História do Brasil
Carolina Josefa Leopoldina de Habsburgo-Lorena (em alemão: Caroline
Josepha Leopoldine von Habsburg-Lothringen) (Viena, 22 de janeiro de 1797— Rio de Janeiro, 11 de dezembro de 1826) que,
no Brasil,
passou a assinar Maria Leopoldina e Leopoldina,
foi arquiduquesa da Áustria, primeira imperatriz-consorte do Brasil, regente do Brasil em setembro de 1821, e,
durante oito dias, em 1826, rainha consorte de Portugal.
Leopoldina pertencia à Casa de Habsburgo, nobre família
e uma das mais antigas dinastias da Europa, a
qual reinou sobre a Áustria de 1282 até 1918,
dentre outros territórios que imperaram e era a mais antiga casa reinante na Europa
quando Leopoldina nasceu. Era filha do último imperador do Sacro Império Romano-Germânico Francisco II (1768-1835), (o qual, a partir de 1804,
passou a ser apenas o "Imperador da Áustria" com o título de
Francisco I, porque Napoleão I exigiu que ele renunciasse ao título de
imperador, no ano em que Napoleão era sagrado imperador dos franceses), e de
sua segunda esposa e prima Maria Teresa da Sicília ou de Bourbon - Nápoles (1772-1807)
princesa das Duas Sicílias, de um ramo da Casa de Bourbon, pois filha do rei Ferdinando I (1751-1825) e de
sua esposa Maria Luisa (1745-1792).
Francisco, seu pai, era viúvo de Isabel Guilhermina
Luísa von Württemberg, morta sem descendência em 1790;
casaria por terceira vez com Maria Ludovica d'Este, a quem Leopoldina chamava
«mãe», que não teve filhos e morreu em 1816; e
casou uma quarta vez com Carolina Augusta da Baviera, morta em 1873 sem
filhos.
O nome completo da arquiduquesa, que viria a ser a primeira imperatriz do Brasil,
era Carolina Josefa Leopoldina Francisca Fernanda de Habsburgo-Lorena,
como informa o seu biógrafo e grande estudioso de sua vida, Carlos H. Oberacker
Jr, na obra "A Imperatriz Leopoldina: Sua Vida e Sua Época.",
confirmado também pela obra "Cartas de uma Imperatriz", de Bettina
Kann e outros autores. Em um dos ensaios apresentados no livro, é citado um
trecho do publicado no jornal austríaco "Wiener Zeitung", de 25 de
janeiro de 1797, dando a notícia do nascimento da Arquiduquesa Carolina Josefa
Leopoldina, acontecido três dias antes, num domingo, dia 22 de janeiro. Informa
Oberacker Jr. (p. 301 e 302) que o nome "Maria" não se encontra
entre os nomes de batismo da Arquiduquesa, o que de fato é verdade. Segundo
ele, Leopoldina passou a usá-lo já em sua viagem para o Brasil, ao tratar de
alguns negócios particulares. No Brasil, ela passou a assinar somente
Leopoldina, ou utilizando o prenome Maria, como pode ser visto no seu Juramento
à Constituição do Brasil. Uma outra hipótese também apresentada pelo mesmo
autor é que Leopoldina teria adotado o "Maria" por sua grande devoção
à Virgem e pelo fato de todas as infantas portuguesas usarem este nome.
Cresceu no castelo de Schönbrunn até a data de seu casamento com Pedro de
Alcântara (1798-1834),
em 1817, por
procuração. Pedro de Alcântara de Bragança era príncipe da Beira, depois príncipe real do Reino Unido de Portugal, Brasil e
Algarves, e finalmente Imperador do Brasil como Pedro I e rei de Portugal como Pedro IV.
