Investigados querem constranger novo procurador-geral. Governo age para
acalmar sua base no Congresso com a nomeação de comissionados e liberação de
verbas
Afondo Benites, Brasília
EL PAÍS
- O JORNAL GLOBAL, FACABOOK
Renan Calheiros e Collor no Senado. / MARCOS OLIVEIRA/AGÊNCIA SENADO
Se já não
bastasse uma série de questionamentos de políticos acossados pela Lava
Jato, o próximo procurador-geral da República deverá ser colocado pelo Senado
Federal, ainda que temporariamente, em um limbo. Senadores aliados de alguns
dos citados pela operação se articulam para causar algum constrangimento ao
próximo ocupante do cargo máximo do Ministério Público Federal e tentar atrasar
a investigação. O Governo Dilma Rousseff tenta barrar o movimento oferecendo
cargos a sua base.'
Quatro procuradores concorrem ao cargo, que tem ser
primeiro indicados pela presidenta e logo tem de passar pela confirmação no
Senado. O atual ocupante da função, Rodrigo Janot, e os subprocuradores
Carlos Frederico Santos, Mario Bonsaglia e Raquel Dodge são os concorrentes.
Janot é o alvo preferencial do constrangimento, caso seja escolhido por
Rousseff, porque é ele o atual responsável pelas investigações que envolvem
deputados federais e senadores na Lava Jato.
A
estratégia para entorpecer a designação do procurador parte principalmente de
aliados do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e do
senador Fernando Collor (PTB-AL) — ambos citados na Lava Jato. A ideia é
protelar o máximo de tempo possível a votação de quem for indicado pela
presidenta. Assim, o órgão seria comandado interinamente por um procurador que
nem está disputando a eleição interna do órgão. O mandato atual se encerra em
17 de setembro e o interino ocuparia a função a partir dessa data até a
oficialização do novo nome. Pela legislação, o ocupante seria o vice-presidente
do Conselho Superior do Ministério Público. Quem está nessa função atualmente é
Eitel Santiago Pereira.
Calheiros e
Collor estão entre os principais nomes da lista de 50 políticos
investigados por terem se beneficiado do esquema ilegal que desviou mais
de 6 bilhões de reais da Petrobras nos últimos anos. No caso de Collor, que já
teve sigilo fiscal quebrado e bens apreendidos, a apuração está mais avançada.
No próximo mês a Procuradoria deverá apresentar uma denúncia contra Collor e
contra Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o presidente da Câmara dos Deputados
que também é suspeito de participação no esquema ilícito. Os três negam o
envolvimento.
“É óbvio
que a Lava Jato está pautando o Congresso Nacional. No Senado, há uma
animosidade que tem deixado o clima mais quente e isso vai influenciar na
indicação do procurador”, diz um dos senadores aliados de Calheiros. O
peemedebista negou oficialmente que tenha agido desta maneira e que se pauta
pela isenção para “possibilitar a independência do Legislativo”.
A tentativa
dos senadores de constranger o novo procurador, porém, pode não ser de todo
efetiva. “Já temos o comprometimento de qualquer um que assuma o cargo de que a
Lava Jato terá a continuidade com toda isenção que vem tendo”, alertou o
presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), José
Robalinho Cavalcanti. Segundo ele, em outras três ocasiões recentes um
procurador ocupou o cargo interinamente. Uma delas foi em 2009, quando Roberto
Gurgel substituiu Antonio Fernando de Souza em meio ao processo do mensalão
petista.
“O Gurgel
herdou boa parte da estrutura deixada pelo Antonio Fernando e isso o ajudou a
dar continuidade no caso. Em relação a Lava Jato isso deve ocorrer também, já
que há dez assessores que estão ajudando o Janot na investigação”, salientou
Cavalcanti. Naquela ocasião a interinidade ocorreu porque o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva (PT) demorou para definir quem seria seu indicado, não por
um eventual revanchismo por parte do Congresso Nacional.
Até hoje
nenhum indicado pelo Executivo para a Procuradoria Geral da República foi
rejeitado. Para tentar influenciar na escolha do Poder Executivo, a associação
nacional de procuradores promove uma consulta interna e apresenta uma lista
tríplice para a Presidência. Desde 2003, o escolhido tem sido o primeiro
colocado desta relação —pela intenção dos Governos petistas de se diferenciarem
do antecessor tucano, que nem sempre fazia a deferência. A eleição na ANPR está
será no dia 5 de agosto.
Precaução e
barganha
Diante
dessa possível retaliação por parte dos parlamentares, o Governo se prepara
para acalmar sua base aliada, da qual Calheiros e Collor fazem parte. O líder
do Governo no Senado, Delcídio do Amaral (PT-MS), disse que a gestão Rousseff
tem aproveitado o recesso parlamentar para acalmar seus aliados, com a nomeação
de ocupantes de cargos comissionados e uma ampliação do diálogo com algumas
lideranças estaduais.
Na próxima
quinta-feira, a presidenta deverá se reunir com governadores que a apoiaram na
eleição do ano passado para discutir um pacto de governabilidade. O objetivo é
pedir o auxílio dos chefes dos Executivos estaduais para contornar a crise
econômica que o país enfrenta e, principalmente, para eles a ajudarem a
controlar os deputados de seus Estados que têm votado contra o Governo na
Câmara.
Outra estratégia
governista é começar a liberar as emendas parlamentares que estavam retidas por
conta do ajuste fiscal. Mesmo com os trabalhos nos plenários da Câmara e Senado
paralisados até o início de agosto, nesta semana era comum se deparar com
funcionários dos gabinetes conversando com prefeitos sobre a liberação dessas
emendas. “Achei que poderia organizar meus arquivos normalmente, mas não paro
de atender prefeitos do interior pedindo informações sobre as emendas. Bastou
alguém dizer que o dinheiro vai sair para o telefone começar a tocar”, disse a
funcionária do gabinete de um congressista de Minas Gerais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário