Curiosidade
Lucy ScholesDa BBC Culture
Durante todo o
século 20, a piscina foi algo associado a um certo estilo de vida.
A festa de arromba realizada pela jovem elite
boêmia de Londres em junho de 1928, nas St. George’s Swimming Baths; a foto da
atriz Faye Dunaway exibindo seu Oscar na beira da piscina do Beverly Hills
Hotel, em 1977; e até mesmo a cena de abertura do filme Sexy Beast, de 2000, em que Ray Winstone faz o papel de
um gângster aposentado que se bronzeia às margens de sua piscina – os lugares e
o contexto podem até mudar, mas uma coisa é certa: piscinas representam luxo,
lazer e, acima de tudo, glamour.
Além disso, não existe metáfora melhor para desejos reprimidos e
atividades clandestinas. Piscinas sugerem uma dualidade por natureza: há um
mundo acima da superfície e outro abaixo dela. Uma conexão psicológica entre a
água e os meandros de nosso subconsciente.
A piscina é um símbolo de status, principalmente se
tiver um design bonito. Algo assim como a maravilha em mármore da casa de O Grande Gatsby.
Em Crepúsculo dos Deuses,
de 1950, a piscina da personagem principal tem um papel igualmente importante
na trama – e não só porque o filme começa com a descoberta de um corpo boiando
nela. Assim como a própria protagonista – uma atriz decadente do cinema mudo –
a piscina representa a extravagância e os excessos da Hollywood dos anos 20.
Parte do Sonho Americano
A partir dos anos 50 e 60, o sonho de ter uma piscina no quintal passou
a ser algo mais palpável para a classe média americana. E, apesar de serem
instalações bem mais simples, elas carregavam os mesmo ideais das grandiosas
piscinas dos ricos: prosperidade e uma sensação de liberdade e de escape do
dia-a-dia.
Esses eram os objetivos do Sonho Americano, e em nenhuma outra parte dos
Estados Unidos essa aspiração foi maior do que no sul da Califórnia.
O artista britânico David Hockney capturou bem esse
espírito em uma série de pinturas realizadas entre os anos 60 e 70 e que tinham
como foco as piscinas. Seu quadro mais famoso, A Bigger
Splash, de 1967, não mostra nenhuma figura humana – apenas a onda
que se levanta depois que alguém mergulha nas águas tranquilas.
Simbologia da água
Há algo altamente atraente na domesticação da água como lazer de luxo.
Em seu livro The Springboard in the Pond: An
Intimate Story of the Swimming Pool(“O trampolim sobre a água: uma
história íntima das piscinas”, em tradução literal), o escritor e professor de
história da arquitetura Thomas van
Leewen sugere uma relação entre a água e os sonhos. “Em um mundo onde os
sonhos são fabricados, a água é de fundamental importância. Por isso, em
Hollywood, um lugar tão seco, esse elemento aparece como um sonho vivido em
recipientes de concreto ou plástico chamados de piscinas particulares”,
argumenta.
Para a cultura ocidental, a piscina é também um símbolo de ordem, de
controle sobre o incontrolável. Ela é algo que contém água e que torna a água
disponível e útil – o que é reconfortante aos nossos olhos.
No filme Enigma de Uma Vida,
de 1968, baseado em um conto de John Cheever, o personagem principal é um homem
de meia-idade que decide “nadar para casa”, atravessando todas as piscinas de
seus vizinhos. “Ele parecia ter visto, com olho de cartógrafo, aquela sequência
de piscinas, aquele curso d’água quase subterrâneo que se estendia pela
cidade”, escreve Cheever.
Mas o que começa como uma inocente prova de resistência acaba se
tornando um mergulho cada vez mais conturbado em um rio de esquecimento.
Conforme o personagem passa de casa em casa, ficamos sabendo que ele teve uma
crise nervosa e que o “lar, doce lar” para o qual se dirige não existe mais.
Viveiro de desejos
Se os Estados Unidos detêm o monopólio de imagens de piscinas particulares,
na Europa, as instalações de uso público costumam ser o foco de filmes, livros
e peças. Isso pode se dever à falta de um clima sempre quente como o da
Califórnia.
Filmes como Deep End (“Lado
fundo”, em tradução literal), do diretor polonês Jerzy Skolimowski, de 1970,
e Naissance des Pieuvres (“Nascimento dos polvos”,
em tradução literal), da francesa Céline Sciamma, de 2007, brincam com as
oportunidades “voyuerísticas” da piscina pública, com a instalação se revelando
como um viveiro de desejos e um lugar de sedução.
Há também histórias nas quais o sexo e a morte se
combinam, e a piscina passa a ser um instrumento para o crime. É algo que se
pode encontrar no filme Swimming Pool – À Beira da
Piscina, do francês François Ozon, de 2003. Nele, uma escritora
britânica sofrendo de falta de inspiração busca a tranquilidade da casa de seu
editor no interior da França. Ali, ela cria uma trama de sexo e assassinato, e
tudo o que vemos acontecer nas margens da piscina nos deixa sem saber o que é
realidade ou fruto da imaginação da autora.
É difícil encontrar algo tão reconhecível no mundo inteiro como sendo um
objeto que represente tanto o sucesso financeiro de seu dono ao mesmo tempo em
que sugere uma leitura simbólica.
As piscinas são um raro híbrido de significados, algo para se pensar
enquanto você está estirado à beira de uma delas – seja ela a sua própria, a de
um lugar de férias ou uma instalação pública. Olhá-las em sua profundidade pode
ser mais compensador do que você imagina.
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