Procurador-geral, que investiga
políticos no escândalo, é reconduzido a cargo pelo Senado.
AFONSO BENITES, Brasília
Em uma das
vias que dá acesso ao Congresso Nacional uma faixa tentava chamar a atenção do
procurador-geral da República, Rodrigo Janot: “Janot, e os outros membros da quadrilha?” Ao
lado da frase, uma foto do procurador com uma venda nos olhos e quatro imagens
de senadores investigados pela Operação Lava Jato.
O protesto, no dia em que Janot foi sabatinado e aprovado pelo plenário
do Senado para permanecer mais dois anos no cargo, deu a tônica não só da
maratona de mais de dez horas para sua recondução ao posto máximo Ministério
Público como também será a prova de fogo do seu próximo mandato, até setembro
de 2017. A faixa é uma referência à onda de rumores nos bastidores políticos de
que, para continuar como chefe da Procuradoria, Janot teria feito um acordo com
o Governo Dilma Rousseff (PT) e com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ele próprio um investigado na Lava
Jato, para amenizar as investigações contra alguns dos suspeitos de
envolvimento no esquema de desvio de recursos da Petrobras.
“Nego
veementemente a possibilidade de qualquer acordo que possa interferir nas investigações
(...). A essa altura da minha vida eu
não deixaria os trilhos da minha atuação técnica no Ministério Público para
entrar em um processo que eu não domino, não conheço, que é o caminho da
política”, disse o mineiro Janot, 58 anos de vida, 31 como procurador federal,
quando indagado na sabatina sobre esse “acordão”, que ele o chamou de
"factóide".
Desde que os
nomes dos 49 políticos investigados pela Lava Jato surgiram em março, na “Lista
do Janot”, apenas dois foram denunciados, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e o senador Fernando Collor (PTB-AL), ambos na semana passada.
Provocado várias vezes pelo investigado Collor, durante sua sabatina, Janot
respondeu que as investigações contra os políticos na Lava Jato significam que
a Constituição está sendo seguida e recorreu a um ditado popular para se
explicar. “O que tem sido chamado de espetacularização da Lava-Jato nada mais é
do que a aplicação de princípio fundamental de uma República: todos são iguais
perante a lei. Pau que dá em Chico dá em Francisco”.
Em outro
momento, quando indagado pelo senador Lasier Martins (PDT-RS) sobre a razão de
ter denunciado, até agora, apenas Cunha e Collor, Janot respondeu que as
investigações contra eles estavam mais maduras do que as demais: “Não houve
seletividade para apresentar essas denúncias. Os critérios foram técnicos”.
Nas quase
dez horas e meia de sabatina, Janot viu também a defesa da igreja Assembleia de
Deus, suspeita de lavar parte da propina recebida pelo investigado Eduardo
Cunha, e uma disputa política entre dilmistas e os oposicionistas. Membros da
bancada evangélica, Marcelo Crivella (PRB-RJ) e Magno Malta (PR-ES), reclamaram
da citação dessa igreja como suspeita de ter sido usada por parte do esquema
criminoso.
Rodrigo Janot
Já tucanos
como Aécio Neves (MG) e Aloysio Nunes (SP) tentaram pressionar
Janot para que ele dissesse se "os chefes da quadrilha" que pilhou a
Petrobras estavam sendo investigados. A tentativa era arrancar do procurador
declarações que implicassem a presidenta Dilma ou o ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva no esquema, o que ele não disse.
No outro
lado do embate, petistas como Lindbergh Farias (RJ), que também um dos 49 investigados no escândalo, e Vanessa
Graziotin (PCdoB-AM) diziam que o Governo Dilma respeitava as instituições e,
ao contrário dos Governos de tucanos, havia indicado o procurador mais votado
entre os seus pares para chefiar o Ministério Público.
A todo o
momento, para tentar se mostrar imparcial, Janot dizia que suas apurações
deveriam ser técnicas. Até citou não ver problemas em pedir o arquivamento de
investigações em que não há provas robustas. “A caneta que assina uma denúncia
é a mesmíssima que assina um arquivamento. Durante dois anos foram pedidos 269
arquivamentos de inquéritos democraticamente distribuídos de todos os
partidos”, explicou.
Instituições fortes
A recondução
de Janot para a Procuradoria-Geral, após meses de especulações sobre possíveis
manobras dos investigados na Lava Jato para evitá-la, foi comemorada por
especialistas como mais um índice do fortalecimento das instituições
brasileiras. “O Janot é hoje um agente perturbador dos poderosos do Brasil.
Esse poder dominante sempre cometeu seus crimes e não eram perturbados pelo
Ministério Público. Agora são”, ponderou o jurista e ex-magistrado Luiz Flávio
Gomes.
Para esse
ex-juiz, um fator-chave para a recondução do procurador foi a existência de certa
pressão popular. “Se a sociedade estivesse acomodada, tranquila, a presidente
poderia não tê-lo indicado e o Senado não o aprovaria. Vivemos um momento de
transição para um país com instituições fortes. Para mim, o velho país já
morreu e o novo ainda não nasceu. Mas é algo que ainda não está consolidado”,
ponderou.
O presidente
do Instituto Giovanni Falcone, contitucionalista Wálter Maierovitch, elogiou a
escolha por Janot. “Retirar o Janot da Procuradoria era o mesmo que tirar o
Messi do time, em um jogo indefinido em que ele está brilhando. Estamos em um
momento em que a sociedade brasileira está com outra cara, uma cara
anticorrupção”, disse.
Maierovitch diz, no entanto, que
o procurador precisará agora demonstrar, com suas ações, o ditado sobre Chico e
Francisco para afastar de vez o fantasma de que foi privilegiado por um acordo
político. “O Janot negou que houvesse um acordão. Mas tem de provar isso
denunciando todos contra quem houver provas”, concluiu.
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