Colaboração de Fernando Alcoforado*
A alienação
em relação ao produto do trabalho significa o estranhamento do ser humano
trabalhador em não se reconhecer como autor do produto que produz graças a seu
trabalho. O exemplo clássico é o da linha de produção, em que o trabalhador não
se reconhece no produto final e nem mesmo sabe seu destino. O produto final é
do empregador sendo um objeto estranho a qualquer indivíduo que trabalhou na
sua produção. No fim do processo de trabalho, o produto feito se transforma em
algo estranho, independente do ser que o produziu.
A alienação
no processo de produção é o que Marx chama de “alienação ativa” quando o
trabalhador é forçado a trabalhar para sobreviver e trabalha além do necessário
para produzir mais valia (diferença entre o salário pago e o valor do trabalho
produzido) em benefício do empregador. O salário pago ao trabalhador tem por
objetivo satisfazer suas necessidades básicas, como comer, dormir, beber, etc.
enquanto a mais valia que é o trabalho não pago beneficia o empregador. O
próprio trabalho é estranho ao indivíduo, que só trabalha sob coerção. Nessas
circunstâncias, o trabalho é sempre considerado como o fardo para a
sobrevivência do trabalhador. Uma tentativa de fazer do trabalho algo bom é
constantemente praticada pelos empregadores realizando palestras motivacionais,
criando um ambiente saudável e incentivando que os trabalhadores sigam sua
“vocação” sob a perspectiva meramente econômica do capitalismo.
A alienação
do sujeito enquanto pertencente ao gênero humano se materializa no fato do
individuo estar separado de sua essência, de sua ligação com a comunidade, de
seu trabalho ao se tornar uma pessoa solitária deixando de ser mais um membro
de sua espécie. O trabalho enquanto fator que faz com que o trabalhador se
considere um indivíduo isolado é criticável também por considerar que ele só
vale enquanto trabalhador, não enquanto ser humano. Segundo as coordenadas
culturais da ideologia capitalista, cada indivíduo precisa estar apto e livre
para buscar sua felicidade individual, que é reconhecida como o fim último e
sentido da vida e não da espécie humana.
A alienação em relação aos outros homens é a
consequência óbvia da individualização da vida. Quando não se reconhece em seu
aspecto mais fundamental, que é o trabalho, e quando ele não é reconhecido como
parte essencial da vida humana e do ser humano enquanto gênero/espécie, então
sua vida e a de seus semelhantes deixa de ter significado. Ser alienado
enquanto parte da espécie humana, implica em se alienar 2 também dos outros. A
teoria da alienação mostra o vazio do sujeito alienado, mostra a
descaracterização da própria humanidade, da essência do sujeito.
Segundo
Althusser (ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos de estado. 6ª Ed. Rio de
Janeiro: Graal, 1985), para que a produção sobreviva, é necessário que ela faça
a reprodução dos meios de produção. Tais meios de produção são formados pelas
forças produtivas e pelas relações sociais de produção existentes. A reprodução
da força de trabalho se dá fora da empresa, e o meio material pelo qual ela se
reproduz é o salário. O salário é indispensável para a reconstituição da força
de trabalho do assalariado (vestimentas, alimentação, etc.), e também é
indispensável à educação das crianças. Contudo, não basta apenas fazer com que
a força de trabalho se reproduza; ela deve ser capaz de manusear as máquinas e
equipamentos da empresa. Esta qualificação ocorre por meio do sistema escolar
capitalista.
Na escola,
além de ler e escrever, são aprendidas também as regras do "bom
comportamento", ou seja, aprende-se a ser submisso à ordem vigente,
fazendo com que as pessoas sejam submissas em relação à ideologia dominante.