No castelo, Leopoldina seguramente deve ter
apreciado os salões chamados de Bergl com pinturas murais de autoria de Johann Wenzl Bergl realizadas
em 1770que
mostram paisagens europeias com uma visão do Trópico, do período final do
Barroco. Nelas, a natureza é estudada, analisada, ordenada, planificada - uma
série de tapeçarias do patrimônio de Luís XIV, com motivos de paisagens
brasileiras, plantas e animais tropicais das coleções da América do Sul no
antigo Jardim Botânico (hoje, o palmarium), e do zoo de Schönbrunn
serviram como modelo.
Nas suas cartas, publicada no livro "cartas de
uma imperatriz", declara zelar muito pelos deveres de princesa.
Debret: Desembarque
da princesa Leopoldina, 1817. Museu da Chácara do Céu.
Depois de chegar ao Brasil, para onde veio
entusiasmada pois se interessava por botânica e mineralogia, acabou respeitando
e amando o país. Havia vindo acompanhada por numerosos cientistas, botânicos e
pintores.
Teve enorme papel nas negociações do casamento
o Marquês de Marialva, o mesmo que negociara, aconselhado
por Humboldt, a vinda para o Brasil da Missão Francesa. João tudo fez para incluir nas negociações
a Infanta Dona Isabel Maria (1801-1876) que
seria Regente do reino de Portugal de 1826 a 1828 e
faleceria solteira. Marialva foi, por exemplo, quem garantiu que a corte estava
decidida a voltar para Portugal logo que o Brasil demonstrasse que havia
seguramente "escapado das chamas das guerras da independência que
avançavam nas colônias espanholas", obtendo assim o consentimento
austríaco ao casamento. O contrato foi concluído em 29 de novembro de 1816, e
assinado. O noivo era filho de João VI e de Carlota Joaquina de Bourbon, herdeiro do trono do Reino Unido de
Portugal, Brasil e Algarve.
A cerimônia do casamento, celebrada pelo Arcebispo
de Viena, se realizou na terça-feira dia 13 de maio de 1817, por
procuração, na igreja de Santo Agostinho, em Viena. Pedro foi representado pelo
arquiduque Carlos Luís (1771-1847), ou
Karl Ludwig, grande chefe militar, herói da batalha de Aspern (casariam de novo
em 6 de novembro de 1817 no
Rio):
"O ponto culminante das cerimônias de
casamento foi atingido no Augarten de Viena onde, a 1 de junho, Marialva, que
tinha tido poucas oportunidades para revelar o esplendor, riqueza e
hospitalidade de sua nação, deu uma suntuosa recepção para a qual fizera
preparativos durante todo o inverno.» Pouco tempo antes do casamento, duas
fragatas austríacas, a Áustria e a Augusta,
partiram para o Rio, com os móveis e decorações para a embaixada da Áustria
recém instalada no Rio, o equipamento para uma expedição científica ao interior
do Brasil e numerosas mostras de produtos comerciais austríacos."
O cortejo matrimonial deixou Viena com esplendor
em 3 de junho, em uma quinzena tinham atingido Florença,
mas a esquadra portuguesa só chegou a Livorno a 24 de julho. O comboio matrimonial partiu a 15 de agosto, com Leopoldina, 28 pessoas da comitiva na
nau D. João VI e o embaixador austríaco conde de Elz com seus
auxiliares na nau D. Sebastião.
Retrato de Dona Leopoldina por Luís Schlappriz.
À chegada ao Rio, em 5 de novembro, a austríaca teria causado espanto aos reis, que
esperavam uma bela princesa. Consta que tinha uma bela face e era obesa.
Também era extraordinariamente culta para sua
época, com grande interesse pela botânica. A chegada, proporcionou a Jean Baptiste Debret ocasião para sua primeira intervenção,
onde teve 12 dias para ornamentar a cidade. O mesmo possuía um atelier no
bairro do Catumbi, onde
na sua qualidade de naturalista, fez mais tarde desenhos de plantas e flores
para Leopoldina. Diria ele: "J’ai été chargé d’exécuter gracieusement pour
elle quelques—uns de ces dessins, ce qu’elle (l’impératrice) osait demander,
affirmait-elle, au nom de sa soeur, l’ancienne impératrice des Français."
