinião dele, na Espanha esta última
brilha por sua ausência e aponta países modelo nesse campo como a Holanda ou o
Japão. “Não só é a genética ou o sushi. O fato de haver 170.000
dietistas-nutricionistas também influi. Nosso país é o único da UE que não tem
nutricionistas no sistema público de saúde”, afirma. A revista The
Lancet é inclusive mais dura com a comunidade internacional, como se
deduz da publicação, em fevereiro, de uma série de artigos em que acusou todos
os países do globo de empreender estratégias frágeis ou erradas contra a
epidemia global de obesidade no mundo desenvolvido. Segundo a OMS, 39% dos
adultos do planeta têm sobrepeso, prevalência que mais do que duplicou entre
1980 e 2014. Suas consequências vão desde doenças cardiovasculares até diabetes,
passando por certos tipos de câncer ou transtornos do aparelho locomotor.
Quero comida e não tenho fome
O que aconteceu na evolução humana para que sintamos fome quando o corpo
não necessita realmente desses alimentos? Juan Reverta responde: “Nós somos
iguais ao que éramos há 7.000 anos. Mudaram as circunstâncias. No mundo
desenvolvido há uma disponibilidade alimentar maior, a comida nos rodeia, e com
uma segurança que nunca tinha existido antes. É como quando você vai ao bufê de
um hotel: come por comer. Nisso nos transformamos. É preciso mudar nossa
compreensão do problema: entender uma biologia nova que se adaptou a comer mais
do que a fome”.
O
organismo, por razões metabólicas não sabidas, tende a recuperar o peso com o
qual conviveu por mais tempo”, Giuseppe Russolillo
Segundo o especialista, a nutrigenética pode ser o futuro, “embora um
futuro distante”. Individualização e conhecimento são as palavras-chave desse
novo caminho para os quilogramas a menos “no qual renunciar a comer um filé
empanado com batatas fritas é uma imensa bobagem”. Criminalizar o consumo de
carboidratos (pão, massa e arroz) tampouco parece uma opção já que, como afirma
Russolillo, a perda de peso só é vantajosa no curto prazo: “Ao cabo de um ano,
o emagrecimento é igual ao de dietas hipocalóricas equilibradas, mas com
efeitos adversos não desejáveis”, diz o especialista. Como denuncia J. M.
Mulet em seu livro Comer sin miedo [Comer sem Medo, sem
tradução em português], dietas deste tipo – leia-se Atkins (só gorduras e
proteínas) – redundam em aumento de colesterol ruim, problemas de
descalcificação e renais. “E aumentam a taxa de mortalidade”, aponta
Russolillo. Do outro lado da perigosa restrição, eleva-se o equilíbrio em
consonância com algumas chaves do emagrecimento que realmente funcionam, como a
que propõe La Revista Española de Obesidad: “A diminuição do
tamanho das porções consumidas é uma medida estratégica válida para a redução
de peso”. Também há sinais vermelhos consensuais como os alimentos preparados e
processados, aos quais nada indica que a ciência vá dar trégua nos próximos
séculos, pois, frequentemente, contêm enormes quantidades de gorduras trans,
sódio e açúcar.
Se existem outros dois conceitos com os quais um viciado em dietas se
depara a cada momento, são “light” (entendido como teor reduzido de gordura) e
“integral”. E embora frequentemente se enquadrem na mesma lenda publicitária do
alimento da moda, pouco têm a ver. A respeito do primeiro, o químico Luis
Jiménez se mostra cético: “Nenhum estudo pôde demonstrar que uma dieta em que
se substituam os alimentos completos por suas versões sem gordura seja efetiva
para perder peso a longo prazo”. Para o integral, sopram ventos melhores. “Um
consumo alto de cereais integrais está associado a um IMC menor”, reza La
Revista Española de Obesidad baseando-se em estudos transversais que,
entretanto, apontaram que os indivíduos com menos sobrepeso consumiam mais
cereais integrais (certo), mas também mantinham estilos de vida saudáveis com
maior frequência da atividade física.
Efetivamente, segundo a OMS, a luta contra o sobrepeso tem de incluir
uma aposta pelo esporte (a partir de 60 minutos diários em jovens e 150
semanais em adultos, no mínimo, pois uma experiência recente publicada pela JAMA
Internal Medicine encoraja a fazer esforços mais intensos), e não só para
fulminar a carga do que foi ingerido, mas porque existe uma relação direta com
o metabolismo. “Fazer exercício de forma contínua melhora o tecido muscular e,
portanto, o consumo energético é maior em repouso”, esclarece o personal
trainer Marcos Flórez. De fato, como comenta Russolillo, o organismo, por
razões metabólicas que se desconhecem, tende a recuperar o peso com o que mais
tempo viveu (96% das pessoas com sobrepeso recuperam os quilogramas depois de
ano e meio). “Só uma aposta definitiva pelo esporte pode frear a volta”,
conclui o presidente da FEDN. Agora sim, com todas as cartas sobre a mesa,
começa a batalha contra a balança. Um conselho: sofra menos e saboreie mais. A
razão fará o resto. Não soa tão sexy como o último conselho de uma diva do pop,
mas, ao menos, funciona.
A OMS recomenda que, no máximo, 10% da energia da dieta provenha de
ácidos graxos saturados (carne, leite e derivados não desnatados). E entre 55%
e 60% de carboidratos (pão, massa e arroz).
Os ácidos omega-3 estão associados a numerosos benefícios. A Autoridade
Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) propõe a ingestão de 250
miligramas ao dia em adultos (224 gramas de peixe azul por semana).
As 12 colheres de açúcar por dia (50 gramas) que a OMS recomenda não vão
diretamente para o café, mas também provêm das frutas, pão ou frios (cerca de
30 gramas de chocolate, uma maçã e 200 gramas de massa excedem o limite).
Embora a recomendação de proteínas seja de 0,8 gramas por quilograma de
peso corporal, em esportistas e vegetarianos tem de ser maior. E deve ser
dividida por igual entre café da manhã, almoço e jantar.
Recomenda-se ingerir entre 25 e 30 gramas de fibra ao dia para ter uma
função intestinal correta (duas unidades de fruta, 100 gramas de hortaliças, 50
de legumes e 50 de pão integral: sim, tudo junto).
O consumo de sal tem de ser inferior a cinco gramas ao dia (200 gramas
de presunto cozido).
De todas as
vitaminas, a mais demandada pelo organismo é a C, cuja recomendação é suprida
com duas laranjas por dia (60 miligramas do micronutriente).
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