Publicado por Eli
Boscatto,
É formada em Ciências Políticas e Sociais, curiosa, inquieta, adora se
emocionar. Pretensa poeta...
Já se fala na maior crise de migração desde a Segunda Guerra Mundial
mas, embora todos sejam chamados de imigrantes, há alguma diferença entre o
imigrante e o refugiado.
Migrante é todo aquele que se desloca de seu
local de origem, podendo ser apenas em busca de trabalho, desejando melhorar de
vida em outro lugar, ou fugindo de guerras, epidemias, catástrofes naturais,
ambientais ou condições sociais e econômicas de extrema pobreza. Os motivos dos
refugiados estão ainda relacionados à perseguição religiosa, étnica, racial ou
política. O drama desses povos começa bem antes, nos bastidores da política
interna e externa onde se articulam os interesses comerciais e fronteiriços, na
ganância, na xenofobia, na intolerância e no fanatismo religioso. Em resumo,
todo refugiado é um imigrante, mas nem todo imigrante é um refugiado. O
primeiro só quer sobreviver. Podemos, então, dizer que os migrantes de hoje que
tentam alcançar a Europa são todos refugiados, afinal o que - senão o desespero
- pode fazer alguém arriscar sua vida, e de sua própria família, para chegar em
outro país?
Integrantes do Estado Islâmico
A Síria, de onde vem a maior parte dos
refugiados, passa por uma guerra civil por causa do ditador Bashar al-Assad,
que se recusa a deixar o poder. O conflito se iniciou entre os que querem sua
saída e os que são pró-governo. Mas, além da guerra civil, a Síria está sendo
castigada pelo Estado Islâmico, o mais sanguinário e perigoso grupo extremista
de que se tem notícia, protagonista das piores barbaridades e, dizem, o mais
bem financiado. Pretendem fundar um califado a força, espécie de chefia de
estado, acreditando rigorosamente que estão seguindo uma ordem religiosa do
Islã.
Mulheres
Curdas
A população síria, composta por diversos
grupos étnicos de maioria sunita - mesmo grupo religioso ao qual pertence o
Estado Islâmico - o que não quer dizer que todos os sunitas sejam terroristas,
tem entre eles os yazidis, minoria curda praticante do yazidismo, uma antiga
religião pré-islâmica. Originários de uma região do Oriente Médio chamada de
Curdistão, abrangendo parte dos territórios do Irã, Iraque, Síria e Turquia, o
povo curdo - que há tempos luta por sua autonomia - vem sendo novamente
reprimido de forma violenta. Outra minoria étnica, os ciganos de Kosovo, não
são bem vindos na União Europeia, que chega a mandá-los de volta como aconteceu
este ano com a família de uma estudante na França. Mas em Kosovo também são
hostilizados. A perseguição aos ciganos, povo nômade que não tem uma origem bem
definida (fala-se que teriam vindo da Índia ou Oriente Médio), devido o costume
de transmitirem oralmente suas histórias, teve início na inquisição, e seu auge
novamente no regime nazista.
Já os africanos, em geral ignorados, têm nas
condições econômicas e sociais da região - em especial da África Subsariana ao
sul do deserto do Saara, onde está a maior parte do continente - a razão do seu
êxodo. Mas não são fenômenos isolados no tempo, há todo um histórico de
exploração dos recursos naturais pelos colonizadores e que mesmo depois da
independência, perduraram até hoje, além de governantes ditadores, violentos e
corruptos. Se no passado a África foi um grande fornecedor de mão de obra
escrava, hoje ela fornece mão de obra desqualificada para fazer aqueles
trabalhos que ninguém quer mais fazer em países do primeiro mundo, e que a
crise econômica na Europa não mais consegue absorver.
Há outra questão delicada da qual pouco se
ouve falar e que serve para refletir acerca dos bastidores da política
internacional. Afinal, em todo conflito - seja ele militar ou civil - de onde
vem as armas? Quem as fornece? Entre os 10 maiores fornecedores estão Estados
Unidos, Rússia, China e as maiores economias da Europa, bem como Israel e até
mesmo o Brasil, em armas de pequeno porte. Os Estados Unidos é o principal
fornecedor de armas pesadas e equipamentos bélicos. Fácil imaginar quem são os
compradores e como se criam zonas estratégicas. Apenas para se ter uma ideia,
um dos principais importadores é a Arábia Saudita, um dos países do Oriente
Médio que costumam financiar o terrorismo. Se olharmos para os números, para o
volume monetário envolvido no comércio de armas, na casa dos bilhões de dólares
e euros, vamos concluir que a paz no mundo é uma utopia, e que os países
desenvolvidos fazem, de tempos em tempos, somente uma “política do morde e
assopra”.
No Brasil, às vezes, esquecemos que somos
quase todos descendentes de imigrantes, primeiro os colonos, depois os que
vieram trabalhar nas lavouras de café e depois os refugiados das duas grandes
guerras, e também daqueles que aqui chegaram contra a vontade, trazidos como
escravos. No entanto, o Brasil tem recebido muitos imigrantes haitianos que na
verdade fogem da miséria em seu país, e que às vezes são hostilizados, mas a
motivação primeira não é o fato de serem imigrantes.
Nas Américas quase todos nós descendemos de
nações do velho continente, primeiro chegamos como “conquistadores” (um
eufemismo para invasores), conforme nos ensinam os livros de história.
Descobrimos a existência de uma terra vasta e rica habitada por um povo nativo
selvagem, mas que faziam uso de armas pré-históricas em comparação às nossas.
Estavam, portanto, em desvantagem, poderíamos dominá-los, ocupar as terras,
explorar as riquezas e ainda passarmos para a história somente como heróis.
Assistimos diariamente o drama de refugiados
que fogem da miséria e de conflitos armados motivados por perseguição
político-religiosa que sofrem em seus países, a maioria da Síria e do
continente africano. Se alguém ainda não tinha ideia das proporções dessa
tragédia, desde 2011, milhares de pessoas tiveram de deixar suas casas e outras
tantas morreram na tentativa de alcançar a Europa pelo mar. Além de tudo, são
enganadas por traficantes de pessoas que cobram caro para levá-las sem nenhuma
segurança ou garantia de chegada ao destino. Todo o drama ficou escancarado com
o encontro do corpo de um menino sírio em uma praia da Turquia, provocando uma
comoção mundial e fazendo com que alguns países se prontificassem a rever sua
postura sobre os imigrantes. Mas, bastou arrefecer o abalo inicial para que a
União Europeia continuasse a “empurrar o problema com a barriga”. Claro está
que um país sozinho não tem como abrigar todos os refugiados, é necessário uma
ajuda em conjunto, é preciso portanto chegar com urgência a um consenso comum
sobre a crise ou continuaremos a ter notícias dramáticas de pessoas morrendo
todos os dias.
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