(ou seja, "Fui encarregado de executar graciosamente para ela alguns
desenhos que ela ousava pedir, dizia, em nome de sua irmã, antiga imperatriz
dos franceses.") Pois uma irmã mais velha de Leopoldina foi Maria Luísa, a segunda esposa de Napoleão e segunda imperatriz dos franceses. No
atelier, Debret desenhou os grandes uniformes de gala da corte, em verde e
ouro, as condecorações do novo Estado, como a Coroa de Ferro criada por
Napoleão em 1806 para o reino da Itália. Debret desenhou
também as insígnias da Ordem do Cruzeiro do Sul, comparáveis à da medalha da Legião de
Honra, e as da Ordem da Rosa, instituída em homenagem à neta de Josefina,
primeira esposa de Napoleão, Amélia de Leuchtenberg ou de Beauharnais, duquesa de
Leuchtenberg.
O historiador Carlos Oberacker, em seu livro
"A Imperatriz Leopoldina - Sua Vida e Sua Época", narra que era
exímia caçadora e que acompanhou o marido em caçadas na planície de Jacarepaguá durante a lua-de-mel. Ali, na sacristia da Igreja Nossa Senhora da
Penha, existe uma cadeirinha, que, segundo a tradição, serviu a Dona
Leopoldina. Mais tarde, a cadeirinha foi usada por Teresa Cristina, esposa
de Pedro II (1825-1891).
O jovem casal foi instalado em uma casa de campo
nos terrenos da Quinta da Boa Vista. Metternich interceptaria uma carta
do barão de Eschwege a seu sócio em Viena em que este dizia:
"Por falar no Príncipe Herdeiro, posto que não seja destituído de
inteligência natural, é falho de educação formal. Foi criado entre cavalos, e a
Princesa cedo ou tarde perceberá que ele não e capaz de coexistir em harmonia.
Além disso, a Corte do Rio é muito enfadonha e insignificante, comparada com as
cortes da Europa".
Na esteira de Leopoldina chegaram os primeiros
imigrantes, colonos suíços que se fixaram nos arredores da corte,
fundando Nova Friburgo e instalando-se na futura Petrópolis, residência de verão sobretudo do Segundo Império.
A partir de 1824, devido à campanha brasileira na Europa organizada
pelo Major Schäffer, os alemães chegaram mais numerosos e se
instalaram outra vez em Nova Friburgo e nas regiões temperadas das províncias
de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, onde a Colônia de São Leopoldo foi criada em sua homenagem. Alguns da Pomerânia foram para o Espírito Santo, vivendo até os anos 1880 em tão completo
isolamento que nem falavam português.
Dona Leopoldina, então Princesa Real-Regente
do Reino do Brasil, preside a reunião do
Conselho de Ministros em 2 de setembro de 1822.
Em 25 de abril de 1821 a
corte voltou para Portugal. Uma esquadra de 11 navios levou o rei, a corte, a
Casa Real e o tesouro real, e só o Príncipe Pedro permaneceu no Brasil como
regente do país, com amplos poderes contrabalançados por um Conselho de
Regência. A princípio, Pedro foi incapaz de dominar o caos: a situação estava
dominada pelas tropas portuguesas, em condições anárquicas. A oposição entre
portugueses e brasileiros tornou-se cada vez mais evidente. Vê-se claramente,
na correspondência de Leopoldina, que ela esposou calorosamente a causa do povo
brasileiro e chegou a desejar a independência do país, sendo por isso amada e
venerada pelos brasileiros.