Além da escola, também a Igreja e outros aparelhos, como as Forças Armadas, são
aparelhos ideológicos do estado. Eles dominam não apenas pelo uso da força, mas
também pelo uso da ideologia para manter a classe dominante no poder. Althusser
separa o aparelho de estado do poder de estado. O objeto de disputa política é
o poder do estado. Quem detém o poder do estado usa o aparelho do estado em
benefício de sua classe. É preciso ter em mente não apenas a distinção entre
poder de estado e aparelho de estado, mas também admitir a existência de uma
realidade que não se confunde com o aparelho repressivo de estado: são os
aparelhos ideológicos de estado.
A diferença
básica entre os aparelhos repressivos de estado (ARE) e os aparelhos
ideológicos de estado (AIE) é que os ARE utilizam-se predominantemente de
argumentos repressivos e coercitivos para atingirem seus objetivos. Já os AIE
utilizam predominantemente a ideologia para manter sua dominação. Os AIE
trabalham sobre a mente das pessoas. São integrantes dos AIE, dentre outros, o
sistema de diferentes igrejas, o sistema escolar (tanto público quanto
privado), o sistema familiar, o sistema jurídico, o sistema político, o sistema
sindical, o sistema de informação e o sistema cultural. Outra diferença entre
os ARE e AIE está na maneira de atuação. Os ARES utilizam-se da repressão e
coerção, enquanto os AIE utilizam-se da ideologia. Enquanto os ARE são
totalmente públicos, grande parte dos AIE pertence ao domínio privado. Isto não
significa dizer que exista alguma diferença entre AIE públicos e privados:
ambos funcionam como aparelhos ideológicos de estado.
A função dos
aparelhos repressivos do estado é não só manter as condições políticas da
reprodução das relações sociais de produção, mas também manter, pela repressão,
as condições políticas do exercício dos aparelhos ideológicos do estado. São
estes que garantem a mais efetiva reprodução das relações sociais de produção.
É aí que a ideologia da classe dominante funciona. A função de provedor da
reprodução das relações de produção existe desde o pré-capitalismo. Em tal
época, o principal AIE era a Igreja Católica, que tinha funções não só
religiosas, mas também educacionais, além de uma boa parte das funções de
informação e de cultura. Durante o século XIX, com a progressiva separação
entre Estado e Igreja, surgiram novos AIE: a escola e a mídia. Estes AIE são os
que mais influenciam no momento, pois é a escola quem dá formação a todas as
pessoas, independentemente de classe social, desde o maternal até a 3
universidade e a mídia condiciona também o comportamento das pessoas, sobretudo
através da TV. Portanto, é por meio da educação e da mídia que a reprodução das
relações sociais de produção ocorre no momento. Esta ideologia, entretanto,
está oculta, pois a escola é tida como neutra na formação do indivíduo e a
mídia é considerada neutra na disseminação da informação. A escola e a mídia
desempenham um papel determinante na reprodução das relações sociais de
produção no sentido de manter o modo de produção dominante em cada sociedade.
Na história
da humanidade, a alienação já existia antes do advento do capitalismo com o surgimento
da propriedade privada. O nascimento da propriedade privada como algo separado
do sujeito que a produz existe juntamente com a alienação do trabalho. O
sujeito alienado é, portanto, aquele que não se reconhece no produto de seu
trabalho, que não se satisfaz na sua atividade de trabalho e que não se
reconhece enquanto membro da espécie humana. O sujeito alienado é, portanto, um
sujeito impotente. Este sujeito destituído de tudo que lhe é próprio não está
apto para assumir a responsabilidade de guiar a sociedade junto com seus
companheiros e não consegue perceber a possibilidade de uma mudança econômica,
política e social. O fim da alienação do ser humano é fundamental para ocorra o
progresso da humanidade. Para alcançar este objetivo, é preciso eliminar todos
os fatores que contribuem para a existência da servidão humana.
* Fernando
Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em
Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de
Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento
estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de
sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São
Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora
Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo,
2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de
doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944,
2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia-
Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era
Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic
and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento
Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010),
Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento
global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os
Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV,
Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no BrasilEnergia e Mudança Climática Catastrófica
no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015).
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