Arte cinematográfica
Publicado em literatura por Ally Collaço
Em
2008, o cineasta francês Alain Bergala escreveu um livro chamado "A
hipótese cinema" onde defende que não é possível ensinar cinema, mas
iniciar às crianças ao universo cinematográfico, através de um exercício
simples chamado "Minuto Lumière". Quer saber mais?! Chegaê!
Alain Bergala é um diretor francês de filmes de ficção e documentários,
atua como professor de Cinema na Universidade de Paris III, trabalhou como
diretor e editor na revista de cinema Cahiers du Cinema, e foi conselheiro da
área de cinema do ministro francês Jack Lang, que em 2000, elaborou um plano de
cinco anos para a introdução das artes no ensino fundamental.
Imagem: Mostra de
Cinema Infantil de Florianópolis
Bergala tem
uma experiência com cinema, dentro e fora da escola, de mais de 20 anos e
formulou sua ‘hipótese-cinema’, considerando o cinema enquanto arte para tentar
responder a questão “Como ensinar o cinema no âmbito da escola?”
Para
Bergala a questão não é ensinar, mas iniciar os alunos à arte do cinema. Nesta
obra, o autor traz propostas precisas sobre o que fazer e não fazer no contexto
escolar.
Para o
autor, o cinema deve ser utilizado, enquanto arte (criação do novo), para
promover o encontro com a alteridade, como uma forma do espectador relacionar
sua existência a partir da visão do outro, compreendendo o mundo a partir de um
olhar diferenciado, sensibilizado a partir da experiência do contato.
“A arte, para
permanecer arte, deve permanecer um fermento de anarquia, de escândalo, de
desordem. A arte é por definição um elemento perturbador dentro da instituição.
Ela não pode ser concebida pelo aluno sem a experiência do ‘fazer’ e sem
contato com o artista, o profissional, entendido como corpo ‘estranho’ à
escola, como elemento felizmente perturbador de seu sistema de valores, de
comportamentos e de suas normas relacionais.” (BERGALA, 2008: p.30)
Bergala diz
que Godard considera a cultura como ‘regra’ e a arte como ‘exceção’, no sentido
que de não possa ser ensinada, mas encontrada, experimentada e transmitida de
outras formas além do discurso do saber. “A arte deve permanecer na escola como
uma experiência a parte.” (Bergala, 2008: p.31)
O autor não
sabe ao certo se é na escola o verdadeiro espaço para acolher a arte, mas para
muitas crianças, é o único lugar onde isso seria possível.
Imagem: Acervo
pessoal
O que ele
sugere como abordagem é formar um espectador que vivencie as emoções do
criador de um filme. Pensar o filme através do seu autor. Para ele,
analisar alguns filmes não é suficiente para promover uma mudança no olhar da
criança, pois o trabalho para formação do gosto é longo e demorado. O gosto,
diferente da opinião, não pode ser negociado, pois é formado a partir da
singularidade de cada pessoa, no íntimo de cada um.
A
importância do criar
Além de ir
ao encontro do cinema-arte, Bergala considera ainda mais importante que os
alunos tenham a experiência da criação. O fazer como aprendizado.
Mas ressalta que o professor não deve exigir ou esperar que os filmes sejam
narrativos, compreensíveis e bem acabados, pois é complexa a criação de uma
história “com imagens e sons, decupagem, encenação, ritmos e significações” e
demanda anos de maturação. (Bergala, 2008: p.175)
Ele
ressalta a importância da experiência individual de cada aluno, em algum
momento, já que na instituição escolar é normal haver divisões e papéis já
formados. Esta oportunidade individual pode gerar autoconfiança nos alunos, e
revelar habilidades até então desconhecidas, tanto para si, quanto para o
grupo.
O Minuto
Lumière
No livro,
Bergala comenta da experiência que teve nos seus anos de atuação nas escolas
com um exercício simples, chamado Minuto Lumière, de desafiar os alunos a
filmarem takes de 60 segundos em condições semelhantes aos primeiros filmes do
cinema, realizados pelos Irmãos Lumière.
Os
primeiros filmes eram curtos, sem histórias, focados em cenas do cotidiano, sem
som direto e sem cor e com a câmera fixa. Contexto bem diferente do cinema
atual.
E nos
últimos 4 anos tive a oportunidade de aplicar o exercício nos mais diferentes
contextos, e com algumas variações, dentro e fora da escola em Oficinas de
Cinema, onde tenho experiência há 8 anos. Atuei na EJA com jovens, adultos
e idosos em processo de alfabetização. Atuei com crianças da educação
infantil e adolescentes do ensino fundamental, e ainda com alunas
de Pedagogia (UFSC).
Imagem:
Acervo pessoal
Imagem:
Mostra de Cinema Infantil de Florianópolis
Em cada
contexto foi possível perceber a riqueza do exercício, já que os alunos
precisavam se organizar em grupos, decidir o que filmar, onde a câmera iria
ficar, se concentrar no tempo da tomada, sendo de 60 ou 5 segundos, produzir
objetos, pensar na luz, decidir quem filmaria, resolver a ausência de som e de
cor na edição ou na câmera, entre outras habilidades fundamentais na educação e
no fazer cinematográfico. É um exercício completo que envolve ampliação de
repertório, noções de análise e crítica, relação passado-presente do cinema e
produção de imagens com referências do primeiro cinema em mente.
Este livro
é uma das maiores referências para aqueles que se dispõem a pesquisar sobre
cinema e educação, na perspectiva do fazer cinema-arte. E este exercício que
Bergala propõe é uma excelente maneira de iniciação à alfabetização
audiovisual/cinematográfica. Simples e extremamente rico!
© obvious: http://lounge.obviousmag.org/ally_collaco/2015/06/minuto-lumiere-uma-iniciacao-ao-universo-cinematografico.html#ixzz3cqmsoGm2
Follow us: @obvious on Twitter | obviousmagazine on Facebook
Nenhum comentário:
Postar um comentário