Segundo Ezekiel Ramirez, abaixo citado, eram
visíveis os sinais de uma nascente unidade brasileira como nação independente
nas províncias do sul, mas o norte apoiava as Cortes de Lisboa e pediam
independência regional. Se o Príncipe Regente tivesse deixado o país naquele
momento, o Brasil estaria perdido para Portugal pois as Cortes de Lisboa
repetiam o mesmo erro que levou as Cortes espanholas a perderem as colônias,
procurando estabelecer contatos diretos com cada província em particular.
No Rio, milhares de assinaturas colhidas exigiam
dos Regentes permanecerem no Brasil. «A corajosa atitude de José Bonifácio de Andrada e Silva contra a arrogância dos portugueses encorajou
muito as aspirações de unidade que existiam nas províncias meridionais, especialmente
em São Paulo. Um grupo de homens altamente cultos liderou este movimento.»
Depois do dia do Fico, 9 de janeiro de 1822,
organizou-se novo ministério sob a chefia de José Bonifácio, «no fundo rigoroso
monarquista», e o Príncipe Real cedo conquistaria a confiança do povo. Em 15 de fevereiro de 1822 as
tropas portuguesas deixaram o Rio, e sua partida representou a dissolução dos
laços entre o Brasil e a metrópole. O Príncipe foi triunfalmente recebido nas
Minas Gerais.
Juramento da imperatriz Maria Leopoldina à
Constituição do Brasil, 1824.
Quando o marido, príncipe regente, viajou a São
Paulo em agosto de 1822, para apaziguar a política (o que culminaria
na proclamação da independência do Brasil em setembro), Leopoldina exerceu a
regência. Grande foi sua influência no processo de independência. Os
brasileiros já estavam cientes de que Portugal pretendia chamar Pedro de volta, rebaixando o
Brasil outra vez ao estatuto de simples colônia, em vez de um reino unido ao de
Portugal. Havia temores de que uma guerra civil separasse a Província de São
Paulo do resto do Brasil. Pedro entregou o poder a Leopoldina a 13 de agosto de 1822,
nomeando-a chefe do Conselho de Estado e Princesa Regente Interina do Brasil,
com poderes legais para governar o país durante a sua ausência e partiu para
apaziguar São Paulo.
A princesa recebeu notícias que Portugal estava
preparando ação contra o Brasil e, sem tempo para aguardar o retorno de Pedro,
Leopoldina, aconselhada por José Bonifácio de Andrada e Silva, e usando de seus atributos de chefe interina do
governo, reuniu-se na manhã de 2 de setembro de 1822, com
o Conselho de Estado, assinando o decreto da Independência, declarando o Brasil
separado de Portugal. A imperatriz envia-lhe uma carta, juntamente com outra de
José Bonifácio, além de comentários de Portugal criticando a atuação do marido
e de dom João VI. Ela exige que Pedro proclame a Independência do Brasil e, na
carta, adverte: "O pomo está maduro, colhe-o já, senão apodrece".
O oficial chegou ao príncipe no dia 7 de setembro de 1822.
Leopoldina enviara ainda papéis recebidos de Lisboa, e comentários de Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, deputado às Cortes, pelos quais o
Príncipe-Regente se inteirou das críticas que lhe faziam na Metrópole. A
posição de João VI e de todo o seu ministério, dominados pelas Cortes, era
difícil.
Enquanto se aguardava o retorno de Pedro,
Leopoldina, governante interina de um Brasil já independente, idealizou a
bandeira do Brasil, em que misturou o verde da família Bragança e o amarelo ouro da família Habsburgo. Outros autores opinam que Jean Baptiste Debret, o artista francês que desenhou o que via no
Brasil dos anos 1820, foi o autor do pavilhão nacional que substituía o da
vetusta corte portuguesa, símbolo da opressão do Antigo Regime. Deve-se a
Debret o projeto da bela bandeira imperial, em colaboração com José Bonifácio
de Andrada e Silva, em que o retângulo verde dos Bragança representava as
florestas e o losango amarelo, cor da dinastia Habsburgo-Lorena, representava o
ouro.
Foi coroada imperatriz em 1 de dezembro de 1822, na
cerimônia de coroação e sagração de Pedro I.
Maria Leopoldina e seus filhos.
Há divergências sobre a causa mortis da
primeira imperatriz do Brasil. Para alguns autores, teria falecido em consequência
de uma septicemia puerperal,[5] enquanto
o Imperador se encontrava no Rio Grande do Sul, aonde fora inspecionar as tropas durante a Guerra da Cisplatina.
É no entanto muito difundida a versão de que Maria
Leopoldina teria morrido em consequência das agressões desferidas contra si
durante acesso de raiva de seu marido, o imperador, versão essa corroborada por
historiadores como Gabriac, Carl Seidler, John Armitage e Isabel
Lustosa. Essa suposta causa da morte sofreu um revés, com a recente
exumação de seus restos mortais onde não se verificou nenhuma fratura.[9] Isso se teria dado em 20 de novembro de 1826,
quando assumiria a regência do país para que Pedro pudesse viajar ao Sul para
tratar da guerra contra o Uruguai. Querendo demonstrar ser mentira os boatos sobre
suas relações extraconjugais e o clima ruim entre o casal, Pedro I resolveu que
o beija-mão à regente seria feito em sua presença, junto a Domitília de Castro, marquesa de Santos e dama de companhia da
imperatriz. Maria Leopoldina, arquiduquesa austríaca, achou uma enorme
humilhação ser recebida pela corte junto à amante de seu marido, e afrontou
Pedro recusando-se a entrar na sala do Trono. O imperador, de gênio volátil,
tentou arrastá-la pelo palácio, agredindo-a com palavras e chutes. Acabou por
comparecer ao beija-mão acompanhado unicamente pela marquesa de Santos. Há que
se ressaltar que não se conhece outra testemunha no momento do fato além dos
três, e que as suspeitas sobre as agressões sofridas teriam sido levantadas
pelas damas e médicos que ampararam Maria Leopoldina na sequência. Contudo, a
realidade dos fatos fora outra:
"Exagerou-se, que Pedro lhe dera um
pontapé, razão da doença. A cena, presenciada pelo agente austríaco [refere-se
ao embaixador austríaco, Filipe Leopoldo Wenzel, Barão de Mareschal], consistiu
em palavras desatinadas. O certo é que não faltaram motivos a Leopoldina para a
perturbação da gravidez, a cujo malogro sucumbiu."[10]
A imperatriz, que há meses encontrava-se em grave
processo de depressão e na 12ª semana de gravidez, teve a saúde profundamente
abalada. Em sua última carta à irmã Maria Luísa, ditada à marquesa de Aguiar,
menciona um "terrível atentado" que sofrera pelas mãos de seu marido
na presença da amante:
Cortejo fúnebre da Imperatriz Da. Leopoldina,
por Debret.
São Cristóvão, 8 de dezembro de 1826, às 4
horas da manhã
Minha adorada mana!
Reduzida ao mais deplorável estado de saúde e
tendo chegado ao último ponto de minha vida em meio dos maiores sofrimentos,
terei também a desgraça de não poder eu mesma explicar-te todos aqueles
sentimentos que há tanto tempo existiam impressos na minha alma. Minha mana!
Não tornarei a vê-la! Não poderei outra vez repetir que te amava, que te
adorava! Pois, já que não posso ter esta tão inocente satisfação igual a outras
muitas que não me são permitidas, ouve o grito de uma vítima que de tu reclama
- não vingança - mas piedade, e socorro do fraternal afeto para meus inocentes
filhos, que órfãos vão ficar, em poder de si mesmos ou das pessoas que foram
autores das minhas desgraças, reduzindo-me ao estado em que me acho, de ser
obrigada a servir-me de intérprete para fazer chegar até tu os últimos rogos da
minha aflita alma. A Marquesa de Aguiar, de quem bem conheceis o zelo e o amor
verdadeiro que por mim tem, como repetidas vezes te escrevi, essa única amiga
que tenho é quem lhe escreve em meu lugar.
Há quase quatro anos, minha adorada mana,
como a ti tenho escrito, por amor de um monstro sedutor me vejo reduzida ao
estado da maior escravidão e totalmente esquecida pelo meu adorado Pedro.
Ultimamente, acabou de dar-me a última prova de seu total esquecimento a meu
respeito, maltratando-me na presença daquela mesma que é a causa de todas as
minhas desgraças. Muito e muito tinha a dizer-te, mas faltam-me forças para me
lembrar de tão horroroso atentado que será sem dúvida a causa da minha morte.
Cadolino, que por ti me foi recomendado, e que me tem dado todas as provas da
maior subordinação e fidelidade, é quem fica encarregado de entregar-te a
presente, e declarar-te o que por muitos motivos não posso confiar a este
papel. Tendo ele todas as informações que são precisas sobre este artigo, nada
mais tenho a acrescentar, confiando inteiramente na sua probidade, honra e
fidelidade.
Faltaria ao meu dever se, além de ter
declarado ao Marechal e a Cadolino que tenho dívidas contratadas (ou
contraídas?) para sustentar os pobres, que de mim reclamarão algum socorro, e
para as minhas despesas particulares, não dissesse a ti que o Flach, de quem
tenho muitas vezes escrito, é digno de toda tua consideração e de meu Augusto
Pai, a quem peço-te remeter a inclusa.
Este virtuoso amigo, além de ter se
sacrificado e comprometido a si mesmo e seus negócios para me servir, não
desprezou meio algum para me procurar socorros. Peço-te por quanto tens de mais
sagrado de lhe prestares todo o auxílio, de modo que ele possa satisfazer
aquelas dívidas que por mim tem contraído. Recomendo este exemplo da mais
virtuosa amizade. Cadolino te dirá qual foi o procedimento de Marechal para
comigo. A Marquesa de Aguiar fica encarregada de dar a ti os mais miúdos
detalhes sobre quanto diz respeito às minhas queridas filhas. Ah, minhas
queridas filhas! Que será delas depois da minha morte? É a ela que entreguei a
sua educação até que o meu Pedro, o meu querido Pedro não disponha o contrário.
Adeus minha adorada mana.
Permita o Ente Supremo que eu possa
escrever-te ainda outra vez, pois que será o final do meu restabelecimento.
L. S. B. Marquesa de Aguiar Escrevi.
Túmulo de Dona Leopoldina (Cripta Imperial - São Paulo - Brasil).
Durante a agonia de Leopoldina surgiram os mais
diversos boatos: de que a imperatriz era prisioneira na Quinta da Boa Vista, de que estava sendo envenenada por seu
médico a mando da marquesa de Santos entre outros. A popularidade de Domitília
de Castro, que já não era das melhores, piorou, tendo sua casa em São Cristóvão
sido apedrejada e seu cunhado, camareiro da imperatriz, alvejado por dois
tiros. O direito de presidir as consultas médicas à imperatriz, como sua dama
de companhia, lhe foram negadas, e ministros e funcionários do paço sugeriram
que ela não deveria continuar frequentando a corte.
O comunicado emitido em 11 de dezembro ao imperador sobre a morte de sua esposa
relata convulsões, febre alta e delírios. O filho que carregava no ventre
morreu consigo. Gozando de grande apreço pela população, que lhe admirava muito
mais do que ao marido, teve sua morte chorada por grande parte da nação.
Esta versão dos acontecimentos foi propagada até a
Europa, tendo a reputação de Pedro ficado de tal modo manchada que o seu
segundo casamento tornou-se deveras dificultoso. É dito que o primeiro
galardoado da Imperial Ordem de Pedro Primeiro, Francisco I da Áustria, teria recebido a comenda como um pedido de
desculpas do imperador brasileiro.
Origem: Wikipédia